Listas das Empreiteiras medem coragem da Lava Jato frente poderosos setores

Se a prisão de Eduardo Cunha (PMDB/RJ), ex-presidente da Câmara Federal, por mentir sobre a existência no exterior de contas pessoais e familiares alimentadas por corrupção deixou na semana passada o governo preocupado, esta semana o fantasma das planilhas das empreiteiras ampliaram a tensão no Planalto, que vive um permanente inferno astral.

Eduardo Cunha foi um instrumento extremamente importante, tendo em vista seu conhecimento dos ritos, dos regimentos parlamentares e também da grande liderança, do grande domínio sobre os colegas, para a execução de ‘pautas bomba’, que travaram desde o início de 2015 as ações do governo de então, assim como para facilitar os trâmites do impeachment, apoiado por poderosos setores da economia, entre eles, a grande mídia comercial, que durante bom tempo promoveu a imagem de Cunha, gerando inclusive em manifestações nas ruas muitas faixas com a frase “Somos Milhões de Cunhas”, dada sua determinação em derrubar a presidenta, ‘desidratada’ ao assumir a reeleição.

Mas, apesar do forte aparato de defesa pelos seus pares – um bom percentual de deputados, diga-se –, a veemência dos fatos e o cruzamento de dados impediu sua salvação por mais tempo. Mesmo porque, dentro do grande objetivo que passou a ser traçado pelos interesses das minorias privilegiadas a partir de 2015, quando não conseguiram impedir a vitória de Dilma nas urnas, o papel de Cunha já havia sido cumprido, ou seja, colocou Temer, vice-presidente da República, líder do ‘aliado’ PMDB, na cadeira do Palácio do Planalto. Daí, este acelerou com certeza e sem pudor, sem aguardar os resultados jurídicos da análise do impeachment, uma total reforma governamental. E foram pagando algumas contas. Em Julho, Temer e os congressistas permitiram ao judiciário reajuste de até 41,47% nos salários dos servidores, sendo que cargos em comissão receberão reajuste de até 25% e técnicos judiciários com nível superior receberão adicional de qualificação. Dilma havia oferecido 21,3% ao judiciário (G1, 20/07/2016). Também a grande mídia comercial registrou elevação de repasses governamentais no período, conforme dados da SECOM – Secretaria de Comunicação Social. Entre junho e julho os gastos com internet foram cortados, com queda de 64%, elevando-se pontualmente às vésperas da eleição em contas pessoais de Facebook e Twitter. No entanto, com a mídia impressa, reino dos conservadores, no acumulado, de maio a agosto, os gastos subiram 934%! Entre outros acertos.

Como se vê, não há ‘crise fiscal’ para quem apoiou as mudanças. Concomitantemente, no mês de setembro, o governo federal arrecadou R$ 94,770 bilhões em impostos, uma queda real de 8,27% em comparação com o mesmo mês do ano passado, descontada a inflação pelo IPCA – Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo. A diminuição na arrecadação de tributos com o aumento de gastos obrigatórios fez o Governo Central – Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central – ter o maior déficit primário para o mês de setembro na história, com diferença de R$ 25,3 bi. Em outubro, o Índice de Confiança do Empresário Industrial (ICEI/CNI) teve queda de 1,4 ponto em relação a setembro. A confiança caiu em empresas de todos os tamanhos, com redução mais acentuada entre as pequenas e médias indústrias. E o desemprego atingiu a marca de 12 milhões no 3º tri/ 2016, crescendo 3,8% em relação do tri anterior (IBGE/PNAD). Uma economia em recessão.

Enquanto isso, a Lava Jato na sua missão em captura de corruptos, sofre pressão da opinião pública para que continue a saga, apesar de agora surgirem pedidos de maior leveza nas ações, de reclamações de excesso nas delações premiadas, na grande mídia e entre personalidades políticas e jurídicas. Assim, com o objeto petista já tendo sido profundamente esmiuçado, revirado e banalizado, as temíveis listas das empreiteiras e as denuncias a partir de seus diretores, colocam em xeque os novos governantes e boa parte dos congressistas. Coisa, aliás, já esquadrinhada pelos áudios de Sérgio Machado (ex-diretor Transpetro) capturados ocultamente com Romero Jucá – que afirmou: “Temer é Cunha” – e Renan Calheiros, falando no esquema para derrubada de Dilma e apaziguamento de interesses dos poderosos, que Sérgio Moro e parceiros não quiseram utilizar ( http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/05/1774018-em-dialogos-gravados-juca-fala-em-pacto-para-deter-avanco-da-lava-jato.shtml e http://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/leia-os-dialogos-de-sergio-machado-com-renan-calheiros/ ) . E, sem perder o fio da meada, apenas para agregar: outubro de 1996, o jornalista Paulo Francis já denunciava roubo na Petrobrás, que não deu em nada como investigação e sobrou apenas um processo contra ele movido pela diretoria da empresa ( http://www.jb.com.br/opiniao/noticias/2015/04/23/paulo-francis-tinha-razao-e-agora/?from_rss=rio ). Enfim, voltando ao dia de hoje, entre empreiteiras, só a Odebrecht tem 50 executivos para depor. Imagine o tamanho do impacto. Em 28 de outubro, os jornais já publicavam: o chanceler brasileiro José Serra (PSDB/SP) está nas listas, acusado de ter recebido R$ 23 milhões como caixa 2 em conta secreta na Suíça, 2010. Deve ser denunciado pela procuradoria-geral da República em breve. Conforme a imprensa, Michel Temer e ministros como Eliseu Padilha, da Casa Civil, também devem figurar entre os acusados. Segundo O Globo e El País haveria a identificação de ilustres 130 deputados, senadores e ministros, além de 20 governadores e ex-governadores de diversos partidos. Sem contar o que o próprio Cunha ameaça revelar, conforme seus princípios e cálculos. Vamos ver a coragem do judiciário daqui adiante.

O curioso é que não se ouvem indignados baterem panelas e gritarem vitupérios. Exemplos como os áudios de Sérgio Machado e as listas das empreiteiras provam como a hipocrisia é dominante dentro de uma sociedade desigual e um sistema político corrompido por interesses mesquinhos. São Paulo, 28 de outubro de 2016.

 

Prof. José de Almeida Amaral Júnior
Professor universitário em Ciências Sociais; Economista, pós-graduado em Sociologia e mestre em Políticas de Educação; Colunista do Jornal Mundo Lusíada On Line, do Jornal Cantareira e da Rádio 9 de Julho AM 1600 Khz de São Paulo

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