Pandemia do coronavírus interrompe projeto do Zé do Pedal na África

“O ‘Muzungu’ (homem branco) trazia o coronavírus para o vilarejo” diz o relato do ativista brasileiro.

Da Redação

A pandemia mundial do COVID19, que já causou a morte de milhares de pessoas tendo infectado centenas de milhares em todo o mundo, e que escapou do controle das autoridades sanitárias, obrigou o brasileiro e ativista social José Geraldo de Souza Castro, Zé do Pedal, a paralisar o projeto na África.

O viajante, de 62 anos, membro do Lions Clube de Viçosa, estava fazendo uma caminhada de 12.000 quilômetros, empurrando uma cadeira de rodas, desde a Africa do Sul até o Egito.

Zé do Pedal, que na última terça feira regressou ao Brasil, procedente da Tanzânia, relatou o medo da população e seu retorno por motivo de segurança.

“O coronavírus começou a ser problema na África, com alguns casos isolados, porém em todos os países daquele continente. Apenas entrei na Tanzania e os membros do Lions Clubes de Dar Es Salaam me ligavam todos os dias para me colocarem a par dos novos casos e do avanço do vírus no continente, até que finalmente chegou a Arusha, cidade localizada aos pés do monte Kilimanjaro, o que aumentou o receio com minha segurança pelos membros dos Lions Clubes do país, que passaram a me dar dicas de precaução”.

Segundo o brasileiro, os meios de comunicação local abordavam o assunto sem muitos detalhes técnicos, sobre os casos principalmente na Europa, e mostrando que o vírus chegou àquele país com um viajante oriundo de um país europeu.

“Foi assim, com esta informação genérica, que comecei a ser hostilizado nos lugares por onde passava. A população pensava que apenas os brancos transmitiam o vírus. O pior momento foi ao chegar no pequeno povoado de Melela, distante 260km de Dar Es Salaam. Ao perguntar a um motociclista onde ficava a igreja católica, ele me deu a informação e saiu em disparada na minha frente” relatou Zé.

“Caminhei uns 150 metros e comecei a ver o resultado da sua pressa, ele gritava para as pessoas que o ‘Muzungu’ (homem branco) trazia o Corona vírus para o vilarejo: As pessoas paradas nas esquinas, nas portas e janelas com panos cobrindo o nariz para me verem passar. O caminho para a igreja era um labirinto e a cada pessoa que perguntava onde era a mesma (sempre a uns 8 – 10 metros de distância) apenas apontavam com o dedo na direção”.

Segundo ele, ao chegar à igreja as pessoas corriam para dentro. “Peguei o caminho de volta e as pessoas começaram a me jogar pedras. Foi quando resolvi usar a poderosa arma que tinha: a do corona. Dei um galope em direção aos que atiravam pedras e pronto…todos correram para suas casas. Voltei pelo mesmo caminho até chegar a um hotel, sempre observado atentamente pelos moradores. Toquei a campainha diversas vezes e ninguém atendia. Enquanto aguardava no portão apareceu um senhor que falava inglês e me explicou a situação. Em seguida chamou o oficial da Polícia e o gerente da Vila. Foi tensa a negociação, até que disseram que iam chamar um médico. Agradeci sorrindo e disse que estava bem, que aceitava a ideia pois assim deixava a população tranquila”.

Após conversa com o policial, que verificou seu passaporte e data de entrada no país, e depois com o médico, os curiosos foram avisados que o “Muzungu não tinha corona”. Sem poder sair desacompanhado, o brasileiro seguiu recomendações do Governador do Distrito, e interrompeu o projeto, por razões de segurança, retornando ao Brasil.

Zé do Pedal estava caminhando uma média de 40 quilômetros por dia, para cobrir, em um ano, a distância de 12 mil quilômetros, desde a África do Sul até Alexandria, no Egito (Norte da África), desde o dia 3 de novembro de 2019.

