Instabilidade Laboral: o veto à respeitabilidade humana

Por Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

A dignidade da pessoa humana deveria ser um valor superior, sempre presente em todas as situações que envolvem as atividades: cívica, cultural, educacional, empresarial, económica, financeira, política, religiosa e social, entre outras, igualmente muito importantes.

As condições de vida, no mundo contemporâneo, só podem melhorar quando houver segurança nos sistemas de: saúde, trabalho, educação, direito, economia, financeiro, no conjunto de diversas outras atividades societárias, que de resto diferenciam e tornam “superior” a pessoa humana.

Atualmente, primeiro quarto do século XXI, as certezas no que quer que seja, são poucas, porque a vulnerabilidade das pessoas, a instabilidade nas instituições, ocorre frequentemente e, o próprio Estado, também ele, nem sempre se afirma com solidez suficiente, para enfrentar as diferentes crises que, normalmente, afetam mais quem depende, em regime transitório, de um qualquer sistema, de leis instáveis e de outrem que, por vezes, é insensível à precariedade de milhões de pessoas, algumas delas, sem quaisquer outros recursos que não seja a sua mão-de-obra, vendida, com alguma frequência e triste normalidade,  a preços de “saldo”, ou seja, por um salário mínimo que mal chega para uma renda de casa, alimentação insuficiente e de fraca qualidade,  vestuário inadequado para certas épocas do ano e alguma medicação.

Com efeito: «não podemos esquecer que a maior arte dos homens e mulheres do nosso tempo vive o seu dia a dia precariamente, com funestas consequências. Aumentam algumas doenças. O medo e o desespero apoderam-se do coração de inúmeras pessoas, mesmo nos chamados países ricos.» (PAPA FRANCISCO, 2016:53).

É verdade que nem tudo está errado, os avanços técnico-científicos continuam a proporcionar significativas melhorias nas condições de vida das pessoas, mas também se reconhece que, em muitos domínios da alta tecnologia, os equipamentos cada vez mais sofisticados e multifuncionais, remetem para o desemprego, em todo o mundo, milhões de pessoas, uma parte das quais sem qualquer apoio substancial e permanente, por parte das entidades responsáveis, gerando uma terrível insegurança e, em muitas situações, miséria e suicídios.

Sabe-se que o tempo em que um emprego era vitalício, realmente, já passou. Grande parte das doenças, que há algumas décadas se consideravam incuráveis, também pertence ao pretérito, embora, e em contrapartida, tenham surgido outras, bem mortíferas e contra as quais os cientistas continuam, louvavelmente, a trabalhar, sem cessar. Tudo isto é, verdade, assim o entendemos.

O equilíbrio entre o bem e o mal é muito difícil de se estabelecer, como a erradicação: das doenças, da fome, da droga, da guerra, do terrorismo, também poderá ser uma utopia, contudo, se nada se fizer contra um certo estado de situações, então, eventualmente, caminhar-se-á para pior, porque os interesses individuais, grupais, nacionais e internacionais, sobrepõem-se a uma ética da solidariedade, esta aqui considerada como valor supremo que ajudará a vencer muitas injustiças e descartes.

Em bom rigor: «É necessário hoje, como nunca, que nos eduquemos para a solidariedade, que sejam redescobertos o valor e o significado desta palavra tão incómoda, e muitas vezes desprezada, e fazer com que ela se torne uma atitude fundamental nas escolhas a nível político, económico e financeiro, nas relações entre pessoas, povos e nações. Só sendo solidários de maneira concreta, superando visões egoístas e interesses de parte, é que poderemos alcançar o objetivo de eliminar as formas de indigência causadas pela falta de alimentos.» (Ibid.:56).

Obviamente que quem vive na precariedade, seja qual for a sua natureza: saúde, familiar, emprego, salário, reforma, habitação, economia, educação/formação, entre outras omissões que a sociedade impõe, certamente não terá uma vida tranquila, segura e um futuro promissor e garantido, pelo contrário, terá uma existência indigna da pessoa verdadeiramente humana.

Naturalmente que toda a pessoa tudo deve fazer para  eliminar injustiças, reduzir a criminalidade, qualquer que esta seja, desde  aquela que atinge crianças (pedofilia), jovens e adultos (pornografia, prostituição, comercialização de órgãos e seres humanos), violência em toas as suas formas (física, psicológica, escravatura, exploração do homem pelo homem, a partir de salários irrisórios, precariedade, humilhação, deslealdade), até outras  formas mais sofisticadas.

