G20 decide liberar US$ 1 trilhão para a economia global

Reunidos em Londres, o grupo dos países mais ricos e os principais países emergentes buscaram alternativas comuns para sair da crise financeira internacional. A reunião é um marco da participação de países emergentes, e a ONU elogiou a iniciativa de não esquecer mecanismos de proteção dos mais pobres.

Mundo Lusíada Com Lusa e agencias

Ricardo Stuckert/PR

>> Londres – Chefes de Estado, no Reino Unido para o G20, vão a jantar oferecido pelo primeiro-ministro britânico, Gordon Brown.

Na quinta-feira 02 de abril, o grupo com as 20 maiores economias do mundo anunciou que vai injetar US$ 1 trilhão na economia mundial até o final de 2010, além de divulgar uma lista de paraísos fiscais e uma forte injeção de dinheiro em instituições internacionais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (Bird). Ficou também prevista uma "profunda" reforma do sistema bancário internacional, que passará por uma nova regulamentação para as agências financeiras e para os fundos de investimento. Estima-se que, até o fim de 2010, o montante chegue a US$ 5 trilhões e a produção mundial aumente em 4%.

A maior parte dos recursos, US$ 750 bilhões, será para reforçar o Fundo Monetário Internacional (FMI). Desse total, US$ 250 bilhões se destinarão ao financiamento do comércio nos próximos dois anos e outros US$ 250 bilhões serão para apoio ao SDR (Direito Especial de Saques, na sigla em inglês) e pelo menos US$ 100 bilhões irão para os bancos multilaterais de desenvolvimento (como o Banco Mundial), de acordo com o documento final da cúpula. Há ainda intenção de direcionar US$ 6 bilhões da venda de ouro das reservas do FMI aos países mais pobres nos próximos dois ou três anos. A Cúpula de Líderes do G20 abordou a Estabilidade, Crescimento e Emprego, no seguimento da primeira Cúpula dos Líderes realizada novembro de 2008.

Para o presidente da Comissão Européia (braço executivo do bloco europeu), Durão Barroso, a cúpula do G20 sentiu o "efeito Obama", elogiando a abertura e humildade que o presidente dos EUA demonstrou durante a reunião em Londres. "Ele próprio disse que era a primeira reunião dele, apresentou-se com grande humildade dizendo que queria aprender com os outros que já tinham mais experiência do que ele neste domínio e com um trato bastante agradável e simpático. Isso também ajuda", reconheceu Barroso no final da reunião.

Esta foi a primeira reunião de alto nível em que Barack Obama participou desde que tomou o lugar de George W. Bush na Casa Branca, em janeiro. O próprio presidente norte-americano teria, segundo Barroso, reconhecido que seria impossível há alguns anos atrás trabalhar com países como a China ou a Rússia.

O português Manuel Durão Barroso defendeu ainda que as economias emergentes passem a ter uma "participação equitativa" na estrutura do FMI e outras instituições financeiras internacionais. "A questão de representação e responsabilidade no FMI é importante. A representação nas instituições internacionais deve refletir a realidade, não a história. As economias emergentes devem ter uma participação equitativa", afirmou. Para ele, os países da UE "terão que ser flexíveis" ao decidir como proporcionar esse equilíbrio. Barroso também defende que o Fórum de Estabilidade Financeira (FSF) – um organismo internacional criado pelo G7 e escolhido pelo G20 para coordenar as reformas do sistema financeiro internacional – inclua todos os membros do grupo dos 20 e trabalhe em parceria com o FMI para produzir alertas em caso de riscos para a estabilidade macroeconômica ou financeira.

Barroso admitiu que "os países em desenvolvimento não devem pagar o preço de uma crise gerada no mundo desenvolvido" e, para ajudá-los, sugeriu a criação de um "instrumento global para o financiamento do comércio". "Temos a obrigação de oferecer mais apoio para ajudar os países mais pobres durante a crise. Não pode haver recuperação sem justiça em relação aos países em desenvolvimento", afirmou.

Em defesa à África, o primeiro-ministro português também alertou o G20 a tomar medidas que não comprometam o desenvolvimento de países não representados neste grupo, numa carta enviada ao chefe do Governo britânico, Gordon Brown, anfitrião da cúpula.

