Judiciário, Ministério Público e Advocacia

A Constituição Cidadã de Ulisses Guimarães e Bernardo Cabral, conformada para reger um país parlamentarista, hospedou, em Plenário, uma República Presidencialista. Tal mudança, na undécima hora, não eliminou mecanismos de equilíbrio próprios do modelo parlamentar, com o que, nada obstante sua adiposidade, preservou o princípio graficamente enunciado no artigo 2º, de que os Poderes são harmônicos e independentes.
Assim é que ao Poder Judiciário, pela sua Corte Suprema, foi atribuída a função de guardião da Carta Magna (art. 102), não podendo nem mesmo nas ações diretas de inconstitucionalidade por omissão do Legislativo, invadir a competência normativa deste (art. 103, § 2º). Ao Poder Legislativo impôs que zelasse por sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes (art. 49, inciso XI), ao Poder Executivo outorgou, excepcionalmente, competência para legislar por Medidas Provisórias e Leis Delegadas (art. 62 e 69), sempre sujeitas ao aval das Casas das Leis e, no caso de conflito entre Poderes, às Forças Armadas determinou o dever de repor a lei e a ordem (art. 142).
Por fim, quanto ao Poder Judiciário (arts. 92 a 126) admitiu que fosse secundado por duas instituições consideradas essenciais à Administração da Justiça: o Ministério Público e a Advocacia (arts. 127 a 135).
O constituinte não tornou as duas instituições “poderes”, MAS FUNÇÕES ESSENCIAIS À JUSTIÇA, em idêntico patamar. Embora nivelados pelo constituinte, creio que, numa democracia, exerce, o advogado, função relevantíssima, pois garante o direito à ampla defesa, direito este inexistente ou reduzido à sua expressão quase nenhuma nas ditaduras.
A estabilidade e a segurança dos cidadãos, portanto, estão no equilíbrio dos Poderes e na ação de busca de um ideal de justiça, em que Advocacia e Ministério Público procuram a verdade material dos conflitos, subordinando-a ao crivo imparcial do Poder Judiciário.
Infelizmente, o texto constitucional não tem sido respeitado como deveria ser, havendo inúmeras ações não admitidas pelo Constituinte, que tem gerado crescente insegurança jurídica, nas relações entre cidadãos e nas destes com o Estado.
Algumas vezes, o Supremo tem invadido competências do Poder Legislativo – como ocorreu ao admitir que candidato derrotado assumisse governo, quando afastados governador e vice eleitos, sem respeito ao art. 81 da Lei Suprema; ao exigir fidelidade partidária, sem respeito ao art. 17 da Constituição; ao criar terceira hipótese de aborto (eugênico) no artigo 128 do C.P.; ao permitir casamento entre pares de mesmo sexo, em descumprimento ao art. 226 §§ 1º e 5º da Carta Maior; ao adotar prisão de deputados e senadores, sem autorização do Senado e Câmara, em violação aos arts. 53, §§ 2º, 3º e 5º do texto maior; ao considerar culpado condenado em 2ª. Instância, contra o inciso LVII do art. 5º e, em diversas outras hipóteses. A Corte Máxima passou a entender que lhe cabe legislar no vácuo legislativo.
Por outro lado, o Ministério Público, que não é poder, invade competências do Poder Judiciário ao pretender, mediante Resolução do antigo Procurador-Geral, transformar-se em polícia judiciária e adotar medidas próprias de Poder Judiciário – que não é – transformando o Poder Judiciário EM MERO PODER HOMOLOGATÓRIO DE SUAS DECISÕES PERSECUTÓRIAS.
Alguns dos membros do Ministério Público, com vocação cinematográfica, pretendem que o Congresso se curve a medidas que visam tornar suas funções mais relevantes que as do Judiciário, permitindo-lhes, sem autorização judicial, prender suspeitos, invadir escritórios de advocacia – quebrando a inviolabilidade constitucional de outra instituição de função idêntica a sua (Advocacia) -, obter ilicitamente provas e atuar com interpretações “pro domo sua”, mesmo que desavisadas e injurídicas. Pretendem impor ao Congresso Nacional, que abertamente criticam, sua forma autoritária de combate à corrupção.
À evidência, todo o verdadeiro cidadão deseja o combate à corrupção, MAS QUE SE FAÇA DENTRO DA LEI E NÃO PELO ARBÍTRIO DE AUTO OUTORGADOS DEFENSORES DA MORALIDADE.
Muito embora, o mérito da Operação Lava Jato esteja permitindo ao brasileiro melhor decidir como votar nas próximas eleições, a democracia não admite o arbítrio, nem salvadores da pátria.
Exemplo desta espetacularização, tivemos com as duas denúncias contra o Presidente da República, oferecidas pelo antigo Procurador-Geral da República. No momento em que o país saia da crise, nada obstante a impopularidade presidencial, com baixa inflação, retomada do crescimento, fim da recessão, juros em queda livre, reforma trabalhista, teto para despesas públicas, abertura da exploração de petróleo, recuperação da Petrobrás etc., as duas mal elaboradas e rejeitadas denúncias prejudicaram imensamente o país, que necessita de novo inserir-se no mundo globalizado assumindo posição competitiva, depois de ter de lá sido retirado por 13 anos de desestruturação econômica dos governos anteriores.

 

Dr. Ives Gandra Martins
Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU, UNIFIEO, UNIP e das Escolas de Comando e Estado Maior do Exército-ECEME e Superior de Serra-ESG, Presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio e do Centro de Extensão Universitária – CEU – [email protected]  e escreve quinzenalmente para o Jornal Mundo Lusíada.

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