Portas, por Francisco Seixas da Costa

Por Francisco Seixas da Costa

O vice-primeiro-ministro, Paulo Portas, à chegada para a apresentação das alterações à legislação sobre os 'Vistos Gold', que alarga o investimento de estrangeiros a outras áreas, como a ciência, cultura e reabilitação urbana, na Presidência do Conselho de Ministros em Lisboa. MIGUEL A. LOPES/LUSA
Foto Arquivo MIGUEL A. LOPES/LUSA

Paulo Portas é um dos mais talentosos políticos portugueses. Goste-se ou não da sua forma de estar na vida pública, qualquer opinião independente será forçada a constatar que ele tem sido, ao longo dos anos, um dos grandes “performers” do nosso espetro partidário.

Portas teve o azar de “encalhar” num partido que atingiu o seu “princípio de Peter” político há bastantes anos. Surgido dos conservadores (e muitos reacionários) inquietos com a Revolução de 1974, o CDS nunca conseguiu superar a preeminência do PSD na direita portuguesa. Portas, que se iniciou na juventude do PSD, fez do jornalismo (foi um excelente jornalista, no que à qualidade da escrita diz respeito) a sua trincheira, até que aportou ao CDS, num dia em que se fartou de ser “ponto” para um ator em cujo sucesso deixou de acreditar. Tentou então transformar o partido, que parecia condenado à insignificância. Crismou-o de Partido Popular (coincidência de iniciais?), deu-lhe uma coloração eurocética e soberanista, colocou a democracia-cristã na gaveta e, a partir de um certo momento, assumiu as cores liberais que os tempos pareciam justificar. Contudo, nunca enveredou pela direita pura e dura, do populismo extremista, hiper-securitário ou xenófobo, há que reconhecer.Por uns tempos, o CDS/PP pareceu protagonizar os interesses de nichos sociais mais frágeis, das pessoas idosas e pensionistas à “lavoura” familiar, colocando-se no campo mais renitente às causas fraturantes da modernidade, que sacodem negativamente um Portugal tradicional. Era talvez o seu lado democrata-cristão a emergir, diziam uns; era um saco de votos à mão, acharam outros. Mas foi sol de pouca dura e logo partiu para outra. Com Paulo Portas, o CDS pareceu uma “barata tonta”, andando de um lado para o outro. Se se perguntar hoje a alguém “onde está” ideologicamente o CDS, ninguém saberá responder. Porquê? Porque Portas teve necessidade de “romper” por onde tivesse mais ganhos potenciais, saltitou de causa em causa, à procura de um mercado político próprio, que nunca chegaria a encontrar. Não obstante ter conseguido uma fatia de poder, isto é, uma capacidade de representação de alguns interesses e de conquista de lugares para prosélitos, falhou no essencial: não chegou ao verdadeiro poder, à chefia do governo. À direita, o poder está e estará, por muitos e bons anos, no PSD. Em Belém, é agora Marcelo Rebelo de Sousa, de um certo PSD, quem, por cinco anos, tem as hipóteses maiores. Portas guarda-se para 2021?

Por ora, Portas deve ter-se cansado. De toda a direita desiludida pela hábil manobra de António Costa, o desespero de Portas mostrou ter sido ele o mais afetado. A demarcação que Passos Coelho dele quis fazer também acabou com um capítulo da sua vida política.Era tempo de sair de cena, com ar de estar a dar o lugar aos novos, que se desunharão entre eles. Agora, Portas vai querer ganhar distância, vai tentar assumir “gravitas”, vai procurar “senadorizar” a sua imagem. Uma empresa ou uma instituição, talvez lá por fora, vai ser o seu Vale de Lobos. Com Portas, como o passado provou, aquilo que, no presente, é definitivo pode passar a ser revogável no futuro. Sem dramas e sem corar, porque ele sabe bem que este é um país de crédulos de memória flácida. Como já aconteceu com Marcelo, lembremo-nos. Por isso, aguardemos pelas cenas dos próximos capítulos. Daqui a uns tempos falaremos.

 

Por Francisco Seixas da Costa
Diplomata português. Ex-Embaixador de Portugal no Brasil.

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