Em posse, Montenegro defende que quem viabiliza programa deve permitir executivo até fim do mandato

“Políticas públicas devem salvaguardar o objetivo de fixarmos em Portugal o nosso talento”

 

Mundo Lusíada com Lusa

O primeiro-ministro de Portugal tomou posse neste dia 02, e defendeu que não rejeitar o programa do Governo no parlamento “significa permitir a sua execução até final do mandato” ou até haver uma moção de censura, desafiando o PS a dizer se será oposição ou bloqueio democrático.

“Não rejeitar o Programa do Governo no parlamento não significa apenas permitir o início da ação governativa. Significa permitir a sua execução até ao final do mandato ou, no limite, até à aprovação de uma moção de censura”, defendeu Luís Montenegro, no seu discurso no Palácio da Ajuda, em Lisboa.

Na sua intervenção, o primeiro-ministro afirmou que “o Governo está aqui para governar os quatro anos e meio da legislatura” e “não está aqui de turno” nem para “fazer apenas o mais fácil”.

“Não estamos interessados em jogos de semântica ou em politiquices estéreis. Se este Governo, como espero e sei que é o desejo dos portugueses, tiver a sua investidura parlamentar e assumir a plenitude dos seus poderes, vai começar desde já a programar e executar reformas estruturais que mudem o país”, considerou.

Por isso, defendeu: “A investidura parlamentar, nestas circunstâncias, só pode significar que as oposições vão respeitar o princípio de nos deixarem trabalhar e executar o Programa de Governo”.

“Não se trata de uma adesão a esse programa, mas antes de saber se há um bloqueio à sua execução (…) Não rejeitar o Programa do Governo com certeza que não significa um cheque em branco, mas também não pode significar um cheque sem cobertura”, disse.

Luís Montenegro dirigiu-se, em particular, ao PS, que governou 22 dos últimos 28 anos.

“Apesar da sua legitimidade em se constituir como fiscalizador da ação do Governo e em alternativa futura, que compreendemos com total respeito democrático, deve ser claro e autêntico quanto à atitude que vai tomar: ser oposição democrática ou ser bloqueio democrático”, considerou.

O primeiro-ministro assegurou que tal será dito aquando da discussão do Programa do Governo na Assembleia da República, prevista para os dias 11 e 12 de abril. “Mas por lisura de princípios e lealdade institucional, deve também ficar dito neste ato solene, porque encerra a responsabilidade que cada um está disposto a assumir”, afirmou.

A Constituição determina que um Governo só entra em plenitude de funções após a apreciação do seu programa pelo parlamento, se não for rejeitado.

A Assembleia da República vai debater o programa do XXIV Governo Constitucional a 11 e 12 de abril, documento que será entregue no dia 10, decidiu na semana passada a conferência de líderes.

O PCP anunciou a intenção de apresentar uma moção de rejeição ao programa do Governo, que dificilmente será aprovada, uma vez que o PS indicou que não viabilizará esta ou outra iniciativa para impedir o executivo de entrar em funções.

Montenegro assegurou ao Presidente da República que “contará da parte do Governo com uma inamovível conduta de colaboração positiva e de cooperação institucional” e defendeu que a política não pode agravar os problemas já existentes no contexto nacional e internacional.

“Depois de termos tido duas interrupções de legislatura em dois anos, numa altura em que temos perto de nós dois focos de guerra, em que temos o desafio de executar o mais volumoso plano de investimentos desde a adesão à União Europeia, em que enfrentamos um elevadíssimo nível de pobreza em praticamente metade da nossa população e numa altura onde o Estado não responde adequadamente aos cidadãos no acesso a bens essenciais como a saúde, a educação ou a habitação, será imperdoável que a política se constitua como agravante e não como solução para tantos problemas”, considerou.

Montenegro prometeu “humildade, espírito patriótico e capacidade de diálogo” da parte do Governo e disse que é também o que espera das oposições, citando a poetisa Sophia de Mello Breyner Andresen.

“A nossa democracia, que celebra neste mês de abril 50 anos, está viva. Honremos a ‘madrugada’ que Sofia esperava e saibamos construir o ‘dia inteiro e limpo’ que ela vislumbrou, para ‘livres habitarmos a substância do tempo’”, disse, apelando à “maturidade e grau de compromisso de todos” com a vontade dos portugueses “de mudança política”.

País rico

O primeiro-ministro avisou que Portugal não ficou rico “só porque tem superavit orçamental”, e considerou até que esta ideia “é perigosa, é errada e é mesmo irresponsável”.

