Da Redação com Lusa
O primeiro-ministro são-tomense afirmou neste dia 10 que o seu executivo não precisa de Portugal para se relacionar com a Europa e avisou que as autoridades portuguesas só conhecerão o acordo militar com a Rússia se for publicado.
Patrice Trovoada reagia às declarações do Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, que, na quinta-feira, afirmou desconhecer o acordo de cooperação militar assinado entre São Tomé e Príncipe e a Federação Russa, mas que vai querer conhecer o documento.
“Honestamente, ele quer conhecer como? Ele quer me pedir o acordo? Eu também tenho muita curiosidade em conhecer muitas coisas, mas sejamos claros: aqui há o respeito da soberania e há o respeito das regras diplomáticas, por conseguinte há coisas que não fazem sentido”, reagiu Patrice Trovoada.
“Se o acordo passar a ser publicado, ele [o Presidente português] tomará conhecimento como toda a gente, por conseguinte não estamos nessa fase e de momento é preciso que, de fato, as pessoas se acalmem”, acrescentou o primeiro-ministro são-tomense.
Patrice Trovoada reagiu também às declarações do ministro dos Negócios Estrangeiros (MNE) português, Paulo Rangel, que afirmou, na quinta-feira, que Portugal e “outros Estados europeus manifestaram estranheza, apreensão e perplexidade perante este acordo”.
“Isto é o problema do ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal. Nós temos relações bilaterais com muitos países e nós não precisamos de Portugal para nos relacionar com outros países, sejamos claro, se um país europeu quer manifestar preocupação, fala comigo, e não fizeram isso”, disse o primeiro-ministro são-tomense.
Trovoada sublinhou que São Tomé e Príncipe é soberano e relaciona-se “com toda a gente”.
“Eu dou muito bem com muitos países europeus, eu não preciso de passar por Portugal para falar com a Europa, se a Europa também precisa falar comigo não precisa passar por Portugal”, vincou.
Patrice Trovoada disse que o MNE são-tomense manifestou ao seu homólogo português “a necessidade de não estarem preocupados mais além com isso” e sublinhou que não pede para ver quando Portugal assina acordos com terceiros.
O chefe do Governo são-tomense enfatizou ainda que muitos países, incluindo os europeus, continuam a manter relações com a Rússia, apesar da guerra com a Ucrânia.
“Quando houve os atentados terroristas ultimamente na Rússia, os Estados Unidos propôs até o apoio à Rússia. Eu quero também lembrar que muitos países europeus, embora a situação de conflito com a Ucrânia, continuam a importar gás, petróleo e urânio da Rússia, o que em princípio deve servir para melhorar a situação financeira da Rússia, que, por sinal, deve servir também à Rússia a continuara a guerra com a Ucrânia”, declarou.
“Então, nós somos um país livre, independente, soberano, somos adultos e eu penso que do lado do Governo português não há nenhum problema”, acrescentou.
Patrice Trovoada disse que, do lado são-tomense, “as coisas estão claras, estão tranquilas” e o acordo com a Rússia “está em vigor” e vai ser efetivado.
“Não se vai fazer um bicho-de-sete-cabeças para uma coisa simples e não contem com São Tomé e Príncipe para o fazer. Nós somos um Estado livre e independente, nós cooperamos com os nossos amigos, nós não somos ingratos com os nossos amigos e, dentro dessa cooperação, dentro do cenário internacional, dentro das opções que nós fizemos, há uns com o qual andamos 10 metros, uns 100 metros, há uns com o qual não andamos, em função dos nossos interesses, e os outros fazem a mesma coisa em função do seus interesses”, disse Patrice Trovoada.
Segundo a agência de notícias oficial russa Sputnik, o acordo militar “por tempo indeterminado” foi assinado em São Petersburgo em 24 de abril e começou a ser implementado em 05 de maio, prevendo formação, utilização de armas e equipamentos militar e visitas de aviões, navios de guerra e embarcações russas ao arquipélago.
Rússia
Patrice Trovoada afirmou que, relativamente à guerra da Rússia com a Ucrânia, São Tomé e Príncipe “foi bastante claro” quanto ao seu posicionamento e lembrou que, numa das Assembleias das Nações Unidas, ele próprio deu “procuração a Portugal para votar em nome de São Tomé e Príncipe contra a Rússia”.
“Entre Portugal e São Tomé e Príncipe as coisas vão bem e, como se diz, no amor não é só dizer eu te amo, mas nós já demos provas suficientes de amor”, referiu o chefe do Governo são-tomense.
Na quarta-feira, o presidente do Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe/Partido Social Democrata (MLSTP/PSD), líder da oposição são-tomense, criticou “o secretismo” com que o Governo assinou o acordo militar com a Rússia, vaticinando consequências na relação com a União Europeia e os Estados Unidos.
“Trata-se de um acordo que em momento nenhum ouvimos qualquer comunicado do Conselho de Ministros a fazer alusão. Um acordo desta envergadura, numa área bastante sensível e atendendo ao contexto mundial neste momento, penso que exige interação entre os vários órgãos de soberania, portanto Governo, Presidência da República e conhecimento da Assembleia Nacional, para a aprovação e a sua ratificação pelo Presidente da República”, defendeu o líder da oposição são-tomense, Jorge Bom Jesus.