Habitação: Portugal espera ter até 1.000 casas para subarrendar até 2026

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Mundo Lusíada com Lusa

O arrendamento forçado de casas devolutas é a medida mais contestada do programa Mais Habitação, que na sexta-feira começa a ser debatido no parlamento, mas, apesar das críticas, o Governo português manteve a proposta original.

O aluguel de casas a privados para depois as subalugar é uma das soluções do programa para reforçar a oferta, com o Governo português a estimar conseguir angariar cerca de 1.000 casas por esta via até 2026.

O objetivo da medida é subarrendar estas casas a jovens, famílias monoparentais e com quebra de rendimentos, estando prevista uma renda até uma taxa de esforço máxima de 35% para o inquilino.

A renda entre o Estado e o senhorio privado será estabelecida livremente, desde que o valor não seja 30% superior aos limites gerais do preço de renda aplicáveis no Programa de Apoio ao Arrendamento Acessível (PAA).

Sendo convencionado um preço de renda superior aos limites do PAA (e até aos 30% referido), o proprietário não terá benefícios fiscais.

Os contratos de arrendamento terão a duração mínima de cinco anos, renováveis por igual período se nenhuma das partes se opuser.

Entre as medidas do Mais Habitação inclui-se ainda o reforço dos benefícios fiscais para os senhorios que, por sua iniciativa, canalizem casas para o programa de arrendamento acessível – que impõem tetos máximos de renda em função da tipologia do imóvel e da sua localização.

Em causa está, por exemplo, para uma taxa de IVA de 6% nas obras de construção ou reabilitação de casas que sejam maioritariamente afetas a este programa (pelo menos 70%), bem como isenção de IMI por três anos (prorrogável por mais cinco) e isenção de IMT na aquisição para reabilitação.

Os últimos dados indicam que em 31 de dezembro de 2022 estavam no PAA cerca de 1.000 contratos de arrendamento. Recorde-se que as regras legais já em vigor preveem isenção de IRS para os rendimentos de rendas para este tipo de contratos.

Este novo pacote do executivo para combater a crise na habitação esteve em consulta pública e recebeu “mais de 2.700 contributos” com sugestões e pedidos de alteração.

A versão final, aprovada em Conselho de Ministros no dia 30 de março, mantém a proposta inicial sobre o arrendamento forçado de casas devolutas, que gerou contestação de proprietários e vários partidos da oposição.

De acordo com a proposta, o Estado passa a poder, por motivos de interesse público, arrendar casas devolutas, pagando para tal uma renda ao proprietário.

A medida aplica-se a frações autónomas e partes de prédios urbanos que estejam devolutas há mais de dois anos, prazo findo o qual caberá ao “município territorialmente competente” notificar o respectivo proprietário, que terá 90 dias para “dar uso” à casa e promover as obras necessárias ou apresentar uma proposta de arrendamento ao Estado.

No parecer às medidas do Governo, a Associação Nacional de Municípios Portugueses identifica o arrendamento forçado como uma das medidas que mais preocupam o poder local, desde logo porque os municípios que não cumpram a disposição serão penalizados com a suspensão das taxas agravadas de IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis) sobre os imóveis devolutos.

As principais autarquias do país, nomeadamente Lisboa e Porto, já disseram que não adotarão a medida.

“É uma situação que vai criar mais problemas do que soluções e nós precisamos de soluções, não precisamos de problemas”, disse, numa entrevista recente à Lusa, a vereadora da Câmara de Lisboa com os pelouros da Habitação e do Desenvolvimento Local, Filipa Roseta, levantando dúvidas quanto à operacionalização da medida.

Para a autarquia da capital, “está fora de questão” adotar o arrendamento forçado. “Temos de ser pragmáticos e não interessa muito pôr as pessoas umas contra as outras”, disse.

Também a Câmara Municipal do Porto, num documento sobre o programa Mais Habitação, que considera “confuso” e “inexequível”, sublinhou que “o Estado deve procurar colocar casas no mercado habitacional não pela usurpação do uso de propriedade privada, mas sim com medidas de natureza fiscal”.

Segundo a proposta do Governo, não são consideradas devolutas para este efeito as casas de férias e as dos emigrantes, bem como as que estão vagas porque o respectivo dono se encontra num lar ou a prestar cuidados permanentes como cuidador informal e as das pessoas deslocadas por razões profissionais, de saúde ou formativas.

A lei já prevê que as empresas de água, luz, gás e telecomunicações enviem às autarquias uma lista com informação sobre consumos, sendo que a proposta do Governo acrescenta à lista a identificação matricial de cada prédio.

Paralelamente ao arrendamento forçado, o Governo vai criar uma linha de financiamento de 150 milhões de euros para os municípios poderem realizar obras coercivas.

