A mobilidade e a promoção do comércio como principais desafios da CPLP

O Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa (E), momentos antes de discursar durante a sessão de abertura Cimeira da CPLP entre outros presidentes, em Santa Maria, Ilha do Sal em Cabo Verde, 17 de julho de 2018. TIAGO PETINGA / LUSA

Mundo Lusíada
Com Lusa

Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste são os Estados-membros reunidos na Cimeira da CPLP, e mesmo antes já se antecipava um dos principais temas: mobilidade entre lusófonos. Da cimeira, deve sair uma declaração no sentido de promover a circulação dos cidadãos lusófonos, que foi objeto de uma proposta de Portugal e Cabo Verde na última semana.

A secretária-executiva da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), Maria do Carmo Silveira, identificou a facilitação da mobilidade e a promoção do comércio como os principais desafios que a organização enfrenta.

“Esta vontade política de construção de um espaço comum de solidariedade, de concertação e de diálogo coloca diversos desafios à nossa organização, dos quais destacaria a facilitação da mobilidade de pessoas e bens, a criação de um ambiente econômico e jurídico que facilite a promoção do comércio e investimento mútuos e uma maior aproximação aos cidadãos da nossa comunidade”, disse a responsável, na abertura da XII conferência de chefes de Estado e de Governo da CPLP, na ilha do Sal, Cabo Verde.

Maria do Carmo Silveira manifestou-se convicta de que, “com o contínuo engajamento de cada um dos Estados-membros, a CPLP será capaz de se superar no contexto do mundo globalizado, sem se descaracterizar, transformando os vínculos históricos, linguísticos e afetivos numa poderosa alavanca para o desenvolvimento dos seus Estados e consolidando-se enquanto realidade linguística, sem dúvida, mas também política e – esperamos – cada vez mais econômica”.

A secretária-executiva ressaltou também o “crescente interesse” nas esferas internas e internacional que a comunidade tem suscitado, apontando o aumento de países e organizações interessados em obter o estatuto de observador associado e consultivo como um “claro indicador da atenção” de que a CPLP tem sido objeto.

A responsável advertiu ainda que a organização “é uma obra em construção”, na qual “as conquistas anteriores são fundamentais para as etapas seguintes”.

Maria do Carmo Silveira saudou o tema escolhido por Cabo Verde para a presidência rotativa da CPLP que assumiu – “Cultura, Pessoas e Oceanos”, que definiu como “dimensões essenciais” da organização lusófona.

“Hoje, os recursos naturais e as atividades econômicas ligadas ao mar oferecem possibilidades e desafios determinantes para o desenvolvimento sustentável dos nossos países. Cabe-nos avançar nos esforços de cooperação em torno deste enorme potencial de caráter natural, científico, econômico, político e estratégico”, defendeu.

A transmissão, via televisão, do discurso de Maria do Carmo Silveira sofreu vários cortes e acabou por ser interrompido, impedindo os jornalistas que acompanham a cimeira de Santa Maria e que não têm acesso à sala onde decorre a reunião, de o acompanhar no tempo devido.

Presidência

Ao assumir a presidência, o chefe de Estado cabo-verdiano, Jorge Carlos Fonseca, já apontou a mobilidade como “um dos desafios maiores” da CPLP, considerando “um dever” tudo fazer para um dia circular livremente no espaço comum.

“A mobilidade plena no nosso espaço constitui um dos desafios maiores da CPLP. A tarefa sabemo-la difícil. No entanto, o nosso dever é tudo fazer para que um dia possamos livremente deslocar-nos neste espaço que é comum”, sustentou.

Segundo ele, a questão da mobilidade não é um tema novo e já vem sendo debatido e manifestou a expectativa de que “durante esta cimeira possa obter avanços significativos”. “Temos a obrigação de fazer o máximo de esforço, exatamente por que sabemos não ser muito fácil a tarefa”, reforçou.

O Presidente cabo-verdiano disse assumir “com elevada honra e profundo interesse” a presidência da CPLP, apontando a “máxima relevância” da agenda de trabalhos da cimeira que, sublinhou, se “propõe encontrar caminhos ou possíveis soluções na resolução de problemas comuns”.

Também o presidente angolano defendeu que os países lusófonos devem debruçar-se “com atenção e até com alguma urgência para que a CPLP seja uma organização em que não só a língua e a cultura sejam fatores de aproximação, como, fundamentalmente, a circulação dos cidadãos entre os Estados-membros”.

“Os nossos cidadãos devem perceber que vale a pena fazer parte da comunidade, não só pelos atos de cooperação que vamos realizando aqui e ali, mas principalmente pelas vantagens diretas e até pessoais que poderão obter do facto de estarem inseridos nesta comunidade”, salientou.

O Presidente de Moçambique disse ver “com apreço” que já hoje seja facilitada a circulação de pessoas para detentores de passaportes normais ou para determinadas categorias de cidadãos, mas deixou um alerta. “É intenção final dos nossos povos que a livre circulação seja sem classificação social e em igualdade de circunstâncias”, destacou.

