Ex-presidentes falam de semipresidencialismo e livre comércio em Fórum Brasil-Portugal

Mundo Lusíada
Com Lusa

A conferência “Brasil e Portugal: Perspetivas de Futuro”, que decorre até hoje na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, juntou os antigos chefes de Estado António Ramalho Eanes e Aníbal Cavaco Silva, além de Michel Temer que participou por videoconferência, e considerou que o semipresidencialismo português “tem sido a principal base” para o projeto que está em debate no Congresso brasileiro.

O ex-Presidente brasileiro Temer destacou a inspiração que o sistema semipresidencialista português oferece à iniciativa política em curso no Brasil para alterar a característica do sistema político brasileiro.

“Eu tenho dito que no Brasil, lamentavelmente, o presidencialismo se esfarrapou ao longo do tempo. Nós tivemos só nessa Constituição, que não tem nem 34 anos, dois ‘impeachment’. Isto cria um trauma institucional no país. Eu vejo que em Portugal, com o semipresidencialismo, esses traumas inexistem”, disse Temer.

”Portugal foi a inspiração para o semipresidencialismo brasileiro”, e para Michel Temer se a proposta vingar “será bom para o Brasil e, neste particular, o ensinamento, com toda a franqueza, terá vindo de Portugal”.

O ex-Presidente brasileiro destacou ainda a influência dos juristas portugueses no Brasil e a qualidade do ensino de Direito em Portugal.

“Eu sou da área jurídica e os livros que eu adotava nos mestrados eram os livros do professor (Gomes) Canotilho, do professor Jorge Miranda, do Blanco Morais. São professores extraordinários da Universidade de Coimbra e de Lisboa”, disse.

“Nós temos essa ligação jurídica muito forte e muito intensa. Este é um primeiro aprendizado que podemos ter com os grandes juristas portugueses”, enfatizou.

A título de exemplo, Michel Temer destacou que é “intenso” o número de estudantes da área jurídica que se habilitam para a Universidade de Lisboa e para Coimbra.

“E quem vem da Universidade de Lisboa e de Coimbra vem com um título especial para, digamos assim, empregar-se no Brasil”, notou, concluindo que a formação universitária em Portugal “é extraordinária e pode servir de exemplo para o Brasil”.

No plano das relações bilaterais, Temer destacou também o “apoio extraordinário que Portugal tem dado ao Brasil, e exemplificou o “empenho” português em apoiar o Brasil na “sua já antiga tese de modificação do Conselho de Segurança da ONU”.

Mercosul

Presente, o ex-Presidente português Aníbal Cavaco Silva sublinhou a importância de ratificar o acordo de comércio livre entre União Europeia e Mercosul, como o “maior contributo” para o fortalecimento das relações econômicas entre Portugal e Brasil.

De acordo com Cavaco Silva, nas relações entre Brasil e Portugal, na área econômica, do comércio e do investimento, os resultados ficam aquém das expectativas, ao contrário das relações humanas, acadêmicas, da CPLP ou do acordo ortográfico, em que as “relações têm corrido muito bem”.

“Depois de 20 anos de negociação entre a União Europeia e o Mercosul, os dois blocos chegaram a um acordo para a constituição de uma zona de comércio livre. Ao fim de três anos ele ainda não foi ratificado e não sei se algum dia será ratificado”, lamentou.

Na opinião do antigo chefe de Estado, “a entrada em vigor deste acordo de comércio livre é o maior contributo” que se pode dar “para o fortalecimento das relações econômicas e de investimento entre Portugal e o Brasil”.

“Por isso, Portugal tem estado na primeira linha, juntamente com a Espanha, para que seja feita pressão sobre todos os estados-membros para que a ratificação ocorra”, explicou.

Numa altura em que aproxima a comemoração dos 200 ano da independência do Brasil, “um país chave dentro do Mercosul”, Cavaco Silva manifesta “alguma esperança de que, passado este tempo de guerra na Ucrânia, a União Europeia se possa concentrar sobre a importância deste acordo de comércio livre com o Mercosul e os parlamentos acabem por o aprovar”.

Segundo Cavaco Silva, este acordo “tem de ser ratificado pelo Parlamento Europeu, por cada um dos parlamentos dos 27 estados-membros da União Europeia e alguns dos membros da UE têm dúvidas em fazê-lo”.

“A oposição vem basicamente dos agricultores europeus de alguns países que receiam a competição dos produtos agrícolas brasileiros e vem dos ambientalistas que receiam que esse acordo aumente a desflorestação da Amazônia”, elencou.

Já Ramalho Eanes considerou que “muito há a fazer e muitos passos ultimamente se tem dado” para uma “aproximação e uma cooperação maiores entre Portugal e Brasil” graças ao turismo e à migração.

“Uma cooperação é indispensável e lembrando ainda aquilo que aconteceu na Europa, essa cooperação só pode ganhar dimensão e propósito estratégico se porventura houver uma intervenção do Estado. Não está na moda falar da intervenção do Estado, mas um Estado interventivo neste caso é importante porque só o Estado pode fazer um trabalho que eu entendo que é indispensável, defendeu.

A conferência, que reúne até esta sexta-feira personalidades políticas, econômicas, acadêmicas em Lisboa, foi aberta pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, João Cravinho, quem sublinhou uma UE como parceira natural do Mercosul.

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