Angola pode estar a correr o risco de populismo, diz advogado

Da Redação
Com Lusa

O advogado angolano David Mendes afirma que a detenção de pessoas próximas do ex-Presidente José Eduardo dos Santos não representa uma mudança, alertando antes para os riscos do populismo à passagem do primeiro ano de mandato do atual presidente João Lourenço.

“Começa a preocupar que estejamos a cair num populismo”, disse o advogado, fundador da organização não-governamental “Mãos Livres”, ao comentar à Lusa a prisão preventiva do filho de José Eduardo dos Santos – José Filomeno dos Santos, na segunda-feira – e de antigos membros do anterior executivo.

“Acho que podemos estar a correr o risco de populismo, e, para mim, todo o tipo de populismo é grave, porque o populismo leva às ditaduras. Eu não apoio medidas populistas”, sublinhou David Mendes, advogado que nos últimos anos assumiu a defesa de vários ativistas, levados a tribunal pelas autoridades angolanas, sob a liderança, desde 1979, de José Eduardo dos Santos.

Precisamente quando João Lourenço cumpre o primeiro ano de mandato, o antigo ministro dos Transportes, Augusto Silva Tomás, e o filho varão de José Eduardo dos Santos, José Filomeno dos Santos, estão em prisão preventiva na cadeia de São Paulo – ainda em 2015 palco de greves de fome de ativistas detidos -, enquanto o ex-porta-voz do partido do poder (MPLA – Movimento Popular de Libertação de Angola), Norberto Garcia, está detido em sua casa.

Habituado à Justiça angolana, ao assumir a defesa de vários processos mediáticos no país, David Mendes confessa não entender a detenção preventiva agora aplicada a José Filomeno dos Santos.

“Não sei quais são os critérios para que, estando o processo já em fim de instrução, se decrete a prisão de uma pessoa que, a meu entender, já não vai perturbar a instrução do processo”, disse.

Fazendo um balanço do primeiro ano de João Lourenço – empossado como terceiro Presidente da República a 26 de setembro de 2017 -, David Mendes considera que, à exceção da liberdade de imprensa, pouco se pode atribuir ao Executivo, salientando que os cidadãos não registaram mudanças significativas.

“Até agora não vejo indicativos do ponto de vista econômico e social que nos deem uma visão de que as coisas melhoraram ou que as coisas tendem a melhorar. Tirando a liberdade de imprensa, ainda não há, na vida do cidadão, qualquer referência a uma mudança da forma de ser e de estar da sociedade”, afirmou o fundador da organização não-governamental “Mãos Livres”, formada por vários advogados angolanos.

Por outro lado, o advogado admite a existência de uma imprensa mais “aberta”, essencialmente no setor público.

“Hoje nós assistimos a uma imprensa mais aberta. Particularmente a imprensa pública, que deixou de fazer apenas propaganda política e (…) passar a imagem à sociedade que as coisas estavam a crescer, que havia desenvolvimento. Uma imagem que não correspondia à realidade dos factos”, assinalou.

Do Presidente de Angola, João Lourenço, o advogado e ativista espera que elucide os angolanos quanto ao futuro econômico do país, visto “não haver soluções econômicas” para os mais desfavorecidos.

“Espero que nos próximos tempos, João Lourenço nos dê alguma luz de como vai ser a situação econômica do país, porque o país, economicamente, está parado. Os níveis de pobreza estão a aumentar, as soluções econômicas das pessoas mais desfavorecidas não existem”, sublinhou.

O advogado, também eleito deputado como independente nas listas da UNITA, o maior partido da oposição, pede um parlamento forte e maior transparência ao Governo de João Lourenço na transmissão das decisões parlamentares, apelando a que as bancadas votem “por convicção” para alcançar o equilíbrio político.

Sem este equilíbrio, mostra-se cético quanto ao sistema judicial.

“Não havendo equilíbrio político, não acredito nesse sistema judiciário que se apresenta. Não se pode acreditar que os mesmos juízes e os mesmos procuradores de ontem, hoje tenham decisões diferentes. Quer dizer que estão a agir, não em função do sistema judiciário, mas em função dos interesses políticos”, concluiu.

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