Novo Banco: Estado poderia intervir “enquanto acionista” diz Ministro das Finanças

Da Redação
Com Lusa

O ministro português das Finanças, João Leão, admitiu que o Estado poderia intervir no Novo Banco “enquanto acionista”, excluindo a injeção de capital ao abrigo do Mecanismo de Capital Contingente, com limite de 3,9 mil milhões de euros.

“Se, por acaso houvesse qualquer intervenção do Estado, seria noutro âmbito [que não o do teto do Mecanismo de Capital Contingente], seria do Estado enquanto acionista, seria diferente. Ou seja, não tem a ver com o mecanismo que estamos a falar, e que o Estado, no âmbito dos ativos problemáticos, pode ser chamado até aos 3,9 mil milhões de euros”, disse João Leão no parlamento, em resposta a uma pergunta da deputada Mariana Mortágua, do BE.

O Fundo de Resolução, entidade associada ao Banco de Portugal que entra no perímetro das Administrações Públicas e conta para o défice, detém 25% do Novo Banco. Os restantes 75% pertencem à Lone Star, que comprou essa parte do banco em 2017.

João Leão considerou ainda que as declarações do presidente executivo do Novo Banco, António Ramalho, sobre uma possível necessidade de capital superior ao previsto, relativa a 2020, “são extemporâneas”.

“Penso que o senhor presidente do Novo Banco deve, nesta fase, concentrar-se em gerir bem o Novo Banco até ao final do ano, e nessa função, dado o envolvimento e o esforço que o país fez”, acrescentou.

O novo ministro das Finanças salientou que no orçamento suplementar “não existe nenhuma verba prevista para reforço, este ano, do Novo Banco”, e assegurou que “não está prevista nenhuma verba para além dos 3,9 mil milhões” de euros.

A pergunta foi suscitada por uma notícia do jornal Público, que referindo o contrato de venda do banco à Lone Star, dá conta que “num cenário de extrema adversidade” está garantida uma injeção automática do Estado para garantir a solidez da instituição, caso o acionista privado não tenha condições para resolver o problema.

“O máximo permitido que pode ser chamado no âmbito de ativos problemáticos são os 3,9 mil milhões. Não há uma relação direta entre a pandemia ou uma crise extrema e o que o Novo Banco pode avocar no âmbito desse acordo”, explicou o ministro.

No entanto, João Leão disse que existe “uma questão diferente, que não tem a ver com isso e se coloca também, até certo ponto, em outros bancos, que é a questão, de se houver eventos extremos, poderem colocar-se questões, no futuro, sobre os capitais desses bancos”.

“Os rácios de capitais dos bancos são para cumprir”, disse o ministro, e nesse caso teriam de se encontrar “mecanismos de injeção de capital no Novo Banco”, que seriam “ou do próprio acionista atual ou de outros acionistas”.

Mais tarde, em resposta ao deputado do Chega André Ventura, João Leão disse que “se houver situações extremas que afetem os capitais do banco, tem de haver uma solução”, que “tem de passar por novas injeções de capital, que podem ser de outras entidades privadas, e que podem, no limite, até ser do próprio Estado, mas aí o Estado também ficaria com uma parte do banco”.

O presidente executivo do Novo Banco admitiu que a instituição vai precisar de mais capital do que o previsto para este ano, face ao impacto da covid-19, alterando assim a estimativa que já tinha entregado ao Fundo de Resolução.

“No início de cada ano fazemos sempre uma previsão e entregamos essa previsão ao Fundo de Resolução. Naturalmente, [este ano], a diferença é entre a previsão que fizemos antes do covid e a que faremos depois do covid”, afirmou António Ramalho, numa entrevista conjunta ao Jornal de Negócios e à Antena 1.

Assim, conforme apontou este responsável, a “deterioração da situação econômica” antevê que o banco vá necessitar de “necessidades de capital ligeiramente suplementares” às que estavam estimadas.

