Os portugueses devem estar atentos

Todos os portugueses, mesmo os menos atentos, recordam bem as inoportunas e infelizes palavras do Presidente Cavaco Silva no discurso que pronunciou aquando da sua segunda tomada de posse, e sabem que as mesmas revestiram uma dureza verdadeiramente inusitada na convivência política do Presidente da República com o Primeiro-Ministro, José Sócrates, bem como com o seu Governo. Como então se viu, PSD e CDS aplaudiram vigorosamente, com os restantes entre a circunstância e uma terrível dor de cabeça.
Ora, nada de minimamente semelhante voltou até hoje a ter lugar. É verdade que o Presidente Cavaco Silva se referiu ao problema da equidade fiscal, e até à possível ultrapassagem to tal limite que referira naquele seu infeliz e inoportuno discurso, mas só o fez depois de muito instado pelos jornalistas. E também porque, no entretanto, o tal limite havia ultrapassado completamente quanto se poderia imaginar. Ainda assim, limitou-se a formular uma interrogação.
Ora bem, desde então o desastre social atingiu em cheio a generalidade dos portugueses, e sempre perante o silêncio do Presidente Cavaco Silva. Verdadeiros anos-luz, ou talvez parsecs, do que havia tido lugar com o Governo de José Sócrates. Simplesmente, nestes últimos tempos, o Presidente Cavaco Silva teve o seu pior momento de sempre na vida política, ao surgir com aquelas suas palavras ao redor do seu salário.
São já hoje conhecidas as reações que tal intervenção teve por todo o nosso tecido social, sendo difícil encontrar alguém que não tenha criticado tal intervenção. De molde que o Presidente Cavaco Silva terá percebido o mesmo que eu, ou seja, que a sua imagem está já irreversivelmente marcada por este inimaginável episódio, para mais acompanhado desta realidade hoje evidente: com a sua presença como Presidente da República os portugueses atingiram o mais baixo nível de vida desde a Revolução de 25 de Abril, ao mesmo tempo que viram destruir por este Governo, de parceria com a patética ação política do PS de António José Seguro, toda a estrutura do Estado Social que levara os portugueses a padrões de qualidade global de vida inquestionavelmente avançados.
Convém, porém, ter presente que aquelas palavras do Presidente Cavaco Silva constituíram um apoio à política deste Governo, porque as mesmas, de facto, pretendiam mostrar aos portugueses que até ele próprio, o Presidente da República, atravessava dificuldades. De resto, o único número ali explicitado pelo Presidente Cavaco Silva foi o dos mil e trezentos euros – o que ficou no ouvido dos portugueses –, porque do restante, como muitos esperariam, ninguém iria tratar. Simplesmente, não foi assim.
De tudo isto resultou a tal terrível imagem do Presidente Cavaco Silva que referi atrás, que estimo hoje ser completamente irreversível. E a razão é simples de perceber: a vida da esmagadora maioria dos portugueses irá continuar a agravar-se, e tal terá lugar com o continuado silêncio do Presidente Cavaco Silva. Ou seja, numa situação social incomensuravelmente mais grave que a do tempo do Governo de José Sócrates, o som das palavras do Presidente da República funcionou de um modo diametralmente inverso.
É neste contexto que se tem de entender a catadupa de notícias postas recentemente a circular, no sentido de que existiria uma oposição fortíssima entre o Presidente da República e o Governo. Claro que do Presidente da República ninguém ouviu qualquer manifestação que mostre ser verdadeira tal catadupa noticiosa. Ora, é isto que conta, como no-lo ensinou S. Tomé: ver – ou ouvir – para crer. Ou seja, não temos, de facto, qualquer indicador de que o Presidente Cavaco Silva esteja em desacordo com a política do Governo atual. Pois se estivesse, não teria explicado aos portugueses aquela sua reforma dos mil e trezentos euros, por via da sua função de docente universitário. Tais palavras, se vistas com um ínfimo de atenção, serviam, apenas para mostrar aos portugueses que deviam ter poupado a tempo e horas e que mesmo o Presidente Cavaco Silva tinha limitações para fazer frente às suas necessidades.
Quase com toda a certeza, estas notícias, sem conformidade ínfima com quaisquer declarações públicas do Presidente da República face à política deste Governo, correm o risco de serem lidas em favor da sua imagem, quando a mesma se encontra gravemente atingida por via daquelas palavras inesquecíveis Ou seja, os portugueses devem estar atentos, evitando dar crédito às notícias surgidas na comunicação social, invocando posições do Presidente Cavaco Silva, e de gente que lhe é próxima, porque nós nunca ouvimos uma qualquer declaração antagónica com a política deste Governo.
De resto, note-se como, num ápice, António José Seguro veio a terreiro pedir, precisamente, que não tenha lugar nenhum antagonismo entre o Presidente da República e o Primeiro-Ministro. E, como pude já explicar, esse antagonismo, materializado publicamente, não irá ter lugar por esta razão muito elementar: ele simplesmente não existe. O que existe, isso sim, é a necessidade de tentar salvar a irreversivelmente a destruída imagem política do Presidente Cavaco Silva. Ou seja: dizem-nos que há um antagonismo fortíssimo, mas que ninguém ouviu no domínio público, mas logo Seguro pede que o mesmo não tenha lugar, pelo que não virá a ter. Percebeu agora a realidade?
No fundo, e como agora se percebeu muitíssimo bem pelas considerações de António José Seguro, a destruição do Estado Social, tal como referi a dado passo da última campanha eleitoral – depois de se saber que Mário Soares se encontrara com Pedro Passos Coelho na companhia de Leonor Beleza e de Alexandre Soares dos Santos –, foi também uma estratégia política do PS, mas que teria de ser operada pelo PSD. Só assim se entende aquela visita à S. Caetano à Lapa, bem como o fortíssimo caudal de elogios a Pedro Passos Coelho, quando este e o seu partido colocavam José Sócrates e o PS pelas horas da amargura.
Por fim, o caso da Maçonaria e das secretas, com a mais recente notícia sobre que Jorge Silva Carvalho teria no seu telemóvel uma diversidade vasta de números de telefone, incluindo de personalidades do Palácio de Belém. Como se ele as tivesse sem que o pudesse fazer ou lhas tivessem dado?! Em suma, caro leitor: não se deixe iludir, porque de tudo o que tem visto e ouvido, com os portugueses numa situação de desemprego, pobreza e miséria jamais vistas nesta III República, o que se conhece da ação política do Presidente Cavaco Silva é o mais cabal apoio à atual política do Governo de Pedro Passos Coelho. Pense um ínfimo, e verá que nunca ouviu nada em contrário. Não se iluda…

Hélio Bernardo Lopes
De Portugal

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