O mal, em todas as suas vertentes, não pode ser definitivo, consolidado, pelo contrário, deverá, primeiramente, ser precário e, numa fase mais evoluída da racionalidade humana, e da ética do respeito, terá de ser radicalmente eliminado, dando lugar ao bem que, por agora, parece instável, em muitas situações, devendo caminhar para o seu aperfeiçoamento e estabilização, em permanente melhoria.

Numa perspetiva moderadamente otimista, convém recordar que: «A humanidade vive, neste momento, uma viragem histórica que podemos constatar nos progressos que se verificam em vários campos. São louváveis os sucessos que contribuem para o bem-estar das pessoas, por exemplo, no âmbito da saúde, da educação e da comunicação.» (Ibid.:53).

Como seria maravilhoso caminharmos sempre neste rumo de preocupações pelo bem-comum e pelo bem-estar de cada pessoa, em particular; como seria fantástico que a inteligência humana fosse, por uma Entidade qualquer, iluminada para o bem; como seria desejavelmente concretizáveis os melhores projetos que visassem a melhoria das condições de vida das pessoas, dos povos e das nações; enfim, como seria sedutor alcançar a solidez na: solidariedade, amizade lealdade, humildade e gratidão!

Possivelmente, haverá uma melhora para as futuras gerações, contudo, não podemos ser ingénuos porque: «A alegria de viver frequentemente se desvanece; crescem a falta de respeito e a violência, a desigualdade social torna-se cada vez mais patente. É preciso lutar para viver, e muitas vezes viver com pouca dignidade. Esta mudança de época foi causada pelos enormes saltos qualitativos e quantitativos, velozes e acumulados que se verificam no progresso científico, nas inovações tecnológicas e nas suas rápidas aplicações em diversos âmbitos da natureza e da vida. Estamos na era do conhecimento da informação, fonte de novas formas de um poder muitas vezes anónimo.» (Ibid.:53-54).

A situação de precariedade em que vivem milhões de pessoas, só em Portugal, são algumas centenas de milhares e, se se considerar todas as pessoas que estão num patamar económico, que se designa por “limiar da pobreza”, então o número eleva-se a quase dois milhões, o que equivale, aproximadamente, a dezassete por cento da população, onde se destacam os desempregados, crianças, adolescentes e idosos.

Esta chaga social, que é a precariedade, obviamente que conduz a situações de autênticos atentados à dignidade humana, aos mais elementares Direitos Humanos, porque se gera a instabilidade, a insegurança, a escassez de recursos, a fome, a miséria, o conflito e a morte prematura, até porque e em boa verdade: «É um escândalo que ainda haja fome e subalimentação no mundo! Não se trata só de responder a emergências imediatas, mas de enfrentar juntos, a todos os níveis, um problema que interpela a nossa consciência pessoal e social, para chegar a uma solução justa e duradoura. Ninguém seja obrigado a deixar a própria terra e o seu ambiente cultural pela falta de meios essenciais de subsistência!» (Ibid.:55).

Numa sociedade, em que tantos responsáveis por altos cargos nacionais e internacionais proclamam, todos os dias, que é necessário tomarem-se medidas para combater e eliminar determinados flagelos, a verdade, todavia, é que continuam a existir muitas situações que são verdadeiros atropelos à respeitabilidade da pessoa humana, o que, apesar de tudo, não invalida que se reconheça alguns avanços na resolução de outros problemas, designadamente no âmbito: da saúde, da educação, da alimentação, das tecnologias que vão aliviando de esforços mais violentos, quem trabalha,.

Haverá, contudo, fortes motivos para um otimismo moderado, para se acreditar num futuro bem melhor. A esperança não deve morrer em nossas consciências, porque a inteligência humana, tudo indica, não tem limites e, a esmagadora maioria dos investigadores, cientistas e técnicos continuam a trabalhar para um mundo melhor, para, paulatinamente, devolverem a dignidade plena a todas as pessoas.

Bibliografia.

PAPA FRANCISCO (2016). Proteger a Criação. Reflexões sobre o Estado do Mundo. 1ª Edição. Tradução, Libreria Editrice Vaticana (texto) e Maria do Rosário de Castro Pernas (Introdução e Cronologia), Amadora-Portugal:20/20 Nascente Editora.

 

Venade/Caminha – Portugal, 2020

Com o protesto da minha perene GRATIDÃO

 

Por Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
Presidente do Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal
NALAP.ORG
[email protected]

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