No entanto, o presidente executivo do Novo Banco escusou-se a antecipar números, sublinhando que só no final do ano é que estes serão conhecidos.

À Lusa, o Novo Banco esclareceu posteriormente que “as necessidades de capital referidas só serão anunciadas em 2021, conforme estipulado no contrato” e “depois da aprovação das contas do fim do ano, auditadas e verificadas pela Olivier Wyman”.

O dinheiro recebido pelo Novo Banco para se recapitalizar totaliza 2.978 milhões de euros desde 2017, depois de, em 08 de maio, o Governo ter confirmado que foi realizada uma nova injeção de capital pelo Fundo de Resolução bancário.

O montante transferido, na semana em causa, para o Novo Banco pelo Fundo de Resolução (entidade financiada pelos bancos que operam em Portugal que consolida nas contas públicas) foi realizado ao abrigo do mecanismo acordado na venda do Novo Banco à Lone Star (em 2017), pelo qual o Fundo de Resolução compensa o banco por perdas em ativos com que ficou na resolução do BES.

Contudo, uma vez que o Fundo de Resolução não tem o dinheiro necessário às injeções de capital no Novo Banco, todos os anos pede dinheiro ao Estado, devolvendo o empréstimo ao longo de 30 anos.

Desta vez, dos 1.037 milhões de euros que o Fundo de Resolução pôs no Novo Banco, 850 milhões de euros vieram diretamente do Estado.

No total, o Novo Banco já recebeu 2.978 milhões de euros do Fundo de Resolução para se recapitalizar, dos quais 2.130 milhões de euros foram de empréstimos do Tesouro.

O Novo Banco registrou prejuízos de 1.058,8 milhões de euros em 2019, uma diminuição face aos 1.412,6 milhões de euros verificados em 2018.

Já no primeiro trimestre de 2020, a instituição financeira totalizou um prejuízo de 179,1 milhões de euros, valor que compara com um resultado líquido negativo de 93,1 milhões de euros registado em igual período do ano anterior.

Estupefato

O Presidente da República declarou dia 15 ter ficado “estupefato” com a notícia de que o Novo Banco vai precisar de mais capital do que o previsto para este ano devido ao impacto da covid-19.

Marcelo Rebelo de Sousa foi questionado pelos jornalistas sobre este assunto depois de ter dado uma aula em direto para o projeto de ensino à distância #EstudoEmCasa, nas instalações da RTP, em Lisboa.

“Eu não costumo comentar casos concretos de vida de instituições bancárias. Portanto, eu ouvi a notícia, fiquei estupefacto com ela, mas verdadeiramente não comento esse tipo de notícias, para não estar a entrar na situação concreta de instituições financeiras”, respondeu o chefe de Estado.

Escândalo

Também o secretário-geral do PCP tinha comentado ser “inaceitável e um escândalo” que o Estado continue a “encharcar” o Novo Banco de milhões de euros quando há trabalhadores que “perderam tudo”.

É “inaceitável e um escândalo, em particular para aqueles que estão no desemprego e perderam tudo, os seus salários e direitos”, afirmou Jerónimo de Sousa numa entrevista à TSF conduzida pelo jornalista Anselmo Crespo, ao comentar as recentes notícias sobre a eventual injeção de capital pelo Estado no antigo BES, e em que insistiu na nacionalização do banco.

Esses portugueses que “perderam tudo”, na atual crise causada pela pandemia de covid-19, vão “questionar que se injetem milhões e milhões de euros no banco”, afirmou, responsabilizando o Estado e os governos pela situação e “poupando” a Lone Star, embora também tenha criticado o este fundo que apelidou de “abutre”.

Este fundo, afirmou, “toda a gente sabia quem era”, uma “espécie de abutre que procura apanhar os restos”, neste caso, do BES.

O secretário-geral comunista fez ainda um comentário à notícia do Público. Jerónimo de Sousa criticou que passe a “ser automático o encharcamento de milhões de euros numa autêntica sangria desatada, tendo em o quadro econômico e social” em que o país vive.

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