Esperança paraolímpica brasileira está nas mãos de um português

Por Igor Lopes

Vitor acompanha desenvolvimento dos seus atletas. Nascido em Angola, Vítor se mudou para os Açores, onde se apaixonou pela Vela e por uma paulista. Esse velejador, que também tem nacionalidade portuguesa, conquistou campeonatos importantes, se tornou treinador e foi convidado a “guiar” o futuro da Vela adaptada brasileira.

 

A partir de 29 de agosto, as olimpíadas continuaram em Londres, mas com um charme especial. Milhares de atletas de todo o mundo se encontram na terra de Sua Majestade com o intuito de romper barreiras e ultrapassar limites. A capital inglesa é palco da tradicional paralimpíada, que reúne atletas com alguma deficiência. Brasil e Portugal estão representados. E o Mundo Lusíada descobriu um treinador que já passou pelos dois países e que vai estar em Londres, carregando no peito a esperança de conquistar medalhas.

Ele atende pelo nome de Vítor Marcelino e a sua trajetória merece destaque. Nascido em Angola, Vítor se mudou para os Açores, onde se apaixonou pela Vela e por uma paulista. Esse velejador, que também tem nacionalidade portuguesa, conquistou campeonatos importantes, se tornou treinador e foi convidado a “guiar” o futuro da Vela adaptada brasileira. Primeiro em Pequim, agora, em Londres.

As competições de Vela vão ter lugar em Weymouth-Portland, entre os dias 1 e 6 de setembro. Vítor comanda a única equipe de vela adaptada qualificada do Brasil para a competição na capital inglesa. Ao todo, são três classes existentes nos jogos, mas apenas a equipe de Vítor, que atua na classe “Skud 18”, com dois tripulantes, conseguiu se classificar. A nossa reportagem foi descobrir como anda a preparação da equipe canarinha. Num momento em que ainda se discute se o termo correto é “paralimpíada ou paraolimpíada”, o consenso fica mesmo no fato de que essa atividade desportiva é mais do que importante.

Vítor Hugo Pinheiro Marcelino tem 47 anos e é o nome da esperança brasileira quando o assunto é Vela adaptada. Fica claro que, por enquanto, ganhar medalhas não é o objetivo único. Mas fazer esse esporte “acontecer” por aqui é o sonho dos velejadores, que anseiam disputar muitas paralimpíadas.

No mundo, a Vela é conhecida por ser um esporte que necessita de muita força e versatilidade. Ainda mais se contar com atletas especiais. No “cenário paralímpico”, pessoas com deficiência locomotora ou visual podem competir. Nas mãos de Vítor, estão os atletas Bruno Landgraf e Elaine Cunha, numa parceria que dura já três anos, e que tem a ajuda da fisioterapeuta Berenice Chiarello.

Os dois atletas já conhecem o “sabor” das medalhas, mas em regatas locais. Vítor refere que eles começaram agora “uma nova vida esportiva”. Bruno, por exemplo, que hoje é tetraplégico, surgia, antes de um acidente, como uma jovem promessa do futebol brasileiro. Chegou a ser campeão Mundial sub-17. Atuava como goleiro reserva do São Paulo Futebol Clube e se preparava para disputar a olimpíada da China. Esse novo destino levou-lhe dos gramados para as águas.  Na opinião de Vítor, superação é a palavra de ordem nessa nova fase.

“A superação para ultrapassar os obstáculos, o empenho e a energia nessa resolução, tanto deles quanto nossa, se transformam num prêmio sem preço em cada objetivo ultrapassado”, avalia Vítor, que sublinha que, no entanto, as maiores dificuldades do dia-a-dia se prendem com a “falta de consciência da maior parte da população que não respeita as dificuldades dos outros”. Na opinião de Vítor, falar de falta de apoio não é solução. Segundo ele, “o Estado ajuda”, mas o problema está “na administração dos recursos”.

Falar em favoritismo, por enquanto, ainda é um sonho distante. Na classe “Skud”, equipes como as da Inglaterra, Austrália, Canadá e USA são as melhores nesse esporte. Por sua vez, o Brasil espera poder alcançar uma colocação de, no mínimo, 2\3 (dois terços) do total de participantes.

Treinador já faz parte da história

Em 2008, Vítor foi técnico da primeira equipe classificada a representar o Brasil na Vela em uma paralimpíada, na competição que teve lugar na China.

“Em 2007, levamos duas equipes para o Mundial da classe “Sonar”. Ambas fizeram um resultado que garantia a classificação do Brasil, mas apenas uma pôde representar o país na paralimpíada da China. Essa foi a primeira classificação brasileira numa competição desse tipo. Embora tivéssemos ficado em último lugar, o resultado teria sido outro, não fosse uma desclassificação boba em uma das regatas”, conta Vítor.

Para essa nova experiência em Londres, o treinador começou a trabalhar especificamente com os atletas Bruno e Elaine na classe “Skud18”, até obter a vaga e classificação para a competição paralímpica.

Vida lusófona e paixão pelas águas

Vítor nasceu próximo à Vila Mariano Machado, atualmente Ganda, na Angola, onde viveu até aos 9 anos de idade. É filho de João Filipe Marcelino, nascido em Santa Combadão, perto de Coimbra, Portugal, e de Maria do Céu Martins Pinheiro, lisboeta. A sua família só iria regressar a Portugal em 1974, após a independência da Angola e começo da guerra-civil. Vítor morou nos Açores, na ilha de S. Miguel, de 1976 a 1999, onde foi o rei da Vela entre os anos de 1988 a 1998. No final de 1999, Vítor se deparou com a vontade da esposa paulista, Gorete Pavão, em voltar ao Brasil. O casal estava junto havia seis anos. Assim, decidiram iniciar uma nova vida em São Paulo, perto da família de Gorete.

A sua paixão pelo esporte náutico começou nos Açores. As ondas, talvez mais brandas, acabaram conquistando Vítor, que se deixou levar pelo encanto das Velas. Acabou sendo campeão nacional de Portugal por três vezes e participou em dez mundiais por Portugal.

“Era muita água circundando. Havia um mar maravilhoso. O esporte era lindo. Quando experimentei, foi paixão imediata. Sou muito competitivo. Fui campeão açoriano e, depois, de Portugal. Isso tudo em poucos anos”, afirma Vítor.

Chegar ao esporte adaptado foi uma questão de tempo. Vítor começou a velejar, em São Paulo, em 2004, no Clube Municipal de Iatismo de São Paulo, precisamente onde se iniciou o primeiro projeto de vela adaptada brasileiro, chamado Água-Viva. Ganhou três campeonatos brasileiros e cinco paulistas na classe “Daysailer”. Depois de tantas conquistas, e por ter experiência internacional, Vítor foi convidado a treinar os atletas brasileiros.

Expectativa de maior público

O Comitê Paralímpico Internacional (IPC) anunciou que a paralimpíada de Londres será a maior já realizada, com a presença de 165 países, 19 a mais que a última edição em Pequim, em 2008. O número de atletas também cresceu quase 10 por cento. Serão aproximadamente 4.200 competidores.

A audiência também pode bater um recorde. Está previsto que cerca de quatro bilhões de espectadores assistam às paralimpíadas entre os dias 29 de agosto e 9 de setembro.

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