Proposta Portuguesa

Também o Presidente português defendeu que a CPLP pode “fazer mais e melhor, ainda melhor” no reforço do papel da mulher, na educação, na atenção à mobilidade e ao ambiente. Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, é preciso também “olhar mais para educação, a qualificação, a ciência, a inovação”, bem como “para a mobilidade pessoal, social, econômica, empresarial e financeira” e “para o ambiente, as alterações climáticas, a qualidade de vida, os compromissos intergeracionais”.

Marcelo Rebelo de Sousa encerrou o seu discurso declarando que, mais ainda do que há dois anos, na cimeira de Brasília, acredita na CPLP: “Porque acredito na razão do óbvio, na força do evidente, na imparável dinâmica das pessoas, no apelo do contexto em que nos movemos, no poder que, nesse contexto, está ao nosso alcance”.

“Que à estratégia de Brasília se some agora o espírito do Sal, o vigor do oceano e também a nossa vontade: a vontade de não desiludirmos centenas de milhões de compatriotas”, apelou.

Já o primeiro-ministro tinha sustentado, antes do encontro, que a proposta de Portugal sobre mobilidade na comunidade lusófona é “perfeitamente compatível” com a pertença do país à União Europeia, sublinhando que é preciso avançar antes que as regras mudem.

“A mobilidade foi uma proposta que Portugal apresentou e que é perfeitamente compatível com o nosso quadro regulamentar na União Europeia e, é por isso, que é importante não adiar excessivamente a decisão sobre esta matéria para podermos tomar as decisões enquanto o quadro legal é este”, disse António Costa, reiterando que é preciso aproveitar esta janela de oportunidade.

Já no dia 18, António Costa defendeu que a cooperação econômica e empresarial “tem de ser a espinha dorsal” da CPLP, que descreveu como uma “grande ponte” mais necessária do que nunca no quadro global, descrevendo a organização como essencial.

E rejeitou que a CPLP seja vista como “uma alternativa” à participação dos diferentes Estados-membros noutras plataformas nos respetivos nos espaços em que se inserem, sustentando que, pelo contrário, uma das suas “grandes mais-valias” é precisamente a conjugação de países que “participam ativamente” em organizações regionais como o Mercosul, a União Europeia ou a Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental.

ONU

Os países também manifestaram o apoio às aspirações do Brasil e África de conseguirem assentos permanentes num futuro Conselho de Segurança das Nações Unidas alargado. Segundo a Declaração de Santa Maria, os estados membros reiteraram o “apoio à aspiração do Brasil e de África em ocuparem assentos permanentes em um Conselho de Segurança ampliado” e endossaram a “candidatura do Brasil a um assento não-permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas no biênio 2022-2023, por ocasião das eleições de 2021”.

Neste contexto, sublinharam “a vontade política comum de promover a imagem da comunidade por meio do apoio a candidaturas de estados-membros a cargos e funções em organizações internacionais” e a importância “estreitar a colaboração entre a CPLP e a ONU, suas agências, fundos e programas”.

Os chefes de Estado e de governo saudaram a eleição de vários cidadãos lusófonos para cargos em organizações internacionais, nomeadamente a de António Vitorino, de Portugal, para Diretor Geral da Organização Internacional das Migrações (OIM).

No dia 18, os Estados-membros atribuíram um prêmio ao secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, pela sua “atuação singular” em defesa dos valores da comunidade lusófona e da língua portuguesa.

A atribuição do Prêmio José Aparecido de Oliveira a António Guterres consta da Declaração de Santa Maria, pela sua “atuação singular, com projeção internacional, na defesa e promoção dos princípios e valores da CPLP, bem como pelo elevado contributo na promoção e difusão da língua portuguesa”.

Acordo ortográfico

A Declaração de Santa Maria inclui uma recomendação para “o desenvolvimento de esforços para a implementação do Acordo Ortográfico”. No texto aprovado na XII Cimeira da CPLP, os Estados-membros “recomendaram o desenvolvimento de esforços para a implementação do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, instando à sua ratificação e ao estabelecimento de formas de cooperação efetiva para a elaboração dos Vocabulários Ortográficos Nacionais (VON)”.

Por outro lado, os nove Estados-membros “tomaram nota, com satisfação, da dinâmica desenvolvida pelo Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), assumindo-se, cada vez mais, como uma instituição de caráter multilateral e fórum de planejamento e coordenação de projetos ligados ao fortalecimento da Língua Portuguesa”.

Neste plano, “expressaram o seu reconhecimento pelos significativos avanços dos projetos ‘Vocabulário Ortográfico Comum da Língua Portuguesa (VOC)’ e ‘Portal do Professor de Português língua estrangeira/língua não materna (PPPLE)’, sob responsabilidade do IILP”.

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