“O Estado não tem a obrigação de intervir na mídia?” questiona presidente português

Da Redação
Com Lusa

O Presidente de Portugal questionou, nesta terça-feira, se o Estado não tem o dever de intervir face à crise da comunicação social, considerando que há uma “situação de emergência” que já constitui um problema democrático e de regime.

“A grande interrogação que eu tenho formulado a mim mesmo é a seguinte: até que ponto o Estado não tem a obrigação de intervir?”, declarou Marcelo Rebelo de Sousa, na cerimônia de entrega dos Prêmios Gazeta 2017, num hotel de Lisboa.

O chefe de Estado adiantou que, a este propósito, tem pensado se “não será possível uma forma de intervenção transversal, a nível parlamentar, que correspondesse a um acordo de regime”.

“Não sei, verdadeiramente, quais são as pistas. Tenho para mim esta preocupação, que é: não queria terminar o meu mandato presidencial com a sensação de ter coincidido com um período dramático da crise profunda da comunicação social em Portugal. E, portanto, da liberdade em Portugal e, portanto, da democracia em Portugal”, acrescentou.

Em relação a uma eventual intervenção do Estado, “nem que seja para apoiar financeiramente, economicamente, encontrar decisões ou medidas que minimizem este tipo de crise”, o Presidente da República referiu que a questão lhe suscitou inicialmente reservas.

“É o risco — nós temos essa memória, os mais velhinhos — de, ao intervir, pôr a mão e ter a tentação de abusar”, justificou Marcelo Rebelo de Sousa. Em seguida, equacionou a possibilidade de “uma forma de intervenção transversal” ou através de “pequenas medidas”, como “o porte pago, por exemplo”, salientando o seu impacto na imprensa regional e local. “Apesar de tudo, não era uma intervenção escandalosa”, considerou.

O Presidente da República lançou também como hipótese de intervenção “estudar o que se faz lá fora” em relação às “grandes plataformas multinacionais” que utilizam conteúdos da comunicação social portuguesa, “mesmo sabendo que se trata de uma luta muito desigual, para haver uma compensação do que é feito cá dentro e que devia ser remunerado”.

Dirigindo-se aos premiados e aos outros jornalistas presentes na sala, afirmou: “Este tempo é um tempo de resistência. Vão ter de resistir para poder vencer. Eu vou ver o que posso fazer para ajudar nessa resistência, mas só resistindo é que se conseguirá vencer”.

Segundo o chefe de Estado, a situação de emergência “de, ano para ano, vai sendo cada vez mais grave”, na rádio, na imprensa, na televisão, e está “a criar problemas já democráticos, problemas de regime”.

Marcelo Rebelo de Sousa advertiu que “a erupção do que se chama, para simplificar, populismos e outros fenômenos do gênero, além de causas econômicas e sociais que dão lastro a isso”, assenta igualmente na “presente debilidade crescente da comunicação social”, que é, no fundo, “a debilidade crescente da democracia”.

“E a democracia portuguesa, que tem resistido mais do que outras democracias, mesmo próximas, tem de resistir também neste domínio, antes que apareça um chamado populista que de repente canalize as insatisfações, os protestos, os recalcamentos, os ressentimentos, e não haja uma capacidade de resistência da democracia e da liberdade à altura desse desafio”, alertou.

“Vale a pena resistir, pelo jornalismo, pela liberdade, pela democracia em Portugal”, concluiu o Presidente da República.

Na parte inicial do seu discurso, o chefe de Estado disse que, embora nunca tenha tido carteira profissional de jornalista, trabalhou ou colaborou com os seguintes órgãos de comunicação social: “Século, Capital, Diário de Lisboa, Diário Popular, Bola, para fazer uma cobertura louca num campeonato, Expresso, obviamente, Semanário, Mensageiro de Bragança, Diário de Coimbra, Jornal da Costa do Sol”.

“Rádios: Antena 1, TSF, Renascença, Rádio Comercial, que me lembre, assim de repente. Depois, televisões: TVI, RTP, SIC, é verdade, só para efeitos tenísticos, mas ainda consegui trabalhar para a SIC”, completou, expressando saudades desses tempos.

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