Revisitar Pessoa

O Brasil acolhe hoje, um número crescente de portugueses que, desiludidos de um país exangue e de uma Europa à deriva, procura no mundo, quase às cegas, um canto para viver.

Curioso que que são o Brasil e Angola, os dois países lusófonos que mais portugueses receberam e ainda recebem. Da mesma forma que, durante muitos anos, comunidades africanas e brasileiras, encontraram abrigo em Portugal.

É aqui, neste gesto que se aplica a célebre frase de Bernardo Soares, heterônimo do grande Fernando Pessoa: «A minha Pátria é a língua portuguesa». Quando Pessoa diz que a sua “Pátria é a Língua Portuguesa” está nitidamente a definir as fronteiras daquilo que para si é o 5º Império. E o Império existia. Mas se o Império Pátrio se esboroou, o “Império” da Língua é bem real e têm sido dados alguns passos bem concretos para a sua consolidação, na política, no desporto, na crescente participação cívica, etc.

Uma maior consciencialização do devir da Língua Portuguesa, decerto, trará novos equilíbrios ao mundo, tal como aconteceu com todo o movimento de expansão ultramarina que se iniciou no século XV.

Há quem diga que a história não se repete, mas nem sempre é assim. Diz o povo, e com razão que a necessidade aguça o engenho. É disso que Portugal precisa. Com a Europa à deriva, exausta perante a necessidade de conter a dívida soberana e promover o crescimento, está a entregar-se, vertiginosamente, nas mãos dos especuladores financeiros e dos chamados «mercados».

Longe vai o tempo em que políticos com «terapio», para utilizar uma linguagem tauromáquica, tinham peso específico na política europeia e colocavam o primado da política à frente da ditadura da economia. Estou-me a lembrar de Mitterrand, Helmut Schmidt, Mário Soares,  Oloff  Palm e outros.

Hoje, estamos entregues aos tecnocratas, alguns deles nem eleitos, e o resultado é o que se sabe.

Mas não foi o passado que aqui me trouxe. Os países da periferia do sul da Europa, são os mais causticados com a crise da dívida soberana. Os povos de Portugal, da Grécia, da Espanha, mas com os da Itália, Irlanda e Bélgica, na fila, não vêm a tal luz ao fundo túnel e não têm saída aparente.

Ora nós, portugueses, se calhar temos saída. Temos é que mudar de paradigma. É certo e sabido que, se calhar, a Europa não nos quer na moeda única, como não quer a Grécia também. Então, e se nós virássemos as costa a esta Europa depauperada e egoísta?

Como? Virando-nos para esse potencial imenso que é a CPLP, os países que falam português e que deveriam, todos eles, serem a nossa Pátria, como dizia e queria Pessoa.

Não é fácil. Mas, se não metermos mãos à obra é que é impossível. Angola e Brasil, são dois imensos países com uma economia florescente. Poderiam ser eles, o motor dessa nova comunidade. Portugal tem linhas abertas com África, não só a lusófona, como a subsaariana. Tem boas relações com a China. O Brasil tem a porta aberta para as américas e todas estas sinergias, poderiam ser postas ao serviço de uma economia global e política. São muitos milhões a falar a mesma língua, com interesses econômicos e políticos comuns e de onde todos poderíamos tirar vantagens.

Claro que não é uma solução para hoje. Mas o simples fato de começarmos a falar nisto, talvez, desde já, comece a tirar o sono a alguém.

 

Por Helder Freire
Jornalista em Portugal

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