China: Segundo mandato de Hu Jintao marca triunfo da prudência

 

Rui Boavida Da Agência Lusa

"Hu Jintao é como um pato", comentava em brincadeira um professor universitário de Pequim numa recepção diplomática sobre o homem que o Partido Comunista chinês reelegeu nesta segunda-feira por mais cinco anos como líder supremo da China.

"Hu dá um passo para a esquerda e um passo para a direita. À distância parece que vacila, mas o fato é que vai equilibrado e para a frente", continuava o professor, numa piada que descreve na perfeição a carreira política do presidente da China: cautelosa, agradando a todas as tendências do partido, e sempre a avançar.

A cautela de Hu Jintao estende-se também à vida privada. São muito poucos os que conhecem Hu, de 64 anos, e ainda menos os que sabem em que é que acredita na realidade o homem reeleito pelo Partido Comunista chinês, presidente da terceira maior economia mundial e um dos mais poderosos políticos do mundo.

"Hu presta atenção ao que diz desde que era um adolescente", afirma Ma Ling, autora de uma biografia do líder chinês.

Nem o sotaque trai suas origens e ninguém sabe o local onde nasceu, em dezembro de 1942. Segundo a biografia oficial do PC chinês, a família é originária da província oriental de Anhui, enquanto outras fontes dizem que nasceu em Xangai e outras em uma cidade próxima, Taizhou.

O que se sabe é que, depois da morte do pai, quando tinha cinco anos, Hu foi criado por uma tia em Taizhou. As autoridades da cidade evitam qualquer contato entre os jornalistas e a senhora, que tem agora mais de 90 anos, e até retiraram da casa as fotografias em que Hu aparecia jovem.

Depois do curso de engenharia na Universidade Tsinghua, uma das de maior prestígio na China, Hu passou 14 anos da província de Gansu, uma das mais pobres do país, fazendo trabalhos menores na estrutura do partido, mas onde chamou a atenção do então líder chinês Deng Xiaoping.

De volta a Pequim, Deng eleva Hu à Presidência da Juventude Comunista, que continuar a ser até hoje sua principal base de apoio.

Na capital chinesa, o presidente chinês torna-se um dos discípulos do líder reformista Hu Yaobang e foi, aos 39 anos, o mais jovem membro da história do Comitê Central dos comunistas.

Com reputação de nunca recusar qualquer tarefa que os líderes do partido lhe atribuíam, em meados da década de 1980 Hu se tornou secretário-geral de outra província pobre, Guizhou. Daí passa para uma das posições mais "quentes" na China – a chefia do Partido Comunista no Tibet, onde começa a perder sua reputação de liberal.

Segundo recentes relatos na imprensa internacional, Hu nada fez contra a imposição da lei marcial no Tibet como forma de suprimir as manifestações anti-China de 1987, que levaram a prisão e tortura de centenas de monges tibetanos.

Em 1992, então com 49 anos e por escolha de Deng, Hu dá finalmente entrada no novo Comitê Permanente do Politburo, o grupo de nove pessoas que constitui o núcleo duro do poder político chinês.

Em 2002, Hu Jintao sobe a secretário-geral do partido e, por inerência, à Presidência da China, mas nem assim passa a ser menos reservado.

Sua mulher, Liu Yongqin, foge também da ribalta e mantém a discrição mesmo quando a filha, Hu Haiqing, se casou com Daniel Mao, um milionário das novas tecnologias. O outro filho do casal presidencial chinês também trabalha em uma empresa de novas tecnologias em Pequim.

Sem nunca ter dado qualquer entrevista desde 2002, se restringindo a responder poucas perguntas pré-selecionadas, Hu nunca disse quais eram as suas convicções políticas, limitando-se aos conceitos gerais de "sociedade harmoniosa" e de "desenvolvimento científico", cunhados pelo próprio e que revelam tanto quanto escondem.

Os dois conceitos visam equilibrar as desigualdades sociais causadas pelo crescimento econômico a todo o custo que a China registrou nos últimos 25 anos, melhorar os níveis de vida dos camponeses mais pobres, acabar com a degradação ambiental galopante e promover políticas mais igualitárias.

No entanto, Hu nunca articulou quais as políticas – nem com quem ou contra quem – se realizará a visão de "desenvolvimento científico", que ganhou honras, inclusive, de entrar na Constituição como ideologia oficial do partido.

Este pode, no entanto, ser o primeiro dia do resto da carreira política de Hu, que conseguiu finalmente consolidar o poder dentro do Partido Comunista, tal como fica claro com os nomes que o presidente apresentou para o novo Comitê Permanente do Politburo.

O novo órgão apresenta, sobretudo, aliados de Hu que, com o partido na mão, pode agora começar a mostrar e a aplicar as políticas em que de fato acredita e, sobretudo, a tentar escolher um aliado para sucedê-lo à frente do partido e do país.

A aposta de Hu, ao que se sabe, seria Li Keqiang, 52 anos, secretário-geral do PC chinês da província industrial de Liaoning, no nordeste do país, que fez a sua carreira política na Juventude Comunista, base de poder de Hu Jintao.

"Hu tem o direito de nomear o sucessor, mas tem de convencer os seus pares a aceitar esse nome", de acordo com o analista Kou Chien-wen, que afirma faltar a Hu "a legitimidade revolucionária de Deng Xiaoping para poder nomear um sucessor sozinho".

Li Keqiang entrou nesta segunda-feira no novo Comitê Permanente, mas tem em Xi Jinping, 54 anos, secretário-geral em Xangai desde de março de 2007, o mais forte concorrente à frente da "quinta geração de líderes".

Xi, que coroou com a entrada no Comitê Permanente uma carreira política meteórica, é um dos "príncipes vermelhos", filho de Xi Zhongxun, um dos fundadores da guerrilha comunista e aliado de Deng Xiaoping.

O político de Xangai é visto como a melhor solução de compromisso entre todas as facções do partido para suceder Hu Jintao em 2012, enquanto Li Keqiang poderá ter de se contentar com o cargo de primeiro-ministro.

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