Por IVES GANDRA DA SILVA MARTINS
A profunda crise que o Brasil atravessa colocou todos os holofotes sobre o Poder Judiciário. Esse movimento, impulsionado pela imprensa livre e pela liberdade de expressão dos cidadãos, aponta para o mesmo caminho indicado pela Constituição Federal, como princípio fundamental em seu art. 2º, de que “são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. ”
A ordem estabelecida não é aleatória, sendo o Judiciário, verdadeiramente, a derradeira e necessária instância de proteção da sociedade em uma democracia. Portanto, não é por acaso, que o Poder Judiciário emite decisões exclusivamente jurídicas, apesar de inegáveis consequências políticas, o que nos conduz para a falsa e perigosa tentação de fazer “justiça” ao invés de aplicar o direito.
Sempre que o Poder Judiciário se distanciar do direito, todos nós perderemos nossa rota em busca da segurança jurídica e de uma sociedade menos desigual. No Brasil, o direito é resultado de um ordenamento jurídico posto, leis escritas pelo Poder Legislativo que traduzem a vontade do Povo que elegeu seus representantes para essa finalidade, em especial, para a Assembleia Nacional Constituinte que promulgou a Constituição Federal, adotando o regime federativo e estabelecendo competências claras para cada Poder exercer a sua função rigorosamente delimitada.
Ora, a invasão de competências perpetradas por Poderes da República, nas atribuições de outros Poderes é, portanto, fato indesejável e gravíssimo. O Legislativo não governa, o Executivo não julga e o Judiciário não legisla, pois assim ficou estabelecido na Carta da República.
A fim de garantir que harmonia e independência sejam asseguradas, o constituinte tornou o Supremo Tribunal Federal o guardião da Constituição, mas proibiu-o de legislar, como se pode ler no artigo 103, § 2º da CF, pois, nem nas ações de inconstitucionalidade por omissão, pode a Máxima Corte substituir o Congresso Nacional.
Por ser um Poder técnico, os membros do STF são escolhidos por um homem só, o Presidente da República, e não por 140 milhões de eleitores. O STF é, assim, um legislador negativo, ou seja, não dá curso a leis inconstitucionais.
Por outro lado, o Poder Legislativo não pode tolerar qualquer invasão em sua competência normativa, praticada pelos Poderes Judiciário ou Executivo, com base no inciso XI do artigo 49, pois deve zelar para que suas atribuições legislativas sejam apenas por ele exercidas.
Nem mesmo a inegável e aguda crise de legitimidade que recai sobre o Legislativo, e que evidentemente precisa ser solucionada, poderia justificar a usurpação da competência constitucional de tal Poder.
O Poder Executivo, fora as hipóteses dos artigos 62 e 68 da CF (Medida Provisória e Lei Delegada), não pode assumir competência normativa. Urge que sejam, pois, evitadas tais invasões indesejadas e indevidas, que geram o conflito entre Poderes da República, a fim de afastar consequências nefastas que deles podem advir para repor a lei e a ordem, ainda que no estrito âmbito das previsões constitucionais.
A insatisfação com os rumos do País não autoriza o descumprimento da Lei e da Constituição Federal, tampouco autoriza definir novas regras a não ser pelo processo legislativo articulado pelos representantes eleitos pelo Povo.
Devemos, pois, ouvir o verdadeiro apelo popular que clama por segurança jurídica e respeito à Lei, porque enfraquecer as Instituições da República e seus membros é um desserviço para a sociedade brasileira que somente poderá retomar o seu rumo com os Poderes da República independentes e harmônicos entre si, com o que sairia fortalecida a Democracia.
Por IVES GANDRA DA SILVA MARTINS
Presidente do Colégio dos Ex-Presidentes do IASP- INSTITUTO DOS ADVOGADOS DE SÃO PAULO e
JOSE HORACIO HALFELD REZENDE RIBEIRO – Presidente do IASP.
Assinam também o presente os ex-Presidentes do IASP: EDUARDO CARVALHO TESS, RUI CELSO REALI FRAGOSO, MARIA ODETE DUQUE BERTASI e IVETTE SENISE FERREIRA.