A despedida de Antonio Costa do Parlamento: “Que sejamos tão felizes nas vidas que teremos a seguir”

Da Redação com Lusa

Na segunda-feira, o primeiro-ministro despediu-se do parlamento português com “um grande abraço” e desejos a todos que, como ele próprio, não se recandidatem nas próximas eleições, que sejam pelo menos tão felizes no futuro como nas funções que exerceram.

“O que quero desejar a todos os deputados que serão reeleitos nas próximas eleições é a continuação de bons mandatos. Aos que, como eu, não serão reeleitos quero desejar que seja o primeiro dia do resto da vossa vida e que sejamos tão felizes nas vidas que teremos a seguir como pelo menos fomos nas vidas que exercemos ao longo destes anos”, afirmou.

No final do debate preparatório do Conselho Europeu, e naquela que terá sido a sua última intervenção na Assembleia da República antes da dissolução de 15 de janeiro, António Costa pediu alguns segundos para umas palavras de despedida.

O primeiro-ministro começou por salientar a “grande honra” de ter, por seis vezes, sido eleito deputado e por três vezes ter integrado como ministro Governos que responderam perante o parlamento, além de ter chefiado, desde 2015, três executivos.

“Quero saudar, sem qualquer exceção, todas as bancadas deste parlamento. Naturalmente, o parlamento é feito de controvérsia, é feito de contraditório, às vezes mais vivo, outras vezes menos vivo”, disse.

O primeiro-ministro aproveitou para acrescentar que, se ao longo destes anos, melindrou alguém “não o fez intencionalmente”, e, se alguém o melindrou, já o esqueceu.

António Costa despediu-se do parlamento com “um grande abraço” e “votos de continuação de bom trabalho”.

Após uma longa ovação de deputados do PS de pé, à qual se juntaram sentados alguns deputados do PSD, o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, usou da palavra.

“Quero agradecer ao senhor primeiro-ministro toda a disponibilidade que teve para a fiscalização por parte da Assembleia da República e toda a solidariedade que pôde existir entre os dois órgãos de soberania. É perante a Assembleia que o Governo responde politicamente. O senhor primeiro-ministro compreendeu bem, tenho a agradecer-lhe por isso”, disse.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, assinou na quinta-feira o decreto de demissão do Governo (que entrou em vigor na sexta-feira), um mês depois de o primeiro-ministro ter apresentado a sua demissão ao chefe de Estado, em 07 de novembro, que a aceitou de imediato e, consecutivamente, decidiu dissolver o parlamento e marcar eleições legislativas antecipadas para 10 de março.

O chefe de Estado já anunciou que a dissolução da Assembleia da República será decretada em 15 de janeiro, último dia possível para que haja legislativas em 10 de março, tendo em conta que nos termos da Constituição e da lei eleitoral isso tem de acontecer no período entre o 55.º e o 60.º dias anteriores à data escolhida para as eleições.

O primeiro-ministro, António Costa, apresentou a sua demissão ao Presidente da República em 07 de novembro, por causa de uma investigação judicial sobre a instalação de um centro de dados em Sines e negócios de lítio e hidrogênio que levou o Ministério Público a instaurar um inquérito autónomo no Supremo Tribunal de Justiça em que é visado.

Presidente errou

Ainda dia 11, o primeiro-ministro afirmou que a procuradora-geral da República oficializou uma suspeita contra ele e que não lhe restava outra opção que não a demissão, e considerou que o Presidente da República errou ao dissolver o parlamento.

Estas posições foram assumidas por António Costa numa longa entrevista que concedeu à TVI, conduzida pelo jornalista Nuno Santos, depois de na sexta-feira o Presidente ter formalmente demitido o seu Governo.

“A procuradora-geral da República oficializou uma suspeição a meu respeito, que, do meu ponto de vista, para a preservação do cargo que exerço, exigia a minha demissão. Como disse na altura e hoje mantenho, tenho a minha consciência absolutamente tranquila sobre o que fiz ou o que deixei de fazer e, portanto, estou totalmente disponível para colaborar com a justiça, se e quando a justiça entender que eu deva colaborar com a justiça”, declarou o líder do executivo.

Mas houve outra situação em que o primeiro-ministro admitiu que poderia ter motivado a sua demissão: O dinheiro que foi encontrado nas buscas efetuadas na sala de trabalho do seu ex-chefe de gabinete Vítor Escária, na residência oficial de São Bento, onde foram encontrados mais de 75 mil euros em dinheiro.

António Costa frisou que só soube que esse dinheiro tinha sido encontrado em 08 de novembro, no dia seguinte ao da sua demissão do cargo de primeiro-ministro.

“Depois houve factos novos, que eu não conhecia naquela altura e que podiam ter contribuído seriamente para que eu tivesse tomado esta decisão independentemente do comunicado” emitido na véspera pelo gabinete de imprensa da Procuradoria Geral da República.

“Esse é um facto que só é conhecido no dia seguinte. Poder-me-ia ter levado a tomar esta decisão”, disse.

Em relação à atuação do Presidente da República, perante a chamada Operação Influencer, o primeiro-ministro considerou que “tinha tido todas as condições para encontrar uma solução alternativa que poupasse o país a crise” política.

“Tenho a certeza absoluta que quem nos está a ouvir em casa ninguém deseja ir para eleições. A última coisa que os portugueses pensam e desejam é irmos para eleições. Não há uma vaga de fundo no sentido da mudança. As pessoas estão tristes. Foram anos muito duros, muito difíceis”, sustentou.

Neste momento, António Costa disse que a sua esperança “é que a justiça trate com a diligência possível” o caso em que está envolvido.

“É do meu interesse, como é óbvio, que isso seja esclarecido, mas acho que é do interesse geral dos portugueses saberem se podem confiar na pessoa em quem confiaram para primeiro-ministro ao longo destes anos. É bom para a imagem internacional do país, porque talvez não tenham noção do impacto internacional que este caso teve”, referiu.

António Costa voltou a dizer-se “magoado mas conformado”.

“Aguardo serenamente que a justiça tome uma conclusão sobre o que é que vai fazer: se vão mesmo avançar com um inquérito, se me vão constituir arguido, se não me vão constituir arguido. Não sei. Como sei exatamente o mesmo que sabia naquela altura [no dia da demissão em 07 de novembro] não posso acrescentar muito”, argumentou.

Interrogado se está arrependido de não ter aceitado a proposta do ex-presidente do PSD Rui Rio para uma reforma da justiça, António Costa rejeitou, alegando que o caminho proposto pelos sociais-democratas visava reduzir a autonomia do Ministério Público.

“Não é pelas circunstâncias terem mudado que eu mudei as minhas convicções, porque essas são muito firmes. E não é por este ou aquele agente da justiça poder agir incorretamente que eu deixo de crer no sistema de justiça. E acredito que o sistema de justiça funciona”, alegou.

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