Estudantes PALOP no ensino superior português são quase 20 mil

Da Redação com Lusa

Cerca de 20 mil estudantes dos países africanos de língua portuguesa estavam inscritos no ensino superior português no ano letivo 2021/22, um aumento de 170% em cinco anos, para o que contribuíram sobretudo os alunos guineenses.

Segundo dados do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES), o número total de estudantes dos países africanos de língua oficial portuguesa (PALOP) inscritos em Portugal era no ano letivo passado de 19.930, quando em 2016/17 era de apenas 7.355.

O país que mais contribuiu para este aumento foi a Guiné-Bissau, cujos estudantes aumentaram dez vezes em apenas cinco anos, tornando-se o segundo país mais representado entre todos os alunos estrangeiros nas universidades e politécnicos portugueses, apenas ultrapassado pelo Brasil.

Há cinco anos os alunos guineenses eram os menos representados, com 602 inscritos, mas são hoje o contingente mais volumoso entre os cinco PALOP (a Guiné Equatorial não é discriminada nos números do MCTES), com 6.470, acima dos cabo-verdianos (5.630), dos angolanos (4.690), dos moçambicanos (2.045) e dos são-tomenses (1.095).

No ano letivo passado, os guineenses eram já 32% dos alunos dos PALOP nas instituições de ensino superior portuguesas.

Dificuldades

O número de estudantes dos países africanos de língua portuguesa no ensino superior em Portugal quase triplicou em cinco anos, mas muitos enfrentam dificuldades e há elevados níveis de abandono, alerta um docente da Universidade Nova de Lisboa.

Miguel Chaves, coordenador do departamento de Sociologia da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, está a fazer um levantamento sobre o universo de estudantes dos países africanos de língua oficial portuguesa (PALOP) matriculados no Ensino Superior Português e sobre o seu acolhimento nesse sistema.

Em entrevista à Lusa, o acadêmico contou que em 2017/18 os docentes começaram a sentir um aumento do número de estudantes dos PALOP que chegavam ao ensino superior e a constatar que muitos desses estudantes apresentavam dificuldades em comunicar em português.

Os docentes aperceberam-se de que o aumento do número de estudantes africanos refletia um crescimento substancial do número de guineenses, o que explica as dificuldades na língua portuguesa, uma vez que os guineenses, de uma maneira geral, utilizam muito pouco o português para comunicar, dominando normalmente duas línguas, o crioulo e uma das línguas nativas.

Exemplificou com as dificuldades burocráticas para a obtenção de visto, que atrasam a chegada dos alunos durante meses ou até um ano letivo inteiro.

Isto acarreta dificuldades acadêmicas, mas também financeiras, porque após a matrícula começam a ser cobradas as propinas, pelo que os alunos “já chegam com uma dívida muito considerável aos estabelecimentos”.

Outro problema, alertou, é que muitos alunos não recebem bolsas de estudo, vêm pelos seus próprios meios, pelo que muitas vezes têm de começar a trabalhar, normalmente em atividades sem horário fixo e que não lhes permitem exercerem os direitos de trabalhador-estudante.

“Face a uma situação em que já têm tantos ‘handicaps’, em termos linguísticos e de falta de apoios financeiros, têm ainda de começar a trabalhar e começar a trabalhar intensamente”, disse Chaves.

Complicações no acesso aos serviços públicos, nomeadamente ao Serviço Nacional de Saúde, e dificuldades de adaptação cultural – estudos indicam que os alunos africanos consideram os portugueses frios e distantes – juntam-se ainda a preconceitos racistas que existem na sociedade portuguesa e que também se refletem na academia.

“Experiências de uma certa discriminação, de uma certa exclusão acontecem, por exemplo, quando há formação de grupos de trabalho” e os alunos portugueses tendem a não aceitar os africanos, porque entendem que estes não dão o devido contributo para os trabalho de grupo, exemplificou o docente, considerando tratar-se de “discriminação e uma forma de indiferença”.

Todos estes problemas têm um efeito que é “absolutamente dramático”: “A reprovação nas unidades curriculares nas disciplinas que estão a frequentar é maciça e, portanto, a possibilidade de transição de ano por maioria de razão, também é muito baixa”, lamentou.

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