Crise na habitação é “pandemia social” provocada pela renda usurária e lucro fácil – BE

Da Redação com Lusa

A líder bloquista, Mariana Mortágua, classificou hoje a crise na habitação de “pandemia social”, que tem como vírus “a renda usurária e o lucro fácil” e um Governo que transforma as cidades “em Disneylândias”.

“É a pior pandemia, porque da outra pandemia [covid-19] nós não conhecíamos o vírus, não tínhamos vacina, não sabíamos como nos defender e tivemos que inventar tudo, recorrer a tudo. Tomamos medidas excepcionais e salvámo-nos”, afirmou Mariana Mortágua, durante a sessão de encerramento do Fórum Socialismo, a `rentrée´ política do BE, que decorreu em Viseu.

Segundo a coordenadora do BE, agora o vírus é conhecido, “a renda usurária e o lucro fácil” e uma maioria absoluta que transforma as cidades “em Disneylândias e sobe tanto os preços e as rendas que empobrece até quem vivia com algum conforto”.

“Acrescentamos a inflação dos preços dos alimentos e temos o retrato de Portugal: o salário deixou de dar para viver e a pensão não permite sobreviver”, lamentou.

No seu entender, esta pandemia “não pode ser escondida” e foi descoberta “no incêndio da Mouraria, numa loja onde dormiam 16 pessoas”.

“Quantas mais há por esse país fora? Quanta gente a dormir no local de trabalho, na obra, nos restaurantes, no porta-bagagens de um carro?”, questionou.

Mariana Mortágua aludiu também aos “contentores em que vivem centenas de imigrantes em Odemira e noutras Odemiras, tudo legalizado por uma resolução de Conselho de Ministros que permite dez anos de contentores e lhes chama delicadamente unidades amovíveis de alojamento”.

“Fixem bem este nome, já faltou mais para o Governo decretar unidades amovíveis de alojamento nas traseiras das faculdades das universidades e dos politécnicos”, avisou.

A líder do BE lembrou que, “este ano, Lisboa tornou-se a cidade com as rendas mais caras da Europa, destronando Amesterdão”, e que Portugal é “o país do Sul da Europa onde é mais caro comprar uma casa”.

“Há oito anos, o PS prometeu que no dia 25 de Abril de 2024, ou seja, daqui a ano e meio, estaria resolvido o problema mais premente da habitação em Portugal. Agora diz que tem muitos projetos em curso e que o prazo nunca foi para cumprir. O Governo nem se dá conta de que a realidade já ultrapassou, e muito, todos os desenhos e todas as promessas que faz”, lamentou.

Mariana Mortágua frisou que “esta é mesmo a crise que o Governo quis que fosse, é o seu projeto”, porque, “para a maioria absoluta, a economia é o turismo e os seus aliados estão na finança que assombra as cidades, não estão nos jovens que procuram uma casa, nem estão nos idosos que são expulsos das suas casas de uma vida inteira”.

“O turismo é o maná de uma aliança férrea entre alguns autarcas, empresas de construção, especuladores e a finança. Para subir os preços das casas, o Governo agarrou-se aos vistos Gold, apesar de todas as evidências de corrupção e de escandaleira”, afirmou.

Na sua opinião, “é também por isso que anda a convidar nômades digitais, para subir os preços das casas”.

“Por isso, mantém os benefícios fiscais para os reformados nórdicos, para subir o preço das casas. Por isso, permite bairros que são parques de alojamento local, facilita o investimento dos fundos, simplifica as regras de licenciamento, porque assim sobe o valor das casas que é o que convém a essa poderosa aliança que domina a nossa economia”, considerou Mariana Mortágua, concluindo que “o Governo quis subir o preço das casas e conseguiu”.

A coordenadora do BE mostrou-se convencida de que se vão “construir mais hotéis e mais casas de luxo e os preços vão continuar a subir”.

“É o sonho dos liberais e de toda a extrema-direita, que são a claque de apoio desta aliança de especuladores e só podem agradecer à maioria absoluta do PS ter conseguido aquilo que Assunção Cristas apenas começou, que é colocar Portugal no topo dos países com a habitação mais cara da Europa”, lamentou.

Baixar preços

A coordenadora do BE defendeu hoje o controle das rendas, a redução da margem dos bancos nos juros e a proibição da venda de casas a não residentes como soluções urgentes para baixar o preço da habitação.

EM seu discurso, Mariana Mortágua disse que é preciso urgentemente “controlar as rendas, com tetos ajustados a cada região, a cada tipologia de imóvel e, mais importante do que tudo, ajustados aos salários” pagos em Portugal.

No seu entender, é também necessário “reduzir a margem dos bancos nos juros”, uma vez que se registaram “lucros de 5.000 milhões de euros nos últimos 18 meses, que a ganância arrancou à custa de tanto sacrifício”.

“E porquê? Limitem-se os aumentos dos juros à taxa de esforço de cada família e aí, finalmente, vamos ter justiça com a banca em Portugal”, justificou.

A líder bloquista disse também ser preciso “proibir a venda de casas a não residentes”, excecionando-se os emigrantes portugueses, porque tal está a inflacionar os preços para “muito acima dos salários pagos em Portugal”.

O BE quer “juntar quem não consegue sair de casa dos pais e quem desespera por uma casa onde caibam os filhos, quem enfrenta o despejo e quem já não sabe como pagar o crédito à habitação, quem paga a renda e fica sem nada ao final do mês e quem, por isso, pensa em emigrar”.

“Não aceitamos ser expulsos das nossas cidades colonizadas por um turismo invasivo que nos reduz a figurantes e a serviçais. Pertencemos aqui, vivemos aqui, não desistimos do nosso país, não abdicamos do nosso direito a uma vida boa”, sublinhou Mariana Mortágua, perante as cerca de 400 pessoas que participaram no Fórum Socialismo.

Segundo a coordenadora do BE, estas medidas resultam e, “noutros países, algumas delas são aplicadas por governos de esquerda, do centro e até liberais”.

“São medidas que aliviam as famílias agora, no tempo das nossas vidas, não é na geração que há-de vir. É agora que precisamos da vacina contra esta pandemia”, considerou, acrescentando que estas medidas são a certeza de que nas cidades portuguesas “haverá sempre vizinhos, cafés de bairro, amigos à sombra, dominó e sueca nos jardins”.

“Ninguém se atreva a dizer que são medidas radicais, porque não há nada mais brutalmente radical do que trabalhar, ter um salário e não conseguir pagar uma casa”, frisou.

E reforçou: “Não se atrevam a dizer que não é possível, porque Portugal é possível. Portugal tem que ser possível, queira a maioria absoluta ou não”.

Também acrescentando que o Governo virá dizer “que está à espera de Frankfurt para confirmar se, de fato, há mesmo um problema dos juros [da habitação] em Portugal”.

A líder bloquista aproveitou o Fórum Socialismo para enviar “uma nota quase de saudação ao governador do Banco de Portugal”, que no início do ano “avisava que os salários não deviam subir mais de 2%”.

“Ele bem sabia que era para os mutilar com a inflação. Agora, perante as consequências daquilo que andou a defender, o governador descobriu de repente que não se deve fazer de mais e que é tempo de ir sustentando a subida dos juros, devagarinho. Baixá-los nunca”, acrescentou.

Ou seja, segundo Mariana Mortágua, “para Mário Centeno a pilhagem deve, por isso, continuar exatamente como está, e se possível servida ao lado com cortes estruturais na despesa do Estado, como se não bastassem as enormes folgas orçamentais, só no último ano de 3.500 milhões de euros”.

“O cuidado de Centeno para não fazer de mais é exatamente o mesmo que tem levado o primeiro-ministro a recusar aumentos salariais justos com a ameaça de uma espiral inflacionista. E assim o Governo fez sempre de menos. E virou as costas ao país”, criticou.

No entanto, para o BE a prioridade é baixar o preço da habitação e, por isso, “dentro de semanas”, apresentará propostas “para fazer justiça fiscal e reforçar outras componentes do rendimento do trabalho”.

“Fazer esquerda é fazer comunidade e, se contra Portugal está essa aliança das casas a preço de ouro, dos salários baixos e da precariedade, o nosso lado será o da gente que toma a responsabilidade”, garantiu, apelando a que setembro seja o mês da luta pela habitação.

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