A LEI DE REPATRIAÇÃO

A Lei nº 13.254/16, que, na linha adotada pela maioria dos países desenvolvidos, permite a legalização de recursos mantidos no exterior não decorrentes de corrupção, narcotráfico ou terrorismo, apesar de mal redigida e pior esclarecida em instruções normativas, é plenamente justificável, não se compreendendo a crítica que se tem feito a esta possibilidade de regularizar patrimônio no exterior.
Em artigo que escrevi para a Folha sobre a má qualidade do texto legislativo e a canhestra solução punitiva (A POLÊMICA DE UM PROJETO NECESSÁRIO, Jornal Folha de S. Paulo – 17/08/2014 – Opinião) defendi que um projeto dessa natureza era necessário. À época, Everardo Maciel, Luiz Schoueri, Rogério Gandra Martins e eu mesmo defendíamos um projeto de extinção de qualquer punibilidade, desde que se pagasse o imposto de renda com multa moratória, no mesmo padrão permitido a qualquer contribuinte brasileiro em atraso. O acréscimo no montante a ser arrecadado seria em torno de 3%. Ninguém poderia contestar. Criou-se, todavia, uma redução do I.R. e uma multa sem natureza definida, que tem gerado críticas.
A principal delas é que não é justo beneficiar sonegadores. Vem principalmente de servidores dos três Poderes, em um país onde a burocracia não cabe no PIB e que continua obtendo benesses e aumentos de vencimentos, enquanto os cidadãos não governamentais amargam um desemprego de 11 milhões e 400 mil desempregados. Por isto os 36% de carga tributária em relação ao PIB são insuficientes para sustentá-los, lembrando-se que, por levantamento da OCDE de 2012, nossa carga era superior a dos Estados Unidos e Coréia (24%), Japão e Suíça (29 e 28%) e China e México abaixo de 24%. O Brasil é formado por cidadãos de primeira e segunda categoria. Os que têm segurança absoluta no emprego e podem usufruir de benesses, mordomias e aposentadorias especiais e aqueles que não têm maior segurança para o futuro, sendo o déficit orçamentário da aposentadoria de mais de 25 milhões de brasileiros, menor que aquele de pouco mais de 1 milhão de servidores.
Por outro lado, grande parte dos recursos enviados para fora o foi para assegurar patrimônio, em tempo de instabilidade política e, à maneira das concessões de outros países, estão retornando com benefícios para que gerem receitas públicas e recursos destinados a retirar o país da crise.
Acresce-se que aqueles que contestam sua concessão, teriam que contestar todas as anistias e remissões concedidas, sistematicamente, no país, nos últimos 50 anos, por todas as entidades federativas. De rigor, a indecente carga tributária brasileira obriga os governos, de tempos em tempos, a conceder tais anistias e remissões para permitir que o país sobreviva economicamente e também para irrigar as combalidas burras oficiais, dirigidas por uma burocracia esclerosada.
A lei de repatriação é, portanto, mais uma concessão, nos moldes das que já presenciei, continuamente, nestes 59 anos de advocacia. Apesar de considerar mal elaboradas e confusas a lei de repatriação e as desorientadoras Instruções Normativas, considero que os contribuintes enquadrados nas hipóteses nelas mencionadas, devem acatar a proposta governamental, pois, a partir de 2018, não haverá mais sigilo possível, no sistema financeiro mundial, razão que levou, em outros países, à adesão às repatriações, com base em leis muito mais claras e adequadas.
Espero, todavia, que o governo melhore a qualidade da legislação e aumente a potencialidade da receita, determinando que apenas o patrimônio existente no dia 31/12/2014 seja objeto de imposto e multa.

 

 

Dr. Ives Gandra Martins
Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU, UNIFIEO, UNIP e das Escolas de Comando e Estado Maior do Exército-ECEME e Superior de Serra-ESG, Presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio e do Centro de Extensão Universitária – CEU – [email protected]  e escreve quinzenalmente para o Jornal Mundo Lusíada.

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