O politicamente correto e a coragem de Glória Maria

Foto Arquivo pessoal: Gloria Maria e o jornalista Ronaldo Andrade

Por Ronaldo Andrade

“Hoje tudo é racismo, preconceito e assédio. Existe uma cultura hoje que nada pode. Tem que ter uma diferenciação, não dá para generalizar tudo. O politicamente correto é um porre. Acredito que o politicamente correto é o caráter, a honestidade. Esse mundo que a gente está vem muito da amargura das pessoas, não aceito”, declarou Glória Maria recentemente em entrevista à jornalista Joyce Pascovitch.
Glória Maria, jornalista consagrada com décadas de profissão, foi a porta-voz do pensamento de pessoas – e também deste colunista – que, sem ter espaço na grande imprensa e colocadas contra a parede, reféns do politicamente correto, demonstrou lucidez e principalmente coragem para se posicionar contra essa forma de autoritarismo.
E por quê o politicamente correto é autoritário? Duplamente arbitrário, diria. Porque, ao mesmo tempo que esse movimento diz o que não se deve falar e/ou escrever, diz também o que se deve falar e/ou escrever, numa clara tentativa de controlar a linguagem das pessoas e, posteriormente, o pensamento e suas emoções.
Alguma lembrança com o livro ‘1984’, do jornalista e escritor inglês George Orwell (O Big Brother, ou o Grande Irmão, está te observando), não é mera coincidência.
Além disso, o politicamente correto, que em seu início poderia ter mesmo se pautado por boas intenções para a luta das igualdades sociais, se transformou em uma ação política que, tendo se aliado aos setores radicais do movimento feminista, negro e LGBT (rebatizado de LGBTQIA+), para citar os grupos mais proeminentes – as denominadas minorias, que já não são – acabou por se tornar uma iniciativa que faz da perseguição uma de suas principais maneiras de atuação.
Manchar, principalmente por meio das redes sociais, a reputação de pessoas que têm opiniões diferentes, com “cancelamentos”, acusando-as de preconceituosas e disseminadoras de fake news, desinformações, discursos de ódio e participação de movimentos antidemocráticos são exemplos dessa tática de opressão.
Tudo isso prejudica a discussão produtiva e emocionalmente equilibrada, dificultando a convivência social entre os variados grupos que compõem a sociedade.
Ressalto que o politicamente correto é um tema que abordei no meu livro ‘Eleição de síndico’ (Chiado Editora / Portugal), obra que utiliza o humor como forma de crítica, analisando as relações humanas e comportamentos radicais na sociedade brasileira ao espelhar nosso zeitgeist (espírito da época), nomeadamente durante e após as eleições de 2018.
No livro, proponho estabelecer um diálogo equilibrado sobre essas questões, destacando a importância da diversidade, desconstruindo paradigmas e mostrando o desafio, num ambiente de polarização e busca por empoderamento, em se eleger síndicos – ou presidentes.
Dito isto, reafirmo: parabéns, Glória Maria!

Por Ronaldo Andrade
Jornalista, fotógrafo e escritor.
Correspondente do Jornal Mundo Lusíada na Baixada Santista desde 2007.
Servidor público. Pós-graduado em Política e Relações Internacionais (Fundação Escola e Sociologia de São Paulo / SP) e em Gestão Pública Municipal (Universidade Federal Fluminense / RJ).

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