“O Brasil pode ser o grande parceiro do nosso país”, avalia José Cesário

Por Igor Lopes
Do Rio para Mundo Lusíada

 

O Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, Jose Cesário, nas dependências do Consulado de Portugal no Rio de Janeiro. Foto Igor Lopes/Mundo Lusíada

 

No Rio e em São Paulo, o secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Cesário, não se esquivou das perguntas. Mostrou otimismo no futuro de Portugal e assumiu que medidas para conter a crise ainda vão perdurar. Na cidade maravilhosa, o secretário de Estado conversou com a nossa reportagem, no dia 6 de dezembro, num ambiente privado na sede do consulado-geral de Portugal, onde estava tendo lugar a primeira Mostra do Imobiliário Português. José Cesário falou sobre a aposta recente no setor das residências, assegurou que o Brasil deve ser visto como parceiro estratégico e adiantou que a crise fez Portugal mudar de estratégia em termos de promoção, tendo no fado, também, um dos alicerces portugueses para a recuperação econômica.

Sobre a comunidade, o Secretário afirmou que é necessário que os emigrantes mais antigos percebam a necessidade dos jovens estarem à frente das associações, sem se desligarem dela. Segundo ele, se os clubes portugueses conseguirem uma maior participação dos jovens luso-descendentes, vão continuar a ter sucesso e público.

Mundo Lusíada (ML): Qual é a sua impressão sobre a primeira Mostra do imobiliário português no Rio e em que esse evento pode ajudar realmente Portugal? Que vantagens essa Mostra traz para o carioca?

José Cesário (JC): A Mostra vem trazer aos cariocas algumas das melhores coisas que temos em Portugal. Essa iniciativa contribui para a imagem de um Portugal moderno, aquela imagem que queremos passar. O segundo aspecto é que esta Mostra, sendo feita por entidades de grande credibilidade, dá garantias às pessoas de que o que estão a comprar é efetivamente bom e que não tem riscos nenhuns. Não há riscos de as pessoas comprarem “gato por lebre”, como se diz em bom português, porque, infelizmente, no mercado imobiliário, houve muitas situações delicadas que queremos naturalmente esquecer. Temos produtos com qualidade e com condições excepcionais quer sob o ponto de vista financeiro quer sob o ponto de vista da segurança, da qualidade das infraestruturas.

ML: Por que a aposta no setor imobiliário? Há anos que Portugal aposta na gastronomia e no turismo…

JC: Temos tecnologias ligadas ao imobiliário que são das mais desenvolvidas que existem no mundo, além de capacidade em nível de engenheiros, dos nossos arquitetos, dos nossos técnicos de construção e de tudo aquilo que são materiais do ramo das construções. Esta aposta é estratégica. Se me perguntar se há outros setores, eu digo que há. A grande novidade que temos é que este tipo de iniciativas, que se viam exclusivamente em Portugal, agora se passaram a fazer no exterior. Hoje, no Rio. Daqui a alguns meses, em Paris. E por aí afora. Com certeza que poderão ter lugar em outras cidades.

ML: Tudo isso em prol da crise que estamos vivendo em Portugal?

JC: Em parte é, mas é bom dizer que isto deveria acontecer sempre. Temos um problema em Portugal que é antigo. As nossas empresas, durante muito tempo, se satisfaziam com seus clientes tradicionais e não precisavam fazer muito mais do que aquilo que era óbvio. Hoje é preciso pedalar mais. O mundo está mais competitivo, a economia está mais aberta e globalizada. É preciso ir ao encontro dos negócios. Isso acontece por causa da crise, mas não só por causa dela. O mundo em que estamos mudou completamente.

ML: Após conversar com algumas pessoas durante a Mostra, ouvi afirmações de que Portugal não teria vivido a chamada “bolha imobiliária”. Mas o que vemos hoje são muitos apartamentos e casas portuguesas por vender. Como avalia essa situação?

JC: Tivemos a nossa “bolha imobiliária”. Não vale a pena fugir a esta questão. Ela existe em algumas regiões do nosso país, não em todas, mas essa é uma realidade. Acho que a melhor forma de encararmos estas questões é falar com toda transparência e, exatamente, porque essa bolha surgiu, que temos anunciado produtos para colocar no mercado. Muitos empreendimentos foram construídos numa ótica de internacionalização da economia, mas para mercados habituais, e muitos destes mercados entraram em crise. Hoje há uma oferta diversificada.

ML: Tivemos na Mostra duas das principais instituições bancarias de Portugal. Que mensagem a presença desses bancos quer passar ao público?

JC: Elas dão a garantia daquilo que está à venda e dão a garantia de que a banca está disponível para financiar negócios.

ML: O governo português trabalha por detrás disso de alguma forma?

JC: No plano de resgate que foi negociado entre Portugal e a Troika, uma parcela significativa desse plano diz respeito à estabilização da banca portuguesa, que é muito segura. É das bancas mais confiáveis do mundo. Nos bancos de nível médio não tivemos problemas. É evidente que, confrontados com a crise global, e com dificuldades de financiamento, precisavam de financiamento e o Estado tem dado esse apoio através da ajuda internacional, direcionando parte dessa ajuda para a recuperação da banca portuguesa.

ML: Que Portugal novo e moderno o governo quer mostrar ao Brasil?