Da parte africana são co-presidentes a Etiópia e a União Africana, que também assinaram a mensagem dirigida a Gordon Brown. "Em particular, como co-presidentes do Africa Partnership Forum (APF), preocupa-nos que os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio possam sofrer um grave revés, em resultado de uma crise na qual o continente africano não tem responsabilidade, a menos que sejam tomadas medidas concretas", lê-se na carta. Medidas de estímulo fiscal, recusa do protecionismo e conclusão da rodada de Doha da Organização Mundial do Comércio sobre liberalização comercial, incentivo ao investimento privado e reforço da cooperação internacional são algumas das propostas da APF.

Na primeira cúpula do G20 sobre a crise, em Washington, em novembro de 2008, os sete países mais industrializados do mundo, a Rússia e os principais países emergentes deram início à reforma mais profunda do sistema financeiro internacional dos últimos 60 anos. Das 47 medidas do Plano de Ação aprovado já foram postas em prática 28. O G20 representa 85% da economia mundial e cerca de dois terços da população.

Brasil “chique” O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva chefiou a delegação brasileira, integrada também pelo ministro Celso Amorim, pelo Ministro da Fazenda, Guido Mantega, e pelo Embaixador do Brasil no Reino Unido, Carlos Augusto Rego Santos Neves.

O presidente brasileiro defendeu a reforma das instituições multilaterais como FMI, e criticou a atual desregulação do sistema financeiro mundial. Lula ressaltou a importância de os investimentos no sistema financeiro estarem vinculados à produção e à geração de emprego e renda. “Foi a primeira reunião que eu participei em que os chamados países desenvolvidos estavam em igualdade de condições com os países em desenvolvimento. Nessa reunião, não havia ninguém que sabia absolutamente de tudo, como se nós não soubéssemos de nada”, disse.

Diante da decisão do G20, de que países antes considerados pobres passem agora a poder emprestar dinheiro, por meio do FMI, para os que estão afetados pela crise mundial, o presidente brasileiro considerou como “chique, soberano, o Brasil emprestar dinheiro para o FMI”. Lula afirmou ainda que “gostaria de entrar para a história como o presidente que emprestou algum dinheiro para o fundo”. O presidente admitiu que o país tem condições de fazer o empréstimo, mas não divulgou o valor até retornar ao Brasil.

China como grande potência Na cúpula do G20 ainda estava previsto a consagração da emergência da China como uma das grandes potências econômicas do planeta, lhe atribuindo um papel de destaque no sistema financeiro internacional. Embora já seja a terceira maior economia do mundo, depois dos Estados Unidos e Japão, os votos da China no Fundo Monetário Internacional ainda pesam menos que os da França ou do Reino Unido.

O país tornou-se especialmente visível nas últimas duas décadas, quando foi chamado de “a fábrica do mundo” e acumulou as maiores reservas em divisas do planeta, no valor de quase US$ 2 trilhões. A China é, também, o maior credor dos Estados Unidos, com uma carteira de títulos de tesouro norte-americano de cerca de US$ 740 bilhões, e já manifestou disponibilidade para comprar títulos do FMI se a instituição emiti-los. Ainda mais surpreendente, o maior país em desenvolvimento do mundo – e um dos raros que continua a ser governado por um partido comunista – assume-se hoje como campeão da luta contra o protecionismo.

Apesar de reconhecer que a reunião em Londres "não acabará com a crise da noite para o dia", Durão Barroso disse confiar em resultados concretos, especialmente em alguns pontos que considera fundamentais, como a "coordenação mundial" de planos de estímulo fiscal e dos sistemas de supervisão das instituições financeiras internacionais.

Constituído há uma década ao nível dos ministros das Finanças, o Grupo dos 20 reúne os sete países mais industrializados (EUA, Canadá, Japão, Reino Unido, França, Itália e Alemanha), União Européia e 12 outras grandes economias, entre China, Índia, Rússia e Brasil. África do Sul, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Coréia do Sul, Indonésia, México e Turquia completam a lista.

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