Celso de Mello: massacrado por cumprir a lei

Por Luiz Flávio Gomes

Todos os parasitas e corruptos devem ser condenados, independentemente de ser rico ou pobre, preto ou branco, petista, peessedebista ou qualquer outra coisa. A ética condena duramente todos aqueles que se valem do poder para nele se perpetuar de forma ilícita e desonesta (sobretudo comprando votos de outros parasitas para garantir a governabilidade ou a reeleição). Mas “nada é mais terrível de se ver do que a ignorância [midiática] em ação” (Goethe, alemão, escritor).

Por mais chocante que tenha sido, a verdade é que Celso de Mello apenas cumpriu a lei e nenhum juiz em nenhum lugar do mundo pode deixar de fazer isso (sob pena de rapidamente se destruir o país). Nos julgamentos judiciais, “Soberana não é a massa, sim a lei” (dizia Aristóteles).

A população hiperinflamada (e, com razão, profundamente indignada com a aberrante e secular impunidade das classes dominantes parasitas e corruptas) tem dificuldade de entender tudo isso. Mas é o que ocorreu. Essa dificuldade aumenta quando o país tem a falta de sorte de contar com uma mídia descaradamente mentirosa, envenenada e ignorante (de pontos relevantes da questão), que só sabe jogar lenha na fogueira do obscurantismo medieval.

Se Celso de Mello, como juiz, votou de acordo com a lei, perguntam indignadamente vários internautas, então isso significa que os outros 5 ministros que negavam os embargos foram imbecis ou desonestos ou ignorantes? Nada disso.

Para os que não estão familiarizados com a área, saibam que o direito não é matemática. Muitas vezes há espaço para duas ou mais interpretações (todas razoáveis). O que ocorreu no julgamento de quarta-feira (18/9) e que a mídia podre e canalha não explicou (e não explica) para a população foi o seguinte: nenhum dos 5 votos contrários revelou que sabia da discussão que houve no Congresso Nacional em 1998 sobre a revogação dos embargos infringentes no regimento interno do STF. Nenhum dos 5 votos contrários ao recurso mencionou essa questão. Ignorou-a completamente. Talvez não soubessem disso. E quiçá até mudariam o voto se tivessem conhecimento desse detalhe (relevantíssimo).

Diziam que tinha havido revogação tácita do regimento interno em 1990 (JB, Fux etc.). Como pode ter havido revogação tácita de um dispositivo que o Congresso Nacional discutiu abundantemente em 1998, a partir de um projeto do governo FHC, recusando-o explicitamente, mantendo o texto como estava?

Qualquer um é capaz de perceber, com essas informações, o quanto foi descomunal, bestial e cafajeste o massacre de alguns setores midiáticos contra o voto de um juiz que apenas cumpriu a lei.

 

Por Luiz Flávio Gomes
Jurista e coeditor do portal atualidades do direito (www.atualidadesdodireito.com.br).

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