Presidente do CCP diz que “80% da comunidade portuguesa vai votar em Bolsonaro”

Manifestação de brasileiros em Lisboa.

Da Redação
Com Lusa

O presidente do Conselho Permanente das Comunidades Portuguesas no estrangeiro, Flávio Martins, declarou à Lusa que cerca de 80% da comunidade portuguesa a viver no Brasil vai votar em Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais de 07 de outubro.

“A grande maioria, eu diria que 80%, da nossa comunidade” no país “tem manifestado o apoio, e mesmo feito campanha, em torno candidato Jair Bolsonaro”, disse Flávio Martins, que é conselheiro eleito pelo Brasil, onde vive, acrescentando que geograficamente essa tendência se tem sentido de norte a sul do país, em grandes estados como Rio de Janeiro, São Paulo ou Minas Gerais.

O presidente do órgão representativo dos portugueses emigrantes acredita que a concentração das intenções de voto no candidato da extrema-direita se deve, em parte, à insegurança sentida, ao “descontentamento geral com os partidos políticos tradicionais”, mas também por questões históricas.

“São pessoas que não foram habituadas a viver com a diversidade, com a democracia e com a diferença, e para mim isso está muito claro”, disse.

A viver no Rio de Janeiro, Flávio Martins afirmou à agência Lusa não partilhar da mesma opinião da comunidade portuguesa, acerca do candidato Jair Bolsonaro.

“Pessoalmente, eu vejo isso muito mal (escolha de Bolsonaro para Presidente). Primeiro porque ele se apresenta como um candidato novo e para mim não é. É igual aos outros. Em segundo, desconfio muito desse discurso do ‘Brasil acima de todos’ (lema de campanha de Bolsonaro), porque, inclusive, é um lema que se usava muito na Alemanha nazista”, comparou Flávio Martins.

Acrescentou ainda que desconfia muito do método defendido por Bolsonaro, de armar a população para resolver o problema da segurança. O conselheiro acredita que essa grande problemática que afeta o Brasil não irá ser resolvida pelo uso da força.

Flávio Martins comparou ainda Jair Bolsonaro ao ex-governante português António de Oliveira Salazar.

“A nossa comunidade, infelizmente, gosta mesmo de alguém que exiba muita força e que seja um novo Salazar, ou algo parecido. Infelizmente, eu acho que o que vai acontecer é ele (Bolsonaro) ter um grande apoio da quase totalidade das nossas comunidades aqui no Brasil”, afirmou.

À semelhança de Flávio Martins, também Fernando Haddad, candidato do Partido dos Trabalhadores (PT) à Presidência brasileira, traçou comparações entre Bolsonaro e o antigo governo ditatorial português do Estado Novo.

“Acho que os portugueses que conhecem o salazarismo e sabem tudo de ruim que o fascismo traz para o mundo, deviam ficar preocupados com a eleição no Brasil”, disse Haddad à imprensa portuguesa, durante um ato de campanha no Rio de Janeiro.

Flávio Martins acredita ainda que, caso Bolsonaro vença as eleições, o Brasil corre o risco de entrar numa “ditadura disfarçada”, onde as “liberdades pessoais serão suprimidas”.

Manifestações pró e contra Bolsonaro acontecem no Brasil e exterior

O Conselho das Comunidades Portuguesas é o órgão consultivo do Governo para as políticas relativas às comunidades portuguesas no estrangeiro. É composto por 12 conselheiros das comunidades, e é liderado, pelo terceiro ano consecutivo, por Flávio Martins (Brasil), como presidente; Nelson Ponta Garça (Estados Unidos da América), na vice-presidência, e Manuel Coelho (Namíbia), como secretário.

Imigrantes

Maria, imigrante brasileira em Portugal há 17 anos diz que “Bolsonaro não é a saída, mas é a única opção”. Esta afirmação resume o sentimento de muitos dos seus compatriotas que, como ela, vivem na Costa de Caparica.

No cabeleireiro criado por si, Maria não coloca sequer a hipótese de um dia regressar ao país de origem. “Aqui há mais oportunidades e vocês acolhem melhor. O pessoal, fala, fala, mas o Brasil é um bocado racista em vários aspectos. Eu sinto-me mais acolhida aqui (…) do que lá”.

“Lá”, porém, espera que o candidato da extrema-direita, Jair Bolsonaro, vença as eleições presidenciais. Para uma crente em Deus como ela, “Bolsonaro defende muita coisa que o evangelho defende” e só há uma coisa com a qual não concorda das suas ideias: a liberalização da posse de armas.

A imigrante diz que se assiste agora a uma nova vaga de chegada de brasileiros a Portugal. “Aqui no cabeleireiro a gente recebe bastante imigrante brasileiro a chegar, e na igreja (evangélica a que pertence) também”.

Só que o perfil destes é diferente do que tinham os de há uns anos. “O imigrante brasileiro que chega hoje é estudado, com muita informação. E vem procurar paz”, conclui.

Segundo o padre António Pires, da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição, chegaram entre janeiro e setembro 1.045 novos imigrantes a pedir ajuda, nomeadamente para documentação, dos quais 655 oriundos do Brasil, o que corresponde a 62,67% do total.

