Brasileiro conquista cidadania portuguesa de forma inédita por questões humanitárias após processo que ganhou agilidade

Jurisprudência da decisão do Tribunal português poderá beneficiar outros casos, defende especialista.

Da Redação

Em decisão inédita, o cearense Renato Stenio Torres, de 74 anos, conseguiu obter a cidadania portuguesa em processo judicial movido por um escritório sediado em Lisboa, especializado em cidadania para brasileiros descendentes de judeus sefarditas. Renato Stenio possui idade avançada e ainda luta contra um câncer, o que exigiu celeridade do governo português no processo, garantindo a partir de agora seus direitos.

O país já atribuiu a cidadania a 57 mil descendentes de judeus sefarditas entre 2015 e 2021 e milhares de brasileiros já se beneficiaram da lei, criada como forma de reparação histórica. O caso do brasileiro, que atualmente vive em Fortaleza, foi considerado como exceção e ganhou agilidade em meio aos milhares de pedidos de nacionalidade por sua idade e saúde fragilizada.

Os brasileiros são a principal comunidade estrangeira residente em Portugal, num total de 233.138 pessoas em 2022, 28.444 mais do que em 2021 (13%), segundo o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras de Portugal (SEF).

Os brasileiros sefarditas como Torres são descendentes de judeus da região da Península Ibérica que fugiram das guerras na Europa para o Brasil. Entretanto, estima-se um total de mais de 90 mil pedidos de análise de nacionalidade para descendentes de judeus sefarditas em Portugal.

Ineditismo

O ineditismo do processo se deu devido à estrutura jurídica portuguesa, bastante diferente da brasileira. A Justiça é o órgão superior do governo, porém a cidadania é concedida por outro órgão administrativo, também pertencente ao governo – a chamada Conservatória dos Registros Centrais. A Justiça determinou e exigiu celeridade no caso.

Segundo o brasileiro Thiago Huver, mestre em direito internacional privado pela Universidade de Lisboa e sócio do escritório Martins Castro, o processo foi iniciado há dois anos e foram feitos pedidos de urgência, porém negados pela conservatória. O escritório entrou com uma ação judicial perante o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa e obteve o reconhecimento.

Uma vez vencida a ação em tribunal, a conservatória analisou o processo com urgência e concedeu a nacionalidade em apenas seis meses após a decisão judicial.

“Esta vitória garante a jurisprudência no tema e beneficiará muitos clientes, não havendo necessidade de novas judicializações a partir de agora”. Isso significa que o que foi decidido deverá ser respeitado pelas conservatórias portuguesas. “Mais que uma decisão judicial, trata-se de uma decisão humanitária que deverá garantir direitos a muitos descendentes de portugueses no Brasil”, explica Thiago.

Resgate da história familiar – Para Renato Stênio, receber a cidadania portuguesa é um resgate de sua história. “Há um pedacinho de mim em Portugal. Estou muito feliz com a conquista e assim que concluir meu tratamento e estiver melhor de saúde quero conhecer minhas origens portuguesas”, contou.

A nacionalidade portuguesa é considerada atualmente tão valiosa quanto uma grande herança para os descendentes. Ter uma cidadania europeia abre portas em universidades europeias e cria vantagens para a educação, empreendedorismo e até financiamento na Europa. Os filhos e netos de Torres já planejam entrar com o processo, já que muitas oportunidades podem ser criadas após essa conquista.

Atualmente estima-se que 14% das aplicações que são concedidas pela justiça portuguesa para obtenção da nacionalidade são para pessoas de origem sefarditas. A maior dificuldade em obter a nacionalidade é a falta de documentação, de acordo com o escritório, que presta serviços jurídicos para pessoas e empresas que queiram se instalar na Europa.

“Essa ação judicial garante direitos. No caso do Renato, ter uma idade avançada e ter uma doença crónica, fez com que o tribunal reconhecesse que, em caso de concessão da nacionalidade, ele poderia ter acesso a melhores condições de tratamento como português, tendo acesso ao sistema de saúde de Portugal”, complementa o advogado.

Segundo ele, após o deferimento da ação judicial, o processo de nacionalidade na conservatória aconteceu em tempo recorde. Em seis meses o processo foi analisado. Em média, um processo de nacionalidade para os descendentes de judeus sefarditas leva três anos, o que seria prejudicial ao Renato, em decorrência das suas condições.

“A decisão em tribunal beneficiará outros clientes que se encontram em mesma situação de idade avançada ou com alguma enfermidade, já que a jurisprudência poderá ser utilizada diretamente nas conservatórias como forma de justificar pedidos de urgência na tramitação de processos de nacionalidade com circunstâncias semelhantes”, explica.

A História dos brasileiros sefarditas – Os judeus sefarditas foram expulsos de Portugal a partir do século XV pelos reis católicos, que impunham o cristianismo. O governo português lançou uma política de reparação, que deve acabar em 31 de dezembro de 2023. Em 2015, um decreto divulgou a lista de alguns dos sobrenomes comuns dos descendentes de judeus sefarditas e dos chamados cristãos-novos que têm direito à cidadania portuguesa (fugidos das guerras para o Brasil). A relação inclui alguns dos nomes mais populares entre as famílias brasileiras.

São eles: Almeida, Azevedo, Barros, Bastos, Caetano, Campos, Cardoso, Carneiro, Carvajal, Carvalho, Dias, Dourado, Duarte, Elias, Estrela, Ferreira, Fonseca, Franco, Furtado, Gonçalves, Gouveia, Lobo, Machado, Martins, Madureira, Moreno, Mota, Nascimento, Pereira, Pessoa, Pinheiro, Pinto, Pimentel, Santos, Silva, Torres e tantos outros.

Quer dizer “habitante de Sefarad” (Sefarad era a palavra hebraica usada para denominar o território da península ibérica). Após a expulsão, eles foram exilados em diversos territórios do Mediterrâneo, no norte da Europa e na América. Calcula-se que 200 mil pessoas foram expulsas e aqueles que decidiram permanecer na península foram obrigados a converter-se ao cristianismo.

Durante a II Guerra Mundial, o Brasil recebeu também imigrantes judeus Sefarditas sob a égide de refugiados de guerra, o que só foi possível graças aos judeus já estabelecidos aqui. Hoje, a comunidade judaica brasileira é diversa, composta por diversas frentes de pensamento e diversas linhagens.

1 Comment

  1. A sorte do gajo é que não precisa do SNS para tratar-se.

    Brevemente, após recortar 10 selos de jornal, trocar-se-á a cartela por uma nacionalidade portuguesa.
    Para já não demora tornar-se uma demanda não atribuir, mas recusar a nacionalidade portuguesa, a julgar pela ‘meretrização’ da mesma que está a ser promovida pela dobradinha abrileira PS/PSD. Após o género fluido, os ‘lusomasoquistas’ inventaram a nacionalidade fluida.

    As armas e os brasões assassinados.

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