PS não recorre da anulação de votos de emigrantes para evitar perturbação

Mundo Lusíada com Lusa

Nesta quinta-feira, o PS decidiu não recorrer da anulação de mais de 157 mil votos de emigrantes para evitar “mais perturbação”, segundo o deputado Paulo Pisco, que considera a situação “totalmente inaceitável” e “absolutamente evitável”.

Pisco, que é também cabeça de lista do PS pelo círculo da Europa, disse que o partido decidiu não recorrer desta decisão, porque não altera a distribuição de mandatos e para manter “uma postura de Estado, para que não haja mais perturbação do que aquela que já houve”.

Em comunicado, o Partido Socialista diz que “não contribuirá mais para o prolongamento deste grave e inútil incidente provocado pelo PSD e deseja que todo o processo eleitoral fique encerrado o mais rapidamente possível, para dar lugar à nova legislatura”.

Mais de 80% dos votos dos emigrantes do círculo da Europa nas legislativas de 30 de janeiro foram considerados nulos, após protestos do PSD, mas a distribuição de mandatos mantém-se, com PS e PSD a conquistarem dois deputados cada nos círculos da emigração.

Segundo o edital publicado neste dia 10 sobre o apuramento geral da eleição do círculo da Europa, de um total de 195.701 votos recebidos, 157.205 foram considerados nulos, o que equivale a 80,32%.

Em causa estão protestos apresentados pelo PSD após a maioria das mesas ter validado votos que não vinham acompanhados de cópia do cartão de cidadão (CC) do eleitor, como exige a lei.

Como esses votos foram misturados com os votos válidos, a mesa da assembleia de apuramento geral acabou por anular os resultados de dezenas de mesas, incluindo votos válidos e inválidos, por ser impossível distingui-los uma vez na urna.

Paulo Pisco considerou que a decisão da mesa de apuramento geral do círculo da Europa era “totalmente evitável” porque a mesa de apuramento geral do círculo Fora da Europa, perante a mesma situação, rejeitou o protesto do PSD e validou todos os votos, com ou sem cópia do CC.

Atribuiu por isso à mesa de apuramento geral da Europa “a sua quota parte de responsabilidade”.

Acrescentou que existe um “sentimento ambivalente” relativamente aos resultados finais dos círculos da emigração porque, por um lado registrou-se uma “enorme participação dos portugueses residentes no estrangeiro”, mas por outro “há um sentimento de desânimo de grande frustração” relativamente à anulação dos votos.

Lembrou que a anulação representa “uma redução brutal” do número de votos no Partido Socialista, que tinha de 78.000 votos antes da anulação e ficou com 14.000 votos.

“Esta anulação retirou ao Partido Socialista a 64.000 votos, e o PSD, que tinha 49.000 e passou a ter 9.000” perdeu cerca de 40.000 votos.

“É uma situação totalmente inaceitável e era absolutamente a evitável, se não tivesse sido esta obsessão que o PSD manifestou de querer anular os votos, em profundo desrespeito pela vontade de participação eleitoral dos portugueses residentes no estrangeiro”, lamentou.

Paulo Pisco acrescentou que “uma das prioridades do Partido Socialista na Assembleia da República será a alteração da lei eleitoral, para que nunca mais se repita este episódio verdadeiramente a reprovável”.

Questionado sobre por que motivo a lei não foi alterada na sequência das eleições legislativas de 2019, em que já tinham sido anulados 34 mil votos pelo mesmo motivo, o deputado socialista lembrou que a pandemia e a interrupção da legislatura impediram a concretização dessa intenção.

Explicou que havia três leis eleitorais para alterar e a prioridade foi mudar a das eleições autárquicas, uma vez que havia eleições para os municípios em 2021.

Em comunicado, o PS regozija-se também com a “vitória expressiva” nos círculos da emigração, em que obteve uma “vantagem clara de 37,72% dos votos, contra 28,04% do PSD, antes de contabilizada a anulação dos votos a pedido do PSD.