A ideia que tem das conversas com os imigrantes brasileiros “é que fazem uma leitura da situação política brasileira muito negativa”. “Há uma descrença absoluta nas instituições, uma decepção profunda sobre as expetativas que tiveram. (…) Por isso, há um pessimismo profundo ao olhar para o futuro”, diz o padre Pires.

“Acho que nada vai mudar com os outros candidatos, porque todos os que se estão a candidatar já estiveram dentro da política e não fizeram nada. Acredito que Bolsonaro possa recuperar, em parte, o Brasil, mas a liberação das armas para a população é que eu acho que não”, diz Patrícia, chegada há três dias do Brasil, após dois meses de férias.

Para a imigrante, que já viveu há anos em Portugal e regressou ao país de origem para uma experiência que não correu bem, acabando por voltar, “com a liberalização das armas, o Brasil corre o risco de se tornar numa Venezuela”.

Mesmo assim, se votar, será em Bolsonaro. “Vamos ver se com ele conseguimos melhorar”.

Betânia, empregada doméstica, mãe de três filhos, também faz parte, tal como o marido, de uma nova vaga de imigrantes que, depois de alguns anos passados no Brasil, voltaram a Portugal, onde a vida já lhes tinha oferecido melhores oportunidades.

“O Brasil, quanto mais o tempo passa mais se afunda. Aquela nuvem negra nunca sai de lá. Então acaba que as pessoas é que sofrem (…), em termos de educação, saúde” e “está tudo caro”, conta.

Em relação ao trabalho, diz, emocionada: “ganha-se um ordenado mínimo e não dá conta para pagar a renda. Então é complicado”.

O Brasil, para Betânia, não tem perspectiva de vida: “É só os políticos roubando, você não vê perspetiva, mesmo que se esforce de estudar, se você não tiver um padrinho, então aquilo não tem perspetiva de vida”.

Ainda assim tem esperança “no ‘Bolsonário’”. “Eu acredito que ele vai fazer qualquer coisa pelo povo. Apesar de muita gente ser contra, por causa das armas, e fala de matar e tudo, mas acho que isso é para acabar adquirindo mais votos”.

Ao contrário, para Tiago, jovem médico no hospital de São José, em Lisboa, com a especialidade de urologia, que veio para Portugal em criança, só há uma certeza: “Não voto em Bolsonaro”.

“Acho que o Bolsonaro não traz esperança para o Brasil, pelo contrário, nós não podemos ter os nossos compatriotas com armas na mão, não podemos ter xenofobia, preconceito, nós temos que ter um país livre, como sempre foi”, defende.

E alerta: “saímos de uma ditadura militar há uns anos, e corremos o risco de ter cerca de cinco ministros generais caso o Bolsonaro seja eleito. Então corremos o risco de ter um Brasil militarizado. Não será para o benefício do povo brasileiro”, afirma.

O problema, diz o jovem licenciado na Faculdade de Medicina de Lisboa, é que o Brasil tem um cenário para eleições “preocupante”.

Por um lado, Bolsonaro, do Partido Social Liberal (PSL), que vem impor algumas regras de extrema-direita, que pode colocar o Brasil em risco, agravar os problemas sociais e aumentar a discrepância entre ricos e pobres.

Do outro lado, Haddad, do PT, em segundo na corrida eleitoral, tem propostas mais evoluídas do ponto de vista humanitário e que “podia dar um passo para a frente ao Brasil”, tendo apenas contra o fato de estar “preso a uma imagem do PT, com problemas de corrupção”.

À pergunta sobre se o Brasil vai mudar, responde: “Eu já ando nessa esperança há algum tempo, mas ainda estou à espera de um país diferente, como os meus pais e avós desejaram”.

Voltar ao Brasil neste momento está fora de questão para Tiago. “Não me revejo no Brasil, atualmente, porque há a questão da violência. É muito difícil ter uma vida plena se a pessoa não pode andar nas ruas com calma, ter a sua família e os seus filhos”.

Empregada de mesa num restaurante da zona central da Costa de Caparica, Débora, abordada de vez em quando por brasileiros que ali param nas esplanadas ou que trabalham em restaurantes ao lado, ou por crianças que chegam da escola de mochila às costas, também coloca várias questões sobre Bolsonaro, o candidato no qual nunca votaria.

“Os candidatos (…) estão pensando mais neles do que no próprio brasileiro. Pelo que estamos vendo qualquer um que ganhar ali não está preparado para a situação que o Brasil está vivendo no momento. O Bolsonaro, por exemplo, quer armar o Brasil. Acha que da criminalidade que já está, mais armas é que vai resolver”, questiona, para logo de seguida dar a reposta: “claro que não”.

“O brasileiro tem sangue quente, então com uma arma na mão imagine quantas mortes à toa vai ter”, afirma.

Está indecisa em quem votar, mas tem uma certeza: “O Bolsonaro é que de jeito nenhum, não quero que o meu país vire um país de guerra igual a outros”.

Débora não quer voltar para o Brasil, mas quer lá ir de férias no próximo ano, para ver a família e, eventualmente, trazer alguns dos elementos mais novos para cá, para acabarem de se formar. “Quero que eles tenham uma nova vida, uma nova oportunidade”, diz.

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