Ex-ministro diz que Governo quis tirar palavra corrupção de relatório sobre Portugal

Da Redação
Com Lusa

O ex-ministro Álvaro Santos Pereira disse no parlamento que houve “algum incômodo” e que um membro do Governo e a delegação portuguesa na OCDE quiseram remover a palavra corrupção do relatório da OCDE sobre Portugal, divulgado em fevereiro.

“Houve pelo menos algum incômodo. Quer a delegação portuguesa na OCDE, quer mais tarde um membro do Governo revelaram algumas preocupações com o relatório, nomeadamente manifestaram a sua intenção de remover a palavra corrupção do relatório, porque disseram que o problema da corrupção em Portugal não é dos mais graves”, afirmou neste dia 03 Álvaro Santos Pereira, na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O antigo ministro falava na qualidade de relator do relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sobre as perspetivas econômicas para Portugal – Economic Survey, na parte que se refere à reforma da justiça e à corrupção, a requerimento do PSD.

Álvaro Santos Pereira explicou que “a equipe que representou Portugal no comité era liderado pelo secretário de estado das Finanças Mourinho Félix”.

“Nada do que está neste relatório é extremamente controverso, o que não podíamos aceitar é só porque um Governo diz que não gosta da palavra corrupção, essa palavra não apareça”, frisou Álvaro Santos Pereira.

O diretor da OCDE referiu ainda que houve um outro país, “também latino”, que tentou que “não aparecessem gráficos de corrupção” e sublinhou que “em todos os países, desde a Dinamarca à Suécia, até Portugal, Itália e outros a questão da corrupção é central”.

Compadrio entre Estado e privados

“Onde é que está a Assembleia da República e onde é que está o Governo a combater a corrupção como desígnio nacional?”, questionou Álvaro Santos Pereira, na Assembleia da República.

“Senhores deputados têm a obrigação de mudar a Constituição ou fazer leis que façam com que o combate à corrupção seja um verdadeiro desígnio nacional. Não tenho visto muita ação nesta área aqui na Assembleia da República”, criticou o antigo ministro da Economia do governo de Passos Coelho, que enumerou um conjunto de medidas para combater a corrupção em Portugal.

“Primeiro, é fundamental avançar com um plano nacional contra a corrupção a cinco ou 10 anos, não só com mensagens políticas, mas também com medidas concretas. Segundo, Portugal deve criar uma agência nacional contra a corrupção”, começou por indicar o antigo ministro.

Em terceiro lugar, o atual diretor da OCDE sugeriu a criação de um tribunal especializado contra a corrupção, admitindo saber “que vai contra o artigo 209 da Constituição”.

Mas o antigo ministro argumentou que se “o texto da Constituição se torna um entrave ou não permite avançar com medidas fundamentais de combate à corrupção”, “mudar a Constituição não pode ser desculpa”.

Em quarto lugar, Álvaro Santos Pereira indicou que é necessário “regulamentar o enriquecimento ilícito”, frisando, uma vez mais, que “não faz sentido que a Constituição seja um entrave”.

O antigo ministro sugeriu também a introdução da delação premiada e “acabar com a pouca vergonha que são os recursos ilimitados das pessoas acusadas de corrupção”.

Álvaro Santos Pereira sugeriu ainda a necessidade de avançar com uma “reforma da administração pública que tire a política da administração pública”.

“Ou seja, cargos políticos só existirem para os cargos ministeriais. Mas para a administração pública acabou o ‘jobs for the boys ou for the girls'”, acrescentou, argumentando que esta reforma era “importante para credibilizar a política mas também para credibilizar a administração pública”.

Outras medidas referidas pelo antigo ministro foram o reforço dos mecanismos de transparência das compras do Estado, o reforço do poder do Ministério Público e da Procuradoria-Geral da República, além de regulamentação dos lobbys.

“Se não forem os partidos moderados a assumir a luta anticorrupção, estamos a abrir a porta para que os populistas venham e minem a democracia”, defendeu ainda Álvaro Santos Pereira.

“Este país foi à falência não só devido às políticas irresponsáveis, mas também devido ao compadrio entre Estado e privados, e isto também inclui o setor da energia, o setor bancário e o setor das PPP rodoviárias”, sustentou o antigo ministro, argumentando que “a corrupção e compadrio foram um dos responsáveis por este país ter ido à falência”.

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