UM PAÍS “JUSTICIALESCO”

À evidência, todos os brasileiros corretos –e são a maioria—são contra a corrupção. A expressão popular “corrupção” envolve variada gama de crimes, entre os quais concussão, prevaricação, a corrupção propriamente dita, etc. E, na luta para extirpá-la, crimes são praticados pelo Poder Público de desconhecimento do público, como o vazamento de informações por quem deveria guardar sigilo, crime punido pelo Código Penal, artigo 325.À evidência, todos os brasileiros corretos –e são a maioria—são contra a corrupção. A expressão popular “corrupção” envolve variada gama de crimes, entre os quais concussão, prevaricação, a corrupção propriamente dita, etc. E, na luta para extirpá-la, crimes são praticados pelo Poder Público de desconhecimento do público, como o vazamento de informações por quem deveria guardar sigilo, crime punido pelo Código Penal, artigo 325.Por outro lado, o Ministério Público não é um Poder, mas função essencial à administração da justiça, no mesmo nível da advocacia (artigos 127 a 135 da CF), razão pela qual, a meu ver, POR NÃO SER POLÍCIA JUDICIÁRIA, não poderiam, seus membros, presidir inquéritos policiais, nos termos do artigo 144 § 4º da CF, que torna exclusiva tal função a delegados de carreira.Acresce-se que boas notícias não vendem jornais. Mark Twain dizia ser função da imprensa separar o joio do trigo e publicar o joio, de tal maneira que, na situação verificada nos últimos 13 anos, de assalto às contas públicas, a imprensa passou a ser a verdadeira orientadora da opinião pública, tornando a sociedade brasileira ávida de punições. Neste quadro, qualquer delação sem provas, de pessoas presas, temporária ou preventivamente para serem obrigadas a fazer colaboração premiada, é suficiente para conformar um “juízo definitivo” da sociedade sobre a culpabilidade do acusado, tornando difícil o exercício do sagrado direito de defesa, próprio dos Estados Democráticos de Direito.Com a exposição que a TV Justiça trouxe aos Ministros do Supremo Tribunal Federal – conheço-os todos e os admiro –passaram, todavia, a um protagonismo inaceitável e a promover invasão de competências parlamentares, apesar de proibidos de assim atuar, até mesmo nas inconstitucionais omissões legislativas, por força do artigo 103 § 2º da CF. Tal ativismo judicial tem gerado insegurança jurídica, pois, embora não eleitos pelo povo, os magistrados têm legislado, como fizeram ao não respeitarem o artigo 53 § 3º da CF, nas prisões de Delcídio e Eduardo Cunha; ao tornarem o acusado passível de prisão, nas decisões de Segunda Instância, contra o inciso LVII do artigo 5º da Lei Suprema; ao criarem uma terceira hipótese de aborto impunível, ou seja, o eugênico, no caso dos anencéfalos (artigo 128 da CF); ao criarem uma outra hipótese de união estável constitucional, no caso de pares do mesmo sexo, contra o artigo 226 §1º a 5º da Carta Suprema; ao permitirem que candidato derrotado assumisse, sem eleições diretas ou indiretas, nos casos de governadores e vices afastados (artigo 81 da CF), e em inúmeras outras hipóteses.Vivemos, pois, em um estado “gelatinoso” de direito, em que todos patinam e em que uma mera alegação sem prova material pode macular a imagem de qualquer pessoa, em dura violação ao inciso X do artigo 5º do Texto Supremo.E, neste momento de incertezas, em que os Poderes não se entendem e a sociedade não avança em reformas necessárias, pois todos temem que qualquer ação, nesta ou naquela linha, venha a ser suspeita, necessário se faz o retorno à independência e harmonia dos Poderes, sem invasões e gestos cinematográficos, para que o país possa sair da crise.Neste sentido, coordenado por Marcos da Costa e por mim, com a colaboração de alguns dos mais expressivos penalistas e constitucionalistas do país, estamos lançando, para o XXIII Congresso Nacional da OAB, em São Paulo, o livro intitulado “A importância do direito de defesa para a democracia e a cidadania”, pois entendemos que só a volta às competências originais dos Poderes e a valorização das instituições permitirão dar efetividade ao direito de defesa – inexistente nas ditaduras – verdadeiro alicerce do Estado Democrático de Direito.

 

Dr. Ives Gandra Martins
Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU, UNIFIEO, UNIP e das Escolas de Comando e Estado Maior do Exército-ECEME e Superior de Serra-ESG, Presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio e do Centro de Extensão Universitária – CEU – [email protected]  e escreve quinzenalmente para o Jornal Mundo Lusíada.

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