Oportunidades e proximidade cultural atraem brasileiros para Angola

Mundo Lusíada
Com Abr

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Novela angolana exibida no Brasil.

Localizada na região ocidental da África, Angola tem 18 milhões de habitantes, de acordo com a embaixada do país no Brasil. Com a história marcada por uma longa guerra civil, os angolanos conheceram a paz em 2002 e precisaram reconstruir o país.

Apesar das dificuldades, muitos brasileiros veem o país como um lugar acolhedor e que oferece boas oportunidades. Hoje, aproximadamente 30 mil brasileiros vivem no país africano, segundo a embaixada do Brasil em Luanda, capital angolana. O fator que mais atrai brasileiros é o trabalho.

“Hoje a gente tem pessoas em todas as áreas. Desde cabeleireiros, manicures a engenheiros, pessoal de música. Tudo. Fora a mão de obra mais específica para a construção civil, para a área do petróleo”, conta o fotógrafo Sérgio Guerra, que vive há 17 anos no país. “Inicialmente foi o trabalho que me atraiu. Aqui, a gente consegue entender a sociedade [angolana], as demandas da população”. Sérgio viajou por todo o país e conheceu pessoas e realidades diferentes durante o período de guerra civil. “E isso foi me aproximando do país, da cultura, das pessoas. Eu, que já vinha da Bahia, com uma referência de África muito forte, só fui confirmando essa estreiteza de afinidades.”

O professor e especialista em marketing Cláudio de Holanda Santos também foi a Angola para trabalhar e acabou se apaixonando pelo país. Em Angola há 12 anos, ele conta que chegou logo depois do fim dos conflitos para trabalhar como coordenador de um projeto de reinserção social de ex-militares por meio de formação profissional. O projeto, que contava com o apoio do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, ajudou na formação de 38 mil ex-militares.

O resultado do trabalho rendeu novas oportunidades, e o administrador ajudou também a fundar a Escola Nacional de Administração, um trabalho conjunto com o governo local e a Fundação Getulio Vargas (FGV). Ele lembra que um dos pontos que chamam a atenção, mesmo depois de tanto tempo, é o interesse da população angolana pelo desenvolvimento. “Aqui, uma necessidade deles é aprender. O professor passa a ter um papel com grande significado e respeito. Isso me deixou apaixonado, e é a razão de estar aqui até hoje.”

Cláudio também destaca a aposta do país no investimento em educação. “Eles sabem que não basta ter informação, é importante ter o conhecimento. Muitos estrangeiros estão explorando várias áreas, e o angolano precisava ter condições de tocar o seu país. Por isso, eles estão mandando vários jovens angolanos para toda parte do mundo para aprender.”

A cultura, as belas praias e a alegria do povo são pontos de destaque entre as semelhanças entre o Brasil e Angola. Milena Vieira chegou ao país há sete anos para prestar assessoria na área de saúde. Hoje, a enfermeira virou empresária. “Eu não tive dificuldade nenhuma de adaptação. Morei na Bahia e no Rio de Janeiro e vejo que aqui, na capital, tem muita coisa parecida. Quando eu estou no Rio de Janeiro até brinco dizendo que parece que estou em Luanda. Tem muita coisa parecida.”

Por ser um país em reconstrução, as oportunidades surgem a todo o momento. “Eu via que faltava tudo no país. Tinha muita coisa a ser trabalhada. E me chamou a atenção uma vez que eu precisei fazer um carimbo, e o custo era muito alto”, conta Milena. A necessidade virou negócio. Hoje ela vende carimbos e chaves.

A área de construção é uma das que mais chamam a atenção. Sérgio diz que o nível de crescimento do país é grande e que, nos últimos sete anos novas cidades foram construídas do zero. “São cidades inteiras com edifícios e estrutura urbana, todas feitas nos últimos oito anos, sete anos. São essas possibilidades que dão oportunidades aos brasileiros e às empresas brasileiras.”

Apesar das oportunidades, as dificuldades ainda são muitas. Brasileiros que vivem no país ressaltam que é possível perceber a melhora na estrutura de Angola, mas que ainda há muito a ser feito. “Problemas básicos. Ninguém consegue se livrar dos geradores, dos problemas com água. Ainda temos muitos problemas com abastecimento”, afirma Sérgio Guerra.

Custo de vida alto, falta de lazer, engarrafamentos e problemas sociais decorrentes da guerra também são constantes na vida dos angolanos. Para os brasileiros, o país ainda tem muito a crescer. “Viemos com um objetivo: é trabalho mesmo. Ninguém vem para cá desfrutar das belezas naturais, infelizmente, ainda. E acredito que essas coisas devem mudar. Mudou muito. Cinco anos atrás não tínhamos nada, e mudou bastante. A tendência é que fique melhor com o passar dos anos”, diz Milena.