Manifesta também satisfação pela participação eleitoral nos dois círculos das comunidades, que contou com 257 mil votantes, o equivalente a 16,94%, o valor mais elevado de sempre, devendo sublinhar-se o aumento recorde verificado na Europa, que foi de 20,87%, o equivalente a 193.349 votantes.

PSD rejeita responsabilidade

 O presidente do PSD rejeitou que a responsabilidade da anulação de 157 mil votos da emigração seja “de quem reclamou” o cumprimento da lei, admitindo a necessidade de “revisitar” a lei eleitoral.

“Se os votos que estavam sob protesto, que não trouxeram fotocópia do cartão de cidadão, não tivessem entrado na urna e tivessem ficado à espera da decisão, isto não aconteceria. A responsabilidade não é de quem reclamou, é de quem pegou neles e os misturou com os outros”, acusou Rui Rio, questionado pelos jornalistas.

O presidente do PSD frisou que a lei diz que os votos têm de ser acompanhados da identificação, para garantir que foi aquela pessoa que votou.

Questionado se o PSD não fez acordo verbal para que fossem contados todos os votos, mesmo sem essa identificação, Rui Rio admitiu que sim.

“Numa reunião, houve um representante do PSD que aceitou isso. Mas há aqui uma parte que é muito difícil de superar, a lei é taxativa. A forma de resolver, enquanto não se alterar a lei, era os votos sob protesto ficarem ao lado e só serem contados se o juiz assim determinasse”, afirmou.

Questionado se o PSD admite, tal como o PS, rever a lei eleitoral para a Assembleia da República neste ponto, Rio afirmou ser necessário “olhar para a lei para encontrar uma solução”, lembrando que a situação já se verificou em 2019.

Incompetência

Também a Iniciativa Liberal acusou PS e PSD de “grave incompetência na contagem de votos da emigração”, insistindo na revisão urgente da lei eleitoral para evitar que volte a acontecer.

“A Iniciativa Liberal repudia mais um inaceitável momento de incompetência do Estado português, que desrespeita de forma grave os portugueses no exterior, e quer rever urgentemente a lei eleitoral para evitar um processo semelhante nas próximas eleições”, pode ler-se numa nota de João Cotrim Figueiredo.

De acordo com a Iniciativa Liberal (IL), os “partidos tradicionais do sistema não se mostraram capazes de resolver um problema que se tem arrastado e que diminui a qualidade da democracia e a liberdade política em Portugal”.

“Já em 2019 o PSD conseguiu a anulação de 34 mil votos de emigrantes”, recordou.

A IL acusou, por isso, “os dois maiores partidos, PS e PSD, de incompetência na contagem de votos da emigração”, considerando que “os dois partidos, através dos seus acordos com interesses próprios, conduzem inevitavelmente a um Estado que funciona muito mal, falhando de forma grave nas suas competências mais básicas e exclusivas”.

“Temos um país que estimula as pessoas a emigrarem e depois não só torna muito difícil que consigam votar como ainda desconsidera muitos dos votos que recebeu, um país que anula votos em eleições”, criticam os liberais.

Com os quatro deputados eleitos pela emigração, o PS fica com 119 deputados e o PSD com 73 deputados sozinho, subindo para 78 deputados somando os valores obtidos nas coligações de que fez parte na Madeira e nos Açores.

Os partidos têm 24 horas para recorrer destes resultados.

Volt recorre

O Volt Portugal anunciou esta sexta-feira que recorreu da anulação de votos de portugueses na Europa, propondo-se defender “direitos civis”, após recurso apresentado dentro do prazo.

“O Volt acredita que um país que contém 20 por cento dos seus cidadãos a residir fora do território nacional, deve esforçar-se por proteger os direitos desta população, bem como assegurar a sua participação nos processos democráticos”, lê-se num comunicado enviado pelo partido às redações.

O documento recorda que “existem hoje mais de 2.6 milhões de Portugueses a residir fora do território nacional, dos quais 1,5 milhões foram chamados às urnas em aneiro para elegerem os deputados à Assembleia da República. É assim da máxima importância que a estes cidadãos não seja vedado o direito ao voto”.

Para o Volt Portugal, a anulação dos 157.205 votos “ foi uma afronta à democracia e aos direitos civis dos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro”.

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