Crônica: O valor da palavra

Um dos quadros que mais marcou a minha mente de criança, foi o de Egas Moniz e família, de branco vestidos e corda ao pescoço se entregar, salvo erro a Castela, por Afonso Henriques de que era tutor, ter faltado à palavra em seu nome por ele assumida.

Não sei se ainda hoje esta história é contada nas nossas escolas, o certo é que estamos longe dos tempos em que “a palavra valia uma assinatura”, em que “um aperto de mão selava um compromisso”. E é de fato frustrante como hoje cada um (e em grande número) é mais certo naquilo que faz do que naquilo que diz — “acredita naquilo que eu faço e não naquilo que digo”. Não há sentido de responsabilidade, o que é grave e não se resolve de um dia para o outro, já que se trata de uma questão de mentalidade, que não se decreta antes se constrói.

Esta falta de sentido de responsabilidades é hoje um vírus que marca a nossa vida sócio-cultural. Realmente assumi um compromisso, ouve-se dizer, mas nessa altura não sabia que era convidado para o casamento, ou que o jogo de futebol era nessa data. Claro que se pode estar em cima de um exame, e aqui é incontestável a razão da falta. Isto, quando não são os pais que castigam os filhos proibindo-os, dizem, de fazer aquilo que eles mais gostam.

Não se tem, pois em conta, que o grupo de folclore, ou a banda de música, ou o grupo de teatro para em mais não falar, assumiu um compromisso confiando nos componentes e depois de os ouvir. Será que eu posso faltar porque… aqui é já uma posição correta. E não só está em jogo a qualidade da representação — basta uma má atuação para colocar em cheque o trabalho de anos — como ainda o perigo de ter que se faltar o que pode, inclusivamente, levar o caso a tribunal além de ser  desprestigiante.

Estás disponível para o dia tal? Se não aparecer nada, pode contar comigo. Ou então, não ganho aqui a minha vida – como se a palavra dada tivesse alguma coisa a ver com o valor de um compromisso assumido.

No  fundo são afinal sinais de evolução dos tempos, que sabemos não conseguir no imediato ultrapassar, mas que devem a todos nós, especialmente a quem tem responsabilidades no campo da educação — pais, professores e educadores — merecer reflexão.

E lembremo-nos da máxima de Pitágoras: “Educai as crianças que não será preciso depois castigar os homens”.

Lino Mendes
De Portugal; Grupo de Promoção Sócio-Cultural de Montargil
Conselheiro Técnico da Associação de Folcloristas do Alto Alentejo e Conselheiro Técnico Regional (Alto Alentejo) da Federação do Folclore Português; Um dos fundadores e, Coordenador Técnico do Rancho Folclórico de Montargil, colaborador do jornal “Folclore”; há mais de 40 anos ligado ao Folclore.

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