O Dia de Portugal não pode ser o dia da hipocrisia

Por José Cesário

Não me canso de citar Francisco Sá Carneiro relativamente ao imperativo de colocar as pessoas no centro de toda a atividade política e de os programas e os projetos só fazerem sentido se estiverem realmente ao serviço dos cidadãos e responderem aos reais interesses dos portugueses e às necessidades do País.

Se os políticos e as autoridades em geral não forem capazes de concretizar as ideias que divulgam estarão a trair as expetativas dos que neles confiaram e a sua ação não passa de mera demagogia.

Vem isto a propósito de sistematicamente ouvir discursos extraordinários a propósito das comemorações do Dia de Portugal, que também é o Dia das Comunidades Portuguesas, em que é feita a apologia dos nossos valores culturais e em que são exaltadas as virtudes dos portugueses residentes no estrangeiro, sem que na prática se faça o que quer que seja no sentido de melhorar realmente a sua relação com o País de origem.

Quantas vezes ouvimos perfeitas profissões de fé no desenvolvimento de medidas concretas e ações que nunca passam do papel, com uma indiferença pelos problemas reais que cheira à mais pura das hipocrisias.

Eu sei bem, por experiência própria, que governar é muito difícil e que muitas vezes não se consegue concretizar tudo o que nos vai na mente. Não quero por isso ser injusto em relação aos outros. Porém, não posso deixar de reagir quando verifico que, na generalidade das questões, estamos hoje bem pior do que alguma vez estivemos.

Por exemplo, não me lembro de os serviços consulares funcionarem tão mal em tantos postos, em regra os maiores, como hoje, sendo praticamente impossível fazer um agendamento de um simples documento se não se tiver alguém conhecido dentro do respetivo consulado. E que dizer do total fracasso dos consulados virtuais, dos espaços do cidadão e de certos centros de atendimento à distância?

Também me choca o modo como se ignoram os milhares de compatriotas nossos que vivem em situações de miséria crescente em países como a África do Sul, o Brasil, a Argentina, Moçambique, Angola e muitos outros, sem medidas de apoio que correspondam às atuais necessidades de um mundo em mudança acelerada e com novos problemas a que urge responder.

Por outro lado, não compreendo igualmente a indiferença com que se tem olhado para o nosso movimento associativo no estrangeiro, tão fundamental no passado em tantos momentos de emergência e hoje arrasado pelas consequências da pandemia que ainda vivemos.

E também não posso aceitar que o crescimento de várias das nossas comunidades não seja acompanhado de medidas de promoção da nossa cultura e do ensino da Língua Portuguesa, que mantenham bem viva a sua ligação cultural a Portugal.

Por isso, apelo ao bom senso de todos no momento em que comemoramos mais um Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas. Sejamos rigorosos nos discursos e nas promessas e façamos um exercício de autocrítica relativamente áquilo que nos propomos realizar de facto.

Compreendo falhas, omissões e erros, que também cometi, mas não aceito a hipocrisia da indiferença e da promessa demagógica.

Todos nós, políticos, diplomatas, ativistas em geral, sejamos justos e sinceros, contribuindo assim para uma maior ligação das novas gerações de lusodescendentes ao País que tanto amam.

Viva o Dia das Comunidades Portuguesas!

 

Por José Cesário
Ex-deputado do PSD pela emigração

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