Da Redação com Lusa
A vereadora da Habitação na Câmara de Lisboa, Filipa Roseta, admitiu neste dia 26 que a imigração, em particular de quem tem poder de compra acima das famílias portuguesas, criou uma “pressão brutal” na capital portuguesa.
A “imigração duplicou desde 2018 no país” e essa afluência de estrangeiros “está fundamentalmente concentrada em Lisboa”, admitiu a vereadora social-democrata, salientando que o acesso à habitação na capital é dificultado pela “pressão maior das transações que se fazem”, principalmente por “estrangeiros com poder econômico muito superior a quem cá está”.
“Isto está a empurrar as famílias para fora do mercado” e “temos de ter políticas de habitação fortes para aguentar, seja no apoio à renda” ou na cedência de fogos municipais, uma prioridade do executivo, que tem como meta colocar nove mil casas no mercado na próxima década, afirmou.
Filipa Roseta falava durante o segundo debate da Assembleia Municipal subordinado ao tema “Imigração em Lisboa: que futuro?”.
Afirmando que, “entre 2022 e 2023, a população imigrante aumentou 37%, o que corresponde a 30% da população total residente na cidade”, a autarca reafirmou o desejo de manter a capital como uma “cidade global, multicultural e diversa”.
“Quem diga o contrário está a destruir o nosso ADN” e a “ser ignorante”, disse Filipa Roseta, prometendo: “vamos continuar a ser o que somos, não vamos ser diferentes”.
No financiamento às associações que apoiam os imigrantes, Filipa Roseta destacou as novas políticas de apoio de longa duração, com prazos até seis anos.
Segundo a vereadora, a partir de agora, essas associações vão ter “uma estabilidade de financiamento previsível”, uma solução que vai ajudar a cumprir a estratégia municipal de “erradicar a pobreza, promover a educação de qualidade e ter territórios e comunidades mais sustentáveis”.
Nos bairros municipais, que têm 66 mil residentes, apenas 3.700 são imigrantes (a maior parte de Cabo Verde), mas tem havido uma estratégia de reforço dos apoios e o “departamento do projeto de intervenção comunitária triplicou o número de ações e projetos comunitários”, numa lógica de “política de reconhecimento da diversidade cultural dos bairros”.
Na Assembleia Municipal participou também António Vitorino, antigo diretor da Organização Internacional das Migrações e atual dirigente do Conselho Nacional para as Migrações e Asilo, que defendeu que “os desafios de integração são micro, jogam-se ao nível do local de residência” e do ensino da língua de acolhimento.
Lembrando que os dados mais recentes apontam para 1,044 milhões de imigrantes no mundo, António Vitorino disse que Portugal está “em linha com o resto da Europa, com 10 a 12%” de estrangeiros no total da população.
Contudo, frisou que a pressão migratória é particularmente sensível nalguns locais, como é o caso de Lisboa, e defendeu que os “recursos públicos e os esforços das autoridades têm de ser sensíveis a esta diferente repartição dos imigrantes”.
“Os imigrantes vieram para trabalhar”, disse, salientando que, para o país, e “numa visão mercantilista”, os estrangeiros “são um negócio lucrativo”, porque contribuem cinco vezes mais do que retiram do estado social e executam trabalhos que os nacionais não querem.
“Se houver aqui portugueses candidatos a recolher frutos vermelhos em Odemira, inscrevam-se na fila”, ironizou o antigo ministro socialista, recordando que há setores, como a agricultura, construção ou restauração, em que os estrangeiros representam mais de um quarto da força de trabalho.
António Vitorino considerou ainda que “muitos dos problemas de estigmatização resultam de desigualdades sociais em que os imigrantes são apresentados como problemas” e essas desigualdades “geram o sentimento de angústia” e de medo por parte dos cidadãos nacionais, com “medo do que desconhecem”.
A luta contra a discriminação é “um combate cultural, mas também é um combate pela coesão da sociedade portuguesa”, afirmou, admitindo que há “áreas particularmente sensíveis” como a saúde ou habitação.
Presente no debate, a presidente da Casa do Brasil de Lisboa, Cyntia de Paula, criticou algumas juntas de freguesia, entre as quais a de Arroios, por, segundo disse, dificultarem os atestados de residência para estrangeiros e defendeu políticas mais globais de integração dos imigrantes.
No capítulo da habitação, a dirigente destacou as “dificuldades no acesso ao arrendamento” e defendeu que o poder político deve ter uma estratégia para combater a discriminação atual.
Quanto ao trabalho das associações de apoios aos imigrantes, Cyntia de Paula destacou o papel muitas vezes esquecido e deu o exemplo dos estrangeiros que estão acampados junto à Igreja dos Anjos.
“Se não fossem as associações, a situação ainda seria pior”, afirmou.
Filipa Louro, do Serviço Jesuíta aos Refugiados, recordou que os imigrantes são contribuintes líquidos e não têm acesso a apoios antes de terem cumprido o seu processo de regularização.
Hoje em dia, “até para ter o número de segurança social não é fácil”, o que “parece ser parte de uma política de limitar o acesso aos apoios sociais” para os imigrantes, afirmou.
Esta foi a segunda sessão temática da Assembleia Municipal subordinada ao tema da imigração, um pedido feito pelo grupo parlamentar do PAN.
questão de Polícia
Em nota também neste dia 26, a Casa do Brasil “manifesta a sua total e absoluta oposição à criação da Unidade de Estrangeiros e Fronteiras”, hoje aprovada em Conselho de Ministros, e cuja função passa pelo controle das fronteiras aéreas, fiscalização de imigração e afastamento e retorno de cidadãos em situação ilegal.
“Tal medida representa um inequívoco retrocesso nas políticas de imigração e integração de pessoas imigrantes em Portugal”, refere a associação.
Na opinião da Casa do Brasil de Lisboa, a imigração não pode ser uma questão de polícia e salienta que “a criação de um órgão que coloca sob vigilância as pessoas imigrantes (…), reforça perigosamente uma falsa associação entre imigração e segurança pública”.
“É preciso garantir o pleno funcionamento da AIMA [Agência para a Integração, Migrações e Asilo], a resolução célere dos processos pendentes e o reforço do estado social”, defende a Casa do Brasil.
Acrescenta que é preciso garantir “condições condignas para todas as pessoas imigrantes e população” e apela à sociedade civil e às autoridades competentes para que assumam uma posição pública “contra medidas que atentam contra os direitos e a dignidade das pessoas imigrantes”.