JC: É o Portugal das novas tecnologias, da excelência na formação, do turismo que disponibilizamos. É o Portugal do sucesso na diplomacia em nível internacional. É uma imagem diferente do Portugal tradicional, que queremos manter. Muito do nosso turismo deve-se ao fato de ter mantido características muito próprias das nossas regiões, como a questão gastronômica, etnográfica e etc. Portugal tem uma grande diversidade cultural, paisagística, geográfica, etnográfica. Não queremos que as pessoas deixem de conhecer esses aspectos, mas há outro Portugal que é igual a qualquer país do mundo mais desenvolvido.

ML: Não acha que Portugal poderia ter mostrado essa sua faceta moderna um pouco mais cedo?

JC: Há nove anos, quando andava nestas funções, eu já fazia esse discurso. Não pense que é novidade. A diferença que temos é que há muitas instituições em Portugal, públicas e privadas, que viviam muito viradas para dentro, para si próprias, que não precisavam procurar novos mercados. Mas hoje é preciso mostrar-se muito mais.

ML: As relações entre Brasil e Portugal estão mais intensificadas. Acha que o Brasil pode ser a “tábua de salvação” de Portugal?

JC: Não é. O Brasil é um parceiro importante, mas vamos ser claros, o trabalho que estamos a fazer em Portugal é um trabalho sério, que está a recuperar a credibilidade do país em nível internacional. Não colocamos de parte o sacrifício que as pessoas estão a fazer e que, infelizmente, deverão continuar a fazer por mais algum tempo. O trabalho que estamos a fazer é de credibilização do país e que aposta na diversificação dos parceiros. É evidente que o Brasil e os outros países da lusofonia são decisivos, mas não podemos esquecer dos nossos parceiros europeus. E não podemos esquecer de outros parceiros, uns mais antigos e outros mais recentes. E Portugal tem sabido encontrar novos parceiros. Estamos a captar mais investimentos estrangeiros. Estamos a vender mais do que vendíamos, porque as pessoas confiam em nós e o Brasil pode ser o grande parceiro do nosso país.

ML: Como Secretário de Estado das Comunidades tem a oportunidade de andar por várias regiões, conhecer vários povos, inclusive portugueses que estão integrados nas sociedades dos países onde moram. Qual é a sua percepção sobre a opinião dos portugueses em relação a Portugal. O que essas pessoas sentem?

JC: Com alguma tristeza. Mas os portugueses têm um sentimento de apoio. As remessas financeiras para Portugal estão a aumentar. Há mais pessoas a visitar Portugal. Mais pessoas levam amigos para Portugal. Mais pessoas compram em Portugal. E eu acho que isto é extraordinário e deve-se muito ao enorme sentido de solidariedade das nossas comunidades, hoje e no passado.

ML: O fado é uma das grandes marcas portuguesas. Como vê esse estilo musical no Brasil, sendo que há muitos anos não tínhamos shows de fado no Rio, como tivemos o de Marisa, além da presença de Carminho, Ana Moura e Antônio Zambuja?

JC: O fado ganhou uma dimensão internacional completamente diferente no momento em que adquiriu o estatuto de Patrimônio Imaterial da Humanidade. O fado faz parte da nossa cultura há muitos anos, praticamente desde o século XVIII. Mas esse estilo musical está a surgir com uma força impressionante, e é um aspecto decisivo também para a internacionalização da nossa economia, porque não há economia sem cultura. O fado é determinante. Vale a pena que o fado seja utilizado e que acompanhe este trabalho de promoção econômica. As nossas comunidades, que valorizam tanto essa expressão musical, também sabem que essa é uma forma natural de as aproximar de Portugal.

ML: Alguns cantores portugueses como Rui Veloso ainda não chagaram ao mercado musical brasileiro com tanta força quanto o fado. Acredita que é uma questão de “solidariedade” brasileira começar a apadrinhar um pouco o fado?

JC: Sabe que o lançamento de um artista pressupõe um trabalho grande no domínio da imagem. Hoje, se calhar, é mais fácil de se promover o fado. Não há duvida nenhuma. Mas há espaço natural para todas as formas de expressão. Não estamos sabendo atuar de forma articulada. Se o fizermos, vamos conseguir valorizar mais o que temos. O que é verdade é que a música brasileira está na moda em muitos locais. Também é verdade que o fado está. No passado, o grupo “Madredeus” fez sucesso. Há aqui um fenômeno de promoções. Há aspectos em que eu não posso intervir, como os aspectos comerciais. Mas vale a pena investirmos não só na musica ligeira ou música erudita, mas em outras áreas de expressão cultural, como as artes-plásticas, culturas, temos grandes artistas que conseguem transmitir uma imagem nova e moderna de Portugal. O Instituto Camões vai apoiando algumas áreas de expressão. Tem de haver envolvimento da sociedade civil e da comunidade luso-brasileira. A grande questão é essa. Temos milhões de pessoas no Brasil que têm origem portuguesa e o trabalho com essas pessoas é decisivo para a promoção dessa imagem de Portugal. Isso acontece também em outros países.

ML: Para finalizar, quais sãos seus desejos para 2013 em relação a Portugal e aos luso-descendentes? Que mensagem deixaria para os cariocas?

JC: Desejo que o próximo ano seja melhor do que o anterior para cada um de nós. Que consigamos contribuir para que os outros sejam um pouco mais felizes do que foram e que as pessoas sejam corretas nas suas atitudes. Espero que Portugal consiga prosperar mais do que o que temos prosperado. Espero que as comunidades continuem a manter essa relação com Portugal e que consigamos dar mais alguns sinais de aproximação.

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