Da redação
Com Lusa
O debate sobre o Plano de Recuperação e Resiliência encerrou neste dia 23 com críticas da oposição ao documento, com PSD e CDS a pedirem mais atenção às empresas e BE e PCP aos problemas dos trabalhadores e SNS.
Na fase de encerramento do debate parlamentar temático pedido pelo Governo sobre a visão estratégica para o Plano de recuperação econômica de Portugal 2020-2030, o novo líder parlamentar do PSD, Adão Silva, reiterou a posição do partido que “as empresas têm de ser as principais destinatárias” destes recursos.
“Se, por oportunismo ideológico, viessem a concentrar-se nas clientelas políticas e amiguismos e ainda na criação de um Estado mastodôntico, estaríamos a andar para trás e ao contrário dos ventos da História”, afirmou, avisando o Governo que “não pode instrumentalizar aquele ‘jackpot'”.
Adão Silva reiterou ainda as preocupações expressas no início do debate pelo líder do PSD, Rui Rio, de que o dinheiro possa não ser bem aproveitado devido às “cadeias de corrupção”, invocando vários casos judiciais envolvendo um ex-primeiro-ministro acusado [José Sócrates], antigos banqueiros e o topo da magistratura para que a sociedade possa “temer o pior”.
Também o CDS-PP, pelo líder parlamentar Telmo Correia, pediu mais atenção às empresas e economia exportadora e questionou o Governo sobre o quê é que pretende encontrar um consenso neste plano.
“Este plano é em larga medida um vasto conjunto de generalidades, é uma espécie de carta dirigida ao pai Natal europeu, onde cabe tudo aquilo que o país pode querer e desejar. A questão é que terá de ser paga, como é que nós portugueses vamos pagar?”, questionou.
À esquerda, o líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, questionou o Governo sobre as saídas de médicos do Serviço Nacional de Saúde (SNS) registradas durante a pandemia.
“Se de fato o SNS é uma aposta do país, se de facto os seus profissionais são uma aposta do Governo, é inexplicável que no momento em que mais precisamos deles não tenhamos conseguido que se mantivessem no SNS”, criticou.
Pedro Filipe Soares acusou ainda o autor da primeira versão do plano, o gestor António Costa e Silva, de ter “falhado na análise”, apontando que o documento não tem “uma palavra” sobre a necessidade de valorização dos rendimentos do país e “nem uma linha” sobre a proteção do emprego.
A este propósito, o líder parlamentar do Bloco criticou o presidente do PSD por ter contestado o aumento do Salário Mínimo Nacional, dizendo que “há fantasmas que vêm tirar o sono a Rui Rio e à sua bancada”.
Pelo PCP, também o líder parlamentar João Oliveira criticou a intervenção de Rio no debate: “Quem fez prática governativa de cortes de salários, tarde ou nunca se habitua a que os salários dos trabalhadores tenham de aumentar”.
Ao plano de recuperação, o deputado comunista considerou que faltam “medidas e ações concretas” para responder aos “problemas imediatos dos portugueses”, como o “número recorde” de trabalhadores em ‘lay-off’, os “horários desregulados” ou as ameaças de despedimentos na Autoeuropa.
Inês Sousa Real, líder parlamentar do PAN, reconheceu “uma série de boas intenções” ao plano.
“Mas não podemos deixar de manifestar a nossa decepção. Na verdade, traduz-se em muito pouco, porque assenta no pressuposto de que podemos manter o atual modelo socioeconômico”, disse, apelando ao Governo para que acolha uma “visão mais progressista e sustentável” para a recuperação do país.
Na mesma linha, também o líder parlamentar d’ “Os Verdes” José Luís Ferreira considerou que “será um erro irreversível” se o Governo quiser recuperar a economia com opções que provocam “graves impactos ambientais”, apontando como exemplos a localização do futuro no aeroporto do Montijo ou a “exploração desenfreada” de lítio.
“Recuperar a economia sacrificando valores ambientais é tapar um buraco criando outro buraco que nem a mais potente bazuca poderá regularizar”, avisou.
Visão limitada
O ministro do Planejamento, Nelson de Souza, lamentou a “visão limitada e redutora” dos partidos da direita do hemiciclo, no encerramento do debate parlamentar.
“De uma forma ou outra, uns mais vocalizados que outros, quase todos os partidos da direita criticaram a alegada alocação excessiva de fundos ao Estado no PPR. Trata-se de uma apreciação que consideramos de muito limitada e redutora, apenas sustentada na contabilidade do quinhão de financiamento diretamente atribuído às empresas”, afirmou.
O responsável governamental acusou PSD, CDS-PP, Chega e Iniciativa Liberal de não reconhecerem que, “com o investimento público previsto, o Estado vai produzir bem e serviços públicos que irão reduzir custos de contexto para as empresas e oferecer melhores serviços coletivos aos cidadãos, entre os quais estão também os trabalhadores das empresas”.
“Mas também se trata de uma visão redutora porque ignora a procura gerada pelo investimento público na construção e obras públicas, bens de equipamento e de transporte e de serviços de TIC [Tecnologias da Informação e da Comunicação]”, continuou.
O ministro revelou-se ainda aberto a “estudar novos meios, modificando a ‘caixa preta’ que é o sistema de gestão e controlo de fundos”, pretendendo transformá-lo “num sistema de paredes de vidro, que assegure o bom uso dos fundos e promova a eficiência e a celeridade”.
“Finalmente, a obsessão ideológica direita contra o papel do Estado, impede-a de perceber, afinal de contas, o que é evidente: o setor privado não está na atual conjuntura nas melhores circunstâncias para investir e que só o Estado pode desempenhar essa função de imediato na economia em escala mais alargada”, defendeu Nelson de Sousa.