Caso das gêmeas: Ex-governantes chamados ao Parlamento para esclarecimentos

Mundo Lusíada com Lusa

Depois do Partido Socialista derrubar a audição parlamentar dos ex-governantes Marta Temido e Lacerda Sales sobre o caso das gêmeas luso-brasileiras tratadas no Hospital de Santa Maria, o partido Iniciativa Liberal usou o seu direito de chamá-los ao Parlamento.

O requerimento da Iniciativa Liberal (IL), rejeitado pela maioria socialista na Comissão de Saúde da Assembleia da República, propunha a audição urgente da ex-ministra da Saúde Marta Temido, do ex-secretário de Estado da Saúde António Lacerda Sales, do ex-presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte EPE Daniel Ferro e da atual presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte EPE, Ana Paula Martins.

Perante a rejeição, o partido de Rui Rocha decidiu usar o direito potestativo de chamar as mesmas pessoas para serem ouvidas sobre o polêmico caso das gêmeas luso-brasileiras que foram a Portugal em 2019 receber o medicamento Zolgensma, – um dos mais caros do mundo – para a atrofia muscular espinhal, que totalizou quatro milhões de euros.

“Nós temos de esclarecer se houve aqui algum tipo de favorecimento ou não e, se tiver havido favorecimento, temos de saber quem é que promoveu esse favorecimento”, afirmou o presidente da IL à margem da comissão de Saúde, quinta-feira.

“É fundamental repor a dignidade nas instituições, devolver a confiança aos portugueses de que as instituições funcionam, ou quando não funcionam por algum motivo, cá estamos para promover que a verdade seja conhecida”, defendeu.

Além de usar o direito potestativo para chamar as mesmas pessoas a serem ouvidas na Assembleia da República, e “antecipando alguma manobra e algum expediente que possa haver na comissão para paralisar mais uma vez esta questão”, a IL vai enviar um conjunto de questões ao ministro da Saúde, Manuel Pizarro.

Ministros

Neste dia 08, o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, recusou-se a pronunciar-se sobre o caso das gêmeas luso-brasileiras, alegando que os seus comentários podem ser interpretados como forma de condicionar a investigação.

Questionado sobre se já foi ouvido pela Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS), se foi pedida documentação à tutela e sobre os desenvolvimentos conhecidos da situação, Manuel Pizarro afirmou ser um caso sobre o qual não deve fazer comentários públicos.

Na quarta-feira, no Porto, o ministro considerou que seria inaceitável que uma decisão clínica fosse ultrapassada por uma pressão política. “A decisão clínica tem de prevalecer num serviço de saúde e tem absoluta prioridade sobre todos os pontos de vista”, defendeu.

Sobre a investigação em curso, Manuel Pizarro afirmou que a obrigação do seu ministério “é contribuir com toda a documentação que possa ser encontrada no Ministério da Saúde”, sublinhando que está ao dispor das entidades para prestar todos os esclarecimentos que permitam averiguar o que se passou neste processo.

Também o bastonário da Ordem dos Médicos (OM), Carlos Cortes, disse que vai hoje pedir ao ministro da Saúde para insistir que seja facultada a informação, no seu domínio de intervenção, sobre o caso. Carlos Cortes lembrou que essa documentação foi solicitada duas vezes ao Hospital de Santa Maria (HSM) e o pedido vai hoje ser reforçado.

Segundo o bastonário, no processo das gêmeas luso-brasileiras há “princípios de equidade e de igualdade que podem não ter sido respeitados” e sublinhou que os médicos não podem esquecer o seu código deontológico, independentemente das funções que estejam a exercer.

Já o antigo secretário de Estado da Saúde António Lacerda Sales afirmou quinta-feira que aguarda por documentação para se poder “tentar relembrar” do caso das gêmeas, dizendo que apenas responderá “em sede própria”, perante a justiça e a inspeção de saúde.

“Eu quando digo que não me lembro, é que genuinamente não me lembro mesmo, eu preciso de factos e preciso de documentos para poder ter acesso e para me poder tentar relembrar”, afirmou, salientando que passaram quatro anos, com “uma pandemia pelo meio”.

A Família

O advogado da família das gêmeas luso-brasileiras recusou a existência de qualquer ‘cunha’ e salientou que o acesso das crianças ao tratamento até foi dos casos mais demorados. “É importante que levantem todo o tempo das mais de 30 crianças já medicadas com esse medicamento em Portugal… As minhas clientes foram as que tiveram maior tempo de espera, exatamente pela complexidade do caso e de serem crianças que vinham de fora. Quando se fala em cunha imagina que tem de ser uma vantagem e não houve nada nesse sentido, pelo contrário. Tivemos um tempo de espera maior do que o normal”, disse Wilson Bicalho.

Segundo ele, a família não conhece o filho do presidente. “Em momento algum [falaram com Nuno Rebelo de Sousa]. [A família] nem sequer conhece o filho do senhor Presidente da República”, frisou.

“Sobre a questão do filho do presidente de Portugal, não podemos falar absolutamente nada, porque não temos a menor noção. Não posso falar no nome dele, não nos foi apresentado, não o conheço pessoalmente e não sei o que pode ou não ter passado. O que posso adiantar é que o caso dessas miúdas foi um caso de comoção nacional no Brasil, seguido por mais de 50 mil pessoas simultaneamente. Não me causa espécie que isso seja um assunto falado de boca em boca entre pessoas e possa chegar ao conhecimento de alguém”.

Apesar de indicar que a mãe das crianças luso-brasileiras está disponível para prestar declarações, Wilson Bicalho vincou, contudo, que a família “está sem condições psicológicas” para viajar neste momento para Portugal.

O caso
O caso das gêmeas foi revelado numa reportagem da TVI, transmitida no início de novembro, segundo a qual duas crianças luso-brasileiras foram a Portugal em 2020 receber o medicamento Zolgensma, no valor de quatro milhões de euros, havendo suspeitas de que tal tivesse acontecido por influência do Presidente português, que negou qualquer interferência no caso.

Na segunda-feira, numa declaração aos jornalistas no Palácio de Belém, Marcelo Rebelo de Sousa confirmou que o seu filho Nuno Rebelo de Sousa o contactou sobre este caso em 2019.

O chefe de Estado defendeu que o tratamento dado ao caso das gêmeas foi neutral e igual a tantos outros e disse que a correspondência na Presidência da República sobre o mesmo foi remetida para a Procuradoria-Geral da República (PGR).

Além da PGR e da IGAS, o caso está a ser também objeto de uma auditoria interna no Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte, do qual faz parte o Hospital de Santa Maria.

A TVI noticiou no dia 07 que Nuno Rebelo de Sousa se reuniu com o então secretário de Estado da Saúde, António Lacerda Sales, no Ministério da Saúde, sobre este caso.

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