É menos perigoso fazer versos que decretos

Corria o ano de 1872, quando D. Pedro II, Imperador do Brasil, dirigia-se à Rua de São Lázaro, no Porto, para visitar o célebre escritor Camilo Castelo Branco, e entregar-lhe a “ Ordem da Rosa”.
Camilo ficou honrado com a presença do Imperador, e encaminhou-o, cerimoniosamente, para pequena saleta, onde havia, retratos da Família Real e de Béranger.
Enquanto o escritor se ausentara, para lhe ofertar e autografar obra sua, D. Pedro ficou atentamente a examinar os retratos suspensos nas paredes.
Ao regressar à salinha, verifica que o Imperador estava absorvido diante da galeria de retratos, e, acercando-se de D. Pedro, interroga-o, respeitosamente:
-Vossa Majestade está admirando os retratos de seus antepassados?!
A que o Imperador responde, sereníssimo:
– Por acaso não! Estava a observar como o rosto de Béranger parece mais alegre que o dos meus familiares! …
Ao que o escritor, prontamente, retorquiu:
– Não admira! É que fazer versos é menos incomodo que dirigir homens e assinar leis.
Quando visitei o museu do Prado, em Madrid, apressei-me a ver o famoso quadro “Las Meninas” de Velásquez – pintor madrileno, mas neto de portugueses, – e outros, que retratavam a Família Real Espanhola, e figuras eminentes da vida política de Espanha. Contastei que tanto eles, como sua família, mostravam expressões de medo, apesar de haver meninas de grande beleza.
É que a fama e o poder, têm seu reverso. Os que buscam altos cargos, ficam de tal jeito enredados nas tramas do poder, que dificilmente se libertam do labirinto em que entraram.
Sei bem, que muitos, alcançando esses lugares, sabendo que correm perigo, não desejam apartar-se. É que o poder inebria, e o bom senso é abafado pela vaidade e dinheiro.
A desmesurada ambição, cega, atira, quantas vezes, quem se enleva nessas efémeras quimeras, a actos tresloucados.
D. Pedro, como rei, sabia disso e sabia, igualmente, que ninguém, que governe, está seguro, por mais justo que seja, mesmo em democracia.
A ambição não tem limites, e em política não há amigos.
Sempre assim foi, e assim será.
A inveja, a ambição, não andam, infelizmente, só de braços dados na política; manifesta-se em todas as profissões e levam suas presas, às mais baixas ignomínias.
Receosos de tudo e de todos, vivendo em constante cuidados, os reis, os príncipes, os grandes senhores, por mais que disfarcem, com sorrisos e alegres gestos, têm estampado no rosto, como maléfico estigma, o  receio, o medo, que lhes vai na alma.

Por Humberto Pinho da Silva
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