No seu discurso, Luís Montenegro reiterou os compromissos de desagravamento fiscal e de projeção de mais crescimento econômico que tinha apresentado na campanha eleitoral.

“Vamos cumprir as nossas promessas de desagravamento fiscal, de valorização dos salários e das pensões, de reestruturação dos serviços públicos e modernização do Estado. Mas vamos fazê-lo não à sombra da ilusão de um excedente, mas antes com a âncora de uma economia mais produtiva e competitiva e um Estado renovado e eficiente”, disse.

“Temos a noção de que não ficámos um país rico só porque tivemos um superavit orçamental”, acrescentou.

Para o novo primeiro-ministro, esta visão coloca três problemas principais.

“Em primeiro lugar, essa ideia pode ser considerada uma ofensa para milhões de portugueses que vivem em dificuldades extremas por auferirem salários ou pensões baixas, por estarem afogados em impostos, por não conseguirem aceder condignamente a uma habitação, a cuidados de saúde ou mesmo a uma educação de qualidade”, disse.

Em segundo lugar, defendeu, “a teoria dos “cofres cheios” conduz à reivindicação desmedida e descontrolada de despesas insustentáveis”.

“Em terceiro lugar, a ideia de que estamos a viver em abundância induz o país a pensar que não há necessidade de mudar estruturalmente a nossa economia e o Estado, porque afinal parece que está tudo bem. Esta ideia é perigosa, é errada e é mesmo irresponsável”, disse.

Corrupção

O primeiro-ministro ainda comprometeu-se a apresentar até dia 02 de junho um programa de emergência na saúde e a anunciar um diálogo com todos os partidos com assento parlamentar para “uma agenda ambiciosa” de combate à corrupção.

Montenegro prometeu, na área da saúde, que o Governo irá “implementar uma reforma estrutural que fortaleça e preserve o SNS como a base do sistema, mas que aproveite a capacidade instalada nos setores social e privado, sem complexos ideológicos inúteis e com uma única preocupação: o cidadão”

“Tal como prometemos, elaboraremos um Programa de Emergência que virá a público antes do dia 02 de junho”, disse.

Já na área da corrupção, anunciou que irá propor a todos os partidos com assento parlamentar a abertura de um diálogo com vista a uma fixar uma agenda ambiciosa, eficaz e consensual de combate à corrupção.

“O objetivo é no prazo de dois meses ter uma síntese de propostas, medidas e iniciativas que seja possível acordar e consensualizar, depois de devidamente testada a sua consistência, credibilidade e exequibilidade”, disse, defendendo que “ninguém tem o monopólio das melhores soluções”.

A partir daí, acrescentou, o executivo irá focar-se na aprovação das respetivas leis, “seja por proposta do Governo, seja por iniciativa do parlamento”.

“A ministra da Justiça fará a interlocução do lado do Governo, tomando a iniciativa, logo a seguir à investidura parlamentar, de contactar os vários partidos e de iniciar este processo de diálogo. Esperamos a abertura e disponibilidade de todos, em nome de uma vontade forte de busca de consensos numa área crucial”, disse

O primeiro-ministro destacou que, nos cinquenta anos do 25 de Abril, “este esforço de consenso será uma boa forma de celebrar a democracia”.

Emigração

Sobre o papel central que quis dar à juventude, reiterou a sua preocupação com a emigração dos mais qualificados – tema central na sua campanha eleitoral -, e que classificou hoje como “um flagelo familiar, social e económico”.

“Não podemos mais assobiar para o ar e negligenciar esta realidade. Precisamos de atuar de forma conjugada e transversal para dizer aos nossos jovens que acreditem no seu país (…) Da fiscalidade à educação, da saúde à habitação, dos transportes ao ambiente, das leis laborais à cultura e ao desporto, todas as políticas públicas devem salvaguardar o objetivo de fixarmos em Portugal o nosso talento e a nossa capacidade de trabalho”, defendeu.

Luís Montenegro terminou a sua intervenção citando a frase do Papa Francisco na Jornada Mundial da Juventude de Lisboa – “todos, todos, todos” – para apelar à colaboração de todos os setores da sociedade, incluindo os partidos políticos, e evocou até o poeta Luis Vaz de Camões, assegurando que os 500 anos do seu nascimento merecerão ainda este ano “a devida celebração”.

“Escreveu no canto I d´ ‘Os Lusíadas’: ‘Que tenha longos tempos o Governo (…). A gente anda perdida e trabalhada. Já parece bem feito que lhe seja/ Mostrada a nova terra que deseja”, disse, apelando à união de “todos, todos, todos por Portugal”.

 

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