Empurrando uma cadeira de rodas, ele saiu de Jagersrust, uma pequena vila nas montanhas na província de Kwazulu –Natal, na África do Sul, para cruzar 11 países da Africa – África do Sul, Lesoto, Suazilândia, Zimbábue, Zâmbia, Malawi, Tanzânia, Quênia, Etiópia, Sudão e Egito, exatamente na cidade de Alexandria, dando um total de mais de 17.000.000 de passos durante o percurso, quando anotará as barreiras que a pessoa com deficiência encontra no seu dia a dia.

Até a paralisação do projeto, na cidade de Morogoro – Tanzania, Zé do Pedal completou 4800kms – 40% do trajeto total, depois de percorrer a África do Sul, Lesoto, Suazilândia, Zimbábue, Zâmbia, Malawi e parte da Tanzânia, enfrentando forte calor – 45 graus na Swazilandia, fortes chuvas que causaram destruição e morte em boa parte da África do Sul e seca extrema no Zimbábue.

“Apesar de ter interrompido a caminhada, estou muito feliz com o resultado pois em todos os lugares por onde passei fui recebido com carinho e alegria pelas pessoas. Mesmo com as dificuldades dos idiomas nativos as pessoas procuram uma maneira de comunicar comigo. O episódio de Melela, foi uma situação fora de contexto e entendo o desespero e o medo daquelas pessoas” definiu.

Durante sua caminhada Zé do Pedal faz palestras em escolas, visita associações que defendem a causa da Pessoa com Deficiência (PcD) e Lions Clubes nas cidades por onde passa. Dois dias antes de paralisar o projeto ele fez palestra para mais de 700 crianças em uma escola rural.

Um dos momentos mais difíceis para o ativista foi sua passagem pelo Zimbábue, Zé do Pedal, informou que o país enfrentou uma das piores secas dos últimos anos e ficou estarrecido com a quantidade de animais domésticos mortos devido à seca prolongada.

“A cada quilometro que eu andava, via carcaças de bois, cavalos, cabritos e jumentos à beira da estrada devido a falta de chuvas” declarou, informando ainda que “pelo menos mais de 200 elefantes, e outros animais silvestres, já morreram de fome e sede nos últimos 6 meses tanto no Parque Nacional de Hwange quanto no Parque Nacional de Mana Pools”. Este último, localizado no norte do país, e na rota do ativista, foi declarado Patrimônio Mundial pela UNESCO.

Muitos animais sairam dos parques em direção a zonas habitadas, à procura de comida e água, provocando a morte de 33 pessoas este ano, de acordo com a agência que gerencia os parques.

O ativista informou que o Projeto “Walking Africa – A World for Them” (Caminhando África – um mundo para eles), tem por objetivo chamar a atenção para um dos principais problemas que afetam as pessoas com deficiência em todo o mundo – as barreiras arquitetônicas – e conscientizar as pessoas, a terem mais respeito com as pessoas com deficiência. Para José, só mesmo eliminando as barreiras arquitetônicas e sociais que dificultam a participação ativa das pessoas com deficiência em todos os aspectos da vida social, o mundo será mais justo e humano.

Dividido em sete etapas, o projeto será focado principalmente em ministrar palestras nas escolas das comunidades visitadas para atrair a atenção das crianças acerca dos principais problemas que afetam as pessoas com deficiência: “As pessoas com deficiência não querem piedade, mas igualdade, dignidade e respeito”, afirma o Zé.

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), existem 500 milhões de pessoas com deficiência em todo o mundo – um décimo da raça humana – e 80% das pessoas com deficiência vivem em países em desenvolvimento. O ativista pretende divulgar também o projeto da Special Olympics (Olimpíadas Especiais).

Com foco na Pessoa com Deficiência Intelectual, a Special Olympics baseia-se na crença de que pessoas com deficiência intelectual podem, com instruções e incentivos adequados, aprender, aproveitar e se beneficiar da participação em esportes individuais e em equipe.

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