“Hoje é um país muito diferente daquele que eu conheci. É um país que tem estabilidade econômica, a inflação está controlada, o país tem comprometimento com a institucionalidade, o que abre muitas possibilidades de trabalho e de relações internacionais”, enfatiza Guerra.

Angolanos no Brasil
Na contramão, Bilongo Lando Domingos, 32 anos, é cabeleireiro e há 13 anos mora no Rio de Janeiro. Angelina Sissa João, 26 anos, é estudante e desembarcou há dois anos na cidade para estudar marketing. Cabingano Manuel é jornalista, com especialização em administração, e chegou há quatro anos para trabalhar como correspondente de uma emissora de TV. Todos são angolanos e escolheram o Brasil em busca de melhores condições de vida e de oportunidades profissionais.

De acordo com o Ministério da Justiça, vivem no Brasil cerca de 12,5 mil angolanos, sendo 3,7 mil residentes. Boa parte chegou ao Rio e a São Paulo durante a guerra civil do país, entre 1990 e o início de 2000, quando o Brasil concedia refúgio àqueles que deixavam o país. É o caso de Bilongo, que saiu de Luanda, capital de Angola, para não ser recrutado.

“Eu queria muito sair. O país estava em guerra e nós, jovens, naquela época com 16 e 17 anos, com porte físico, éramos alvo, no sentido de que as Forças Armadas precisavam de jovens para poder lutar e eu não queria isso, aquela guerra não valia a pena”, contou Bilongo, que hoje é cabeleireiro especializado em cortes masculinos estilizados, no centro da capital fluminense.

Ele escolheu o Brasil pela língua e pela proximidade cultural. “Os brasileiros têm muito respeito por nós, se identificam com a música, as cores, o jeito de ser”, lista.

Angelina Sissa veio em busca de qualificação profissional. Incentivada por parentes que estudaram no Rio e voltaram para Angola, ela se matriculou em marketing. “O Brasil tem mais experiência nessa área.” Há dois anos ela estuda em uma universidade particular e mora na Tijuca, na zona norte. Para Angelina, a escolha pelo Brasil também se deve à proximidade cultural.

“O ambiente aqui é próximo ao de Angola: a maneira de ser [dos brasileiros] não foge muito [do que é lá], são pessoas abertas, que gostam de conversar, simpáticas”, destacou.

Cabingano Manuel chegou para fazer mestrado em comunicação e cursar pós-graduação em administração. De correspondente internacional no Continente Americano, ele foi alçado a representante da Televisão Pública de Angola (TPA). Jornalista, revelou que conheceu o Brasil dando palestras na Bahia e há quatro anos resolveu vir para morar com a família. “Minha decisão de vir foi primeiramente acadêmica, só depois disso vieram as outras coisas [o trabalho]”, disse.

Manuel também assegura que as semelhanças entre a cultura brasileira e angolana foram determinantes em sua decisão. “É muito mais prático reencontrar-me, adaptar-me ao Brasil do que a Portugal ou a outro país: as ruas, as pessoas, os hábitos e costumes são muito parecidos aos de Angola e, particularmente, aos de Luanda”, revelou. Entre seus programas favoritos de fim de semana estão caminhar na Praia de Copacabana e visitar pontos turísticos.

A facilidade de se comunicar – os dois países têm a língua portuguesa como idioma oficial – ajudou a atrair os imigrantes, diz Luiz Fernando Godinho, porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur). Por causa da guerra, o Brasil chegou a receber cerca de 1,7 mil angolanos e, durante muitos anos, eles foram o maior grupo de refugiados no país.

“Essa população [de refugiados] foi diminuindo. Hoje, os angolanos são o terceiro maior grupo, entre os cerca de 7,2 mil refugiados, de 80 nacionalidades. A maioria é formada de pessoas vindas da Síria (1,2 mil) e da Colômbia (1 mil)”, informou Godinho. O número de angolanos com refúgio – que atualmente está em 873 – tende a cair mais, uma vez que eles têm trocado essa condição pela residência.

Desde o início de novembro, a TV Brasil transmite, de segunda a sexta-feira, às 23h, a novela Windeck – Todos os Tons de Angola. A trama, ambientada em Luanda, é centrada nos bastidores da redação de uma revista chamada Divo. A novela é transmitida com áudio original, ou seja, os atores falam português de Angola. Com 140 capítulos, Windeck foi a primeira novela produzida no país africano. A exibição tem apoio da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República.

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