Mais de 1,2 milhões de pessoas já sentiram discriminação em Portugal

Arraial multicultural antirracista e contra a islamofobia, no Largo do Intendente, em Lisboa, 3 de fevereiro de 2024. O arraial multicultural é organizado por vários coletivos e associações antirracistas, entre elas a SOS Racismo, contra o racismo, a xenofobia e a islamofobia e segundo a organização, o encontro pretende "celebrar a diversidade e a pluralidade". MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

Mais de 1,2 milhões de pessoas já sofreram discriminação em Portugal, recordou hoje o Instituto Nacional de Estatística (INE), citando dados de 2023.

A cor da pele, o território de origem ou o grupo étnico foram os fatores que estiveram na base da discriminação sentida por quase meio milhão de pessoas, de acordo com os dados com os quais o INE assinala o Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, 21 de março.

Em 2023, a percentagem de pessoas entre os 18 e os 74 anos que sofreu discriminação no país foi de 16,1% (mais de 1,2 milhões).

Destas, 60,6% identificou fatores como a idade, sexo, escolaridade ou a situação econômica e dois quintos (40,1%) referiu a cor da pele, território de origem ou grupo étnico.

Caso de Polícia

As queixas por discriminação, racismo e xenofobia feitas à Guarda Nacional Republicana e à Polícia de Segurança Pública aumentaram desde 2021, tendo estas duas forças de segurança recebido quase 1000 denúncias em quatro anos.

Segundo dados enviados à agência Lusa, a GNR recebeu, entre 2021 e 2024, 392 queixas relacionadas com discriminação, incitamento ao ódio e à violência e contra a identidade cultural e integridade pessoal, tendo já registado desde o início deste ano 32 denúncias.

Em 2021, esta força de segurança recebeu 47 denúncias, que subiram para 69 no ano seguinte e voltaram a aumentar em 2023 para 116 queixas. Em 2024, a GNR contabilizou 160 queixas.

Os dados enviados à Lusa pela PSP, que se referem ao período entre 2021 e 2023, indicam que esta polícia recebeu em três anos 575 queixas relacionadas com racismo, discriminação, xenofobia e incitamento ao ódio e à violência.

A PSP registrou 119 denúncias em 2021, que subiram para 213 no ano seguinte e em 2023 voltaram a aumentar para 243.

Em declarações à Lusa, a psicóloga e fundadora da plataforma “Afropsis Saúde Mental”, Miriam Santos, disse que as vítimas de racismo em Portugal têm tendência a não apresentar queixa, uma vez que assumem que o agressor não vai ser punido.

“As pessoas têm plena consciência de que não vai haver consequências de maior dimensão para o agressor”, referiu Miriam Santos, sublinhando que os agredidos têm medo de sofrer represálias como perder o emprego.

A especialista apontou que a maioria das situações de racismo em Portugal é feita de forma indireta, considerando que estes casos são os mais violentos, e muitas vezes são difíceis de provar e acabam por criar dúvidas sobre se a pessoa foi verdadeiramente vítima de racismo.

Nestes casos, a vítima fica sem a possibilidade de se defender, referiu Miriam Santos, indicando que “é uma ocorrência diária e constante na vida das pessoas” que sofrem racismo.

Segundo a psicóloga, as crianças afro-descendentes queixam-se de discriminação racial por parte de alguns professores e sentem que as suas capacidades intelectuais são desvalorizadas.

A origem étnica, a classe social mais desfavorecida e o sotaque são elementos comuns nos casos discriminatórios, acrescentou Miriam Santos.

Nas consultas que realiza no seu gabinete, a especialista costuma ouvir dos pacientes relatos de situações em que os professores desconfiam da inteligência das crianças que pertencem a minorias étnicas.

“Na escola, os professores pensam que o aluno teve ajuda de terceiros porque para os profissionais nunca seria possível a criança ter aquelas capacidades intelectuais”, indicou, dando também como exemplo casos de pacientes adultos negros que se queixam de serem discriminados no trabalho na forma como são avaliados.

A especialista disse ainda que “o trabalho que fazem é avaliado com muito mais rigor em comparação com o realizado por funcionários brancos” e que os erros são vistos como uma prova da sua incapacidade e não como um acontecimento pontual.

PLataforma

A  Segregation Wiki, plataforma onde são analisados os diferentes tipos de segregação, é lançada hoje, com dados sobre as formas mais crescentes, indicou o autor que é investigador da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP).

Lançada no Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, a Segregation Wiki é um ‘site’ aberto, que pode ser editado por qualquer pessoa interessada em contribuir sobre o tema da segregação, sendo moderado pelos administradores da plataforma.

O objetivo deste trabalho passa por “concentrar num único sítio centenas de informações sobre formas de segregação que investigadores no mundo todo têm produzido por mais de 100 anos, e oferecer ao público definições sobre este tema”, lê-se na informação partilhada pela FEUP.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Veja também

Os discursos dos partidos na solenidade do 25 de Abril

Na sessão solene comemorativa no parlamento do 51.º aniversário do 25 de Abril de 1974 e do 50.º aniversário da eleição da Assembleia Constituinte, o presidente da República e presidente do Parlamento fizeram seus discursos, seguidos dos líderes partidários. As

Leia mais »