Convenção sobre mobilidade pode ser “virar de página” na CPLP

Mundo Lusíada
Com Lusa

O Presidente de Cabo Verde e em exercício da comunidade lusófona disse nesta quinta-feira que a convenção sobre a mobilidade “pode ser um virar de página” na CPLP, sublinhando as “complexas negociações” entre os nove países para chegar ao documento.

“Estamos todos à espera de que, quando passarmos a presidência a Angola, em julho, possamos apresentar um documento vital para a comunidade, um documento que é um virar de página no percurso da organização, a convenção sobre a mobilidade na CPLP”, disse Jorge Carlos Fonseca.

“Apostamos imenso nesse documento. É um documento muito complexo, que exigiu intensas e complexas negociações entre países com estágios de desenvolvimento diferentes e com problemas específicos”, acrescentou.

O chefe de Estado cabo-verdiano e presidente em exercício da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) falava durante um seminário internacional, organizado pela RDP África e que este ano assinala os 25 anos da emissora e da própria CPLP, e num debate com o chefe de Estado português, Marcelo Rebelo de Sousa.

Jorge Carlos Fonseca evocou dificuldades inerentes ao facto de os nove países estarem inseridos em espaços geográficos diferentes e com compromissos assumidos “no quadro das suas integrações regionais”, apontando os exemplos de Portugal, na União Europeia, e do Brasil, no Mercosul.

“Mas, conseguimos e temos já um documento, uma convenção de mobilidade da CPLP, que passou por vários crivos de reuniões técnicas, de embaixadores, de ministros da Administração Interna e dos Negócios Estrangeiros”, assinalou.

“Portanto, falta agora que seja aceite e assinada na cimeira de chefes de Estado e do Governo, em Luanda, para depois cada Estado aprovar ou ratificar e possa entrar em vigor, permitindo a concretização do sonho de transformar a CPLP de uma comunidade de países, numa comunidade de povos e cidadãos”, acrescentou.

Para Jorge Carlos Fonseca, o projeto de mobilidade é “uma ferramenta decisiva” sem a qual “dificilmente se atingirão metas ambiciosas em outras áreas”, nomeadamente na cooperação econômica e empresarial ou na concretização do mercado comum de bens e agentes culturais.

Jorge Carlos Fonseca, que durante o debate se assumiu como um crítico da CPLP nos primeiros anos da sua formação, considerou que a comunidade tem feito “um percurso positivo em muitas áreas” e que a imagem que persiste de que é apenas uma comunidade de estados e um fórum de concertação diplomática e política é hoje “injusta”.

Por outro lado, defendeu, essa “crítica severa”, nomeadamente de intelectuais e jornalistas, revela as grandes expetativas das sociedades relativamente à organização

“Não há um intelectual que se preze que não seja um crítico severo da CPLP. Isso quer dizer que, no fundo, esses setores têm uma grande ambição para esta comunidade e, às vezes, é uma ambição que se traduz em exigir ou pedir que faça coisas que não pode fazer em função da sua natureza e do perfil da organização”, disse, dando como exemplo as solicitações de reação a crises como a de Cabo Delgado, em Moçambique.

“Percebo que diga e se questione que a CPLP não diz nada, não faz nada. É uma posição que se compreende, mas que tem de ser relativizada em função daquilo que pode fazer face a esse dossiê. A CPLP não tem um exército que pudesse deslocar a Moçambique se o país o quisesse e aceitasse”, exemplificou.

Presidente português

O Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, disse neste dia 15 que a comunidade lusófona tem “mais a dar do que já deu”, considerando que se, no futuro, não conseguir responder aos problemas das pessoas, não existe.

“O que as pessoas querem é uma Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) para as pessoas porque, se não responder aos problemas das pessoas, não existe”, disse Marcelo Rebelo de Sousa.

“Pode existir para os contatos internacionais e para apoiar candidaturas internacionais – e aí funciona muito bem – mas tem é de intervir nos problemas concretos das pessoas”, acrescentou.

O Presidente português apontou, neste contexto, os “três problemas fundamentais” no atual contexto CPLP: mobilidade, resposta sanitária e abordagem aos efeitos econômicos e sociais da pandemia.

Marcelo Rebelo de Sousa considerou que, de uma maneira geral, toda a comunidade internacional falhou na resposta à pandemia, adiantando que entre os países lusófonos os passos dados, nomeadamente na disponibilização de vacinas, têm sido sobretudo bilaterais e pouco no âmbito da CPLP.

“No futuro, temos de olhar para isso como temos de olhar para as consequências económicas e sociais desta pandemia”, disse.

Reconhecendo que há uma parte que só cada país e cada economia pode resolver, Marcelo Rebelo de Sousa defendeu que, “no mínimo” o diálogo, a conjugação de esforços e a procura de soluções devem ser “levados mais longe”, quer a nível bilateral, quer no quadro do bloco lusófono.

Considerou, por outro lado, que a comunidade tem “funcionado menos bem no acompanhamento de situações específicas de Estados”, considerando “importante, quando há uma crise mais acentuada, saber como intervir”.

“A CPLP não se pode eximir a estar atenta e operacional em relação ao que se passa, quanto mais não seja por solidariedade relativamente a um dos seus membros, mas sentimos também que a soberania depois leva a que cada qual defina os termos da sua da sua própria jurisdição e do seu exercício”, disse, numa alusão às críticas recorrentes à inação da comunidade em crises como a de Cabo Delgado, em Moçambique.

Por outro lado, Marcelo Rebelo de Sousa reconheceu que, muitas vezes, a intervenção da CPLP existe do ponto de vista diplomático e dos contactos bilaterais, mas não é conhecida ou “não pode ser visível”.

Durante o debate, os dois chefes de Estado manifestaram-se “ansiosos” e “otimistas” com a possibilidade de, durante a próxima cimeira de chefes de Estado da organização, prevista para julho, em Luanda, ser assinada a Convenção sobre Mobilidade na CPLP, considerando que representará uma “viragem” e será “a base” de uma “verdadeira comunidade” de pessoas.

Marcelo Rebelo de Sousa elogiou o papel da presidência cabo-verdiana da CPLP no acordo sob mobilidade alcançado entre os nove países, considerando que é “o empurrão decisivo” para uma futura comunidade mais próxima das populações.

“O desafio dos próximos anos é esse: ou as pessoas são o centro da CPLP ou a CPLP cumpre algumas missões políticas e diplomáticas e outras, mas passa largamente à margem das pessoas”, disse.

Integram a CPLP Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

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