As propostas de lei do Governo, que incluem outras medidas, como a suspensão de novas licenças de alojamento local ou o fim dos vistos ‘gold’, vão ser agora debatidas na generalidade em plenário da Assembleia da República, onde o PS tem maioria absoluta.

O pacote de medidas tem um custo estimado de 900 milhões de euros e propõe responder à crise da habitação com cinco eixos: aumentar a oferta de imóveis utilizados para fins de habitação, simplificar os processos de licenciamento, aumentar o número de casas no mercado de arrendamento, combater a especulação e proteger as famílias.

Oposição

As propostas de lei do Governo para combater a crise na habitação vão ser debatidas na generalidade no plenário de sexta-feira. Em vigor já estão os diplomas referentes ao apoio à renda e à bonificação dos juros no crédito à habitação, que o Governo pôde adotar sem discussão parlamentar prévia.

Na Assembleia da República, serão discutidas com os diplomas do Governo propostas de quase toda a oposição, com exceção de IL e PAN.

O BE lidera em número, com cinco projetos de lei, enquanto Chega e PCP assinam dois projetos de lei cada e o deputado único do Livre um.

O PSD, maior partido da oposição, apresenta um projeto de deliberação e um projeto de resolução (sem força de lei), mas já antes tinha levado ao parlamento um conjunto de dez diplomas (depois condensados em cinco), que foram viabilizados pelo PS, seguindo para discussão na especialidade.

O PSD leva a debate na sexta-feira uma proposta de estudo para avaliar os “efeitos das alterações ao regime do arrendamento urbano nos últimos dez anos” e uma recomendação ao Governo para que adote “um regime especial” de vistos ‘gold’ para as regiões autónomas.

Nos pareceres às novas medidas, o Governo Regional da Madeira pede também a não aplicação da contribuição extraordinária sobre o alojamento local, enquanto o Governo Regional dos Açores anuncia ser “desfavorável” ao pagamento pelo Estado, nos casos de despejo, das rendas vencidas após o fim do prazo de oposição.

Voltando aos projetos de lei da oposição, o Chega propõe uma comissão de mediação para a renegociação de contratos, com entidades “representativas dos diferentes interesses em presença”, e o reforço dos incentivos à estabilidade nos contratos de arrendamento para habitação própria e permanente, bem como a redução da tributação sobre os rendimentos prediais.

Os projetos de lei do BE versam sobre a eliminação dos benefícios fiscais para fundos de investimento imobiliário e a proibição da venda de casas a não residentes. Os bloquistas apresentam ainda um conjunto de normas para controle de rendas e defendem que o novo edificado construído em Portugal, onde apenas 2% da habitação é pública, tenha uma quota mínima de 25% para arrendamento ou construção a custos controlados.

O PCP apresenta uma série de medidas, entre as quais um regime especial de proteção da habitação própria e a mobilização de patrimônio público para fins habitacionais. Os comunistas propõem ainda o fim dos regimes fiscais de favorecimento, nomeadamente para residentes não habituais, e um regime extraordinário de proibição de penhora e execução de hipoteca de habitação própria permanente.

No projeto de resolução que também apresenta, o PCP pede o reforço de meios do Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU).

No mesmo sentido vai o projeto de lei do deputado único do Livre, Rui Tavares, propondo que o IHRU seja dotado com “capacidade técnica e financeira capaz de assegurar 100.000 novos fogos para habitação em dez anos”.

Outras entidades emitiram pareceres sobre o novo pacote de medidas, nomeadamente a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e a Associação Nacional de Freguesias (Anafre).

A ANMP condicionou a emissão de um parecer favorável à resolução de “questões fundamentais” relacionadas com as medidas sobre arrendamento forçado, alojamento local, incentivos fiscais à reabilitação urbana e poderes tributários dos municípios.

A ANMP identifica o arrendamento forçado de habitações devolutas como uma das medidas que “mais preocupa” o poder local, assinalando que os municípios que não cumpram essa disposição serão penalizados com o fim das taxas agravadas de IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis) sobre os prédios devolutos.

A associação propõe também limites à “suspensão automática e generalizada de novas licenças” de alojamento local e considera que “não é admissível” que o Estado central conceda unilateralmente isenções automáticas de impostos que geram receitas municipais.

Recusando dar parecer, a Anafre lamenta que não se tenha considerado o “potencial de contribuição assinalável” das freguesias para as políticas públicas de habitação.

“As freguesias apenas são mencionadas em dois normativos”, lamenta, acrescentando que “não foram incluídas” entre os beneficiários do apoio à habitação para arrendamento acessível, nem nas parcerias com as cooperativas.

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