União Europeia tem sistemas obsoletos e precisa reconstruir base de apoio – Marcelo

O Presidente de Itália, Sergio Mattarella, ladeado pelo rei de Espanha, Felipe VI, e pelo Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, na cerimônia final da 18ª Cimeira Europeia da COTEC, no Convento de São Francisco, em Coimbra, Portugal, 14 de maio de 2025. PAULO NOVAIS/LUSA

O Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, considerou hoje que a União Europeia tem um problema político de concepção de liderança ultrapassada e sistemas institucionais obsoletos e precisa de reconstruir a sua base de apoio.

Numa intervenção no encerramento da 18.ª cimeira Cotec Europa, no Convento de São Francisco, em Coimbra, o chefe de Estado afirmou que “o problema da Europa não é econômico, não é tecnocrático, é um problema político”.

“É um problema político porque o tempo perdido foi perdido politicamente, porque os sistemas estão obsoletos, porque a base de apoio do projeto europeu tem vindo a enfraquecer”, acrescentou Marcelo Rebelo de Sousa.

O Presidente da República defendeu que “o problema político tem de ser resolvido na base do apoio ao projeto europeu”.

Marcelo Rebelo de Sousa argumentou que “não há Comissão Europeia, não há Parlamento Europeu, não há Conselho Europeu com força para tomar as decisões políticas, se elas forem questionadas nas bases num número considerável de Estados-membros da Europa”.

“Não é possível resolver o problema se não reconstruindo a base de apoio interno, Estado-membro a Estado-membro, ao projeto europeu. Construindo condições para a unidade europeia”, reforçou, advertindo para a possibilidade de se começar a funcionar “em grupos de Estados-membros”.

“Não há unidade possível, nem liderança forte possível na Europa assim, como não há no plano nacional. Este é o desafio”, declarou, perante o Rei de Espanha, Felipe VI, e o Presidente de Itália, Sergio Mattarella, que também discursaram nesta sessão de encerramento.

De acordo com Marcelo Rebelo de Sousa, a União Europeia “perdeu tempo” e não soube adaptar-se em termos de “liderança ao nível europeu” e de “liderança nos Estados-membros” às mudanças que ocorreram no mundo no estilo e nos meios mais rápidos e diretos de comunicação.

“Passou um ano e o essencial da aplicação, da concretização dos planos de há um ano está por executar”, apontou.

Segundo o chefe de Estado, “as instituições europeias e nacionais têm uma conceção de liderança e de sistema institucional ultrapassados” e a União Europeia tem sofrido com “perda de liderança na ciência, na tecnologia, na energia, nas finanças, nos mercados de capital, no mercado interno – tudo problemas políticos”.

“Os valores estão certos. A Europa tem os valores certos. Se há outros que querem mudar de valores, ou esquecer os valores, estão errados. Nós temos os valores certos. Não temos é os instrumentos para politicamente aplicar com eficácia, agora e no futuro, os valores certos”, sustentou.

No seu entender, “a base de apoio, que nas democracias é sempre a base dos moderados, enfraqueceu”, enquanto “a base de enfraquecimento do projeto europeu, que é dos radicalismos, aumentou”, com as crises, a demora e ineficácia na ação e também “pela pressão externa daqueles que beneficiam com a fraqueza da Europa”.

Neste discurso, Marcelo Rebelo de Sousa apontou a reeleição de Donald Trump como Presidente dos Estados Unidos da América como “um choque” para muitos, “porque a Europa estava distraída, porque o mundo estava distraído”.

O desafio de reconstruir a base de apoio do projeto europeu “tornou-se mais claro com o isolacionismo, com o protecionismo, com a intervenção unilateral de um aliado de praticamente sempre” e também com a “situação vivida na Ucrânia e em outras regiões em guerra”, disse.

Neste contexto, elogiou o papel da Cotec Europa, que reúne membros das associações empresariais Cotec de Portugal, Espanha e Itália e tem juntado os respetivos chefes de Estado.

O chefe de Estado desaconselhou “queixumes” em relação a alguém que “de vez em quando se esquece que é aliado”, e apelou: “Esse aliado trata dos seus problemas. Tratemos nós dos nossos. Sigamos em frente. É esse o papel da Cotec. É esse o papel de grandes países na Europa e no mundo como são a Espanha, a Itália e Portugal”.

Elogios

Marcelo Rebelo de Sousa recebeu hoje agradecimentos e elogios do Rei de Espanha “pelo seu apoio constante” e “atitude positiva” e do Presidente de Itália pelo “incansável empenho” no projeto europeu.

As palavras de Felipe VI e Sergio Mattarella foram dirigidas ao chefe de Estado português no encerramento da 18.ª cimeira Cotec, o último destes encontros anuais com a participação de Marcelo Rebelo de Sousa.

“Neste último encontro em que contamos com a presença do Presidente Rebelo de Sousa, gostaria de lhe agradecer por todos estes anos de trabalho em conjunto, por estar sempre pronto a ajudar, pelo seu apoio constante, pela sua atitude positiva e pelas seus bons conselhos, que, tal como os do Presidente Mattarella, considero muito valiosos”, disse o monarca espanhol.

“Foi uma verdadeira honra partilhar, não só estes fóruns Cotec Europa, mas também muitos outros momentos ao longo destes anos”, acrescentou Felipe VI, que falou em português nesta parte final do seu discurso.

Antes, o Presidente de Itália dirigiu-se a Marcelo Rebelo de Sousa, no início da sua intervenção, prestando “homenagem à sua determinação em representar os valores da democracia e do diálogo entre países, e pelo seu incansável empenho no projeto comum de integração europeia”.

Os encontros Cotec Europa, que reúnem membros das associações empresariais Cotec de Espanha, Itália e Portugal, realizam-se anualmente, de forma rotativa, nestes três países e têm juntado nos últimos anos Marcelo Rebelo de Sousa, Felipe VI e Sergio Mattarella.

Este foi, em princípio, o último encontro com a participação de Marcelo Rebelo de Sousa, que está a menos de um ano do fim do seu segundo e último mandato.

A 18.ª cimeira Cotec Europa começou na terça-feira e termina hoje, coincidindo com o período de campanha oficial para as eleições legislativas antecipadas de domingo em Portugal.

Antes dos discursos dos três chefes de Estado, houve uma intervenção do ex-presidente do Banco Central Europeu (BCE) e antigo primeiro-ministro italiano Mario Draghi, sobre inovação e competitividade.

Na terça-feira, o chefe de Estado português presidiu à cerimônia de atribuição de doutoramentos honoris causa ao Rei de Espanha e ao Presidente de Itália pela Universidade de Coimbra.

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