Ilha do Pico: A arte de cultivar vinhas “Patrimônio da Humanidade”

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Mundo Lusíada nos Açores

No arquipélago dos Açores não é raro encontrar paisagens de exuberante beleza e de paz. A ilha do Pico, por exemplo, é um desses locais de encher os olhos com as suas paisagens. Porém, é na cultura da vinha e do vinho que a região dá as cartas. Marcada pelo desenho das pedras que protegem as vinhas, a ilha do Pico atrai também amantes desse produto tão português. Tal é o reconhecimento internacional em torno dessa atividade local, que as vinhas da ilha são classificadas como Patrimônio da Humanidade. Nascem aí excelentes vinhos brancos, avaliados positivamente pelos principais organismos internacionais desse seguimento.
Para entender e conhecer melhor essa tradição, o Mundo Lusíada conversou com Paulo Machado, consultor da Azores Wine Company, entidade que auxilia na organização, produção e rentabilidade da produção de vinhos na região.
Mundo Lusíada (ML): Fale um pouco sobre a “Azores Wine Company”. Que atividades desempenham e quais são os objetivos da companhia?
Paulo Machado (PM): A Azores Wine Company (AWC) é um projeto açoriano com uma aposta grande na ilha do Pico e com possibilidade de expandir para outras ilhas. É um projeto que nasceu em 2014, focado em qualidade e que integra vinha, adega vinho e enoturismo. Um projeto criador de riqueza, trabalho e futuro na valorização da transformação de uva em vinhos de exceção para colocação em mercados exigentes. Paralelamente, a AWC tem ainda como objetivos aumentar a produtividade e rentabilidade do setor vitivinícola açoriano, colocar os vinhos dos Açores no Mapa Mundo de vinhos e contribuir para a divulgação e posicionamento dos Açores como destino de exceção.
ML: E como nasceu essa ideia?
PM: O projeto foi lançado por três interlocutores: António Maçanita, enólogo português com raízes açorianas e alentejanas, conhecido por gostar de desafios. É um self made man que desenvolveu o projeto Fita Preta Vinhos no Alentejo, hoje com mais de 200 mil garrafas e que exporta para mais de 20 países. Ele dá consultoria a mais de 14 projetos de norte a sul de Portugal e ocupa o topo dos ratings dos Açores e Alentejo, segundo a reconhecida revista americana WineAdvocate; Filipe Rocha, que é um economista micaelense, com um profundo conhecimento da realidade da gastronomia, turismo e potencialidades açorianas; e Insula Vinus, empresa com base na ilha do Pico com imprescindível conhecimento da realidade regional e da especificidade da viticultura da ilha do Pico.
Esta equipe combina assim um forte know-how técnico, uma clara experiência da realidade dos Açores e um conhecimento dos mercados, que resultam em uma grande capacidade para transformar o potencial vínico dos Açores em uma realidade.
ML: Que tipos de castas podemos encontrar na região?
PM: Atualmente, estão em instalação na ilha do Pico cerca de 70 hectares de vinha destinados à recuperação e preservação do potencial genético das castas autóctones dos Açores: Verdelho, Arinto dos Açores, Terrantez do Pico e Saborinho e outras que tiveram grande importância no passado e hoje estão quase esquecidas: Boal, Bastardo, Rufete, etc.
ML: É possível falar um pouco da importância dos vinhos produzidos na região? Sabe-se que as vinhas na ilha do Pico são Patrimônio da Humanidade…
PM: Os Açores destacam-se pela produção de vinhos brancos de qualidade que combinam castas autóctones únicas e exclusivas, um “terroir” marcado pelos solos vulcânicos, clima temperado, mas por vezes agreste, e uma grande proximidade ao mar, além de uma viticultura super dependente da intervenção humana, que os tornam únicos, históricos e autênticos.
Estas castas brancas permitem obter diferentes produtos de excelência, desde os brancos frescos, minerais e salinos aos licorosos complexos que, no passado, foram exportados para todo o mundo. Mais recentemente foram feitos os primeiros ensaios com espumantes que revelam grande potencialidade. Todos estes vinhos apresentam um grande potencial de “guarda” devido à sua acidez frescura e, ainda, um caráter salino e vulcânico.
Foram dados também os primeiros passos para recuperação de castas tintas autóctones que certamente se destacarão como vinhos singulares marcadamente vulcânicos e atlânticos.
Para evidenciar a enorme qualidade dos vinhos brancos, podemos apresentar algumas pontuações da crítica internacional (WineAdvocate-Robert Parker) dos vinhos da AWC: Arinto dos Açores, 2014, DO Pico, 92 pontos; Arinto dos Açores sur lies 2014, DO Pico, 92 pontos; Verdelho O Original 2014, IG Açores, 90 pontos; Terrantez do Pico 2013 (Fita Preta Vinhos), Vinho Regional Açores, 91 pontos; Arinto dos Açores, 2015, DO Pico, 93 pontos; Verdelho O Original, 2015 DO Pico, 90 pontos.
O fato de as vinhas serem classificadas como Patrimônio da Humanidade é o reconhecimento da sua especificidade e o trabalho heroico que foi feito na ilha do Pico para erguer tão extensa malha de muros de pedra, pedra esta que resultou da perfuração dos mantos lávicos em busca de algum substrato que permitisse o enraizamento das videiras. Estes muros tem um importante papel de proteção dos ventos marítimos que podem ser devastadores em determinadas fases do ano. Este reconhecimento acrescenta valor ao vinho, pois é sinônimo de autenticidade, singularidade e de inigualável participação humana em todo o processo produtivo.
ML: Quantos produtores, cooperativas e marcas de vinho estão ativas no arquipélago?
PM: Atualmente, estão em atividade 10 (dez) produtores de vinho DOP (denominação de origem protegida) e IGP (Indicação Geográfica Protegida), dos quais 3 (três) são Cooperativas, e existem mais 30 marcas de vinho.
ML: De onde sai a maior produção vinícola dos Açores?
PM: Sai da ilha do Pico aproximadamente 88% da produção. A produção total da região é de 1.200.000 (hum milhão e duzentos mil litros), dos quais 250 mil litros são DOP e IGP.
ML: Por fim, como é feito o trabalho de promoção e divulgação dos vinhos açorianos? Que mercados mais atraem a atenção dos produtores?
PM: Por enquanto, a promoção genérica dos vinhos é bastante limitada, por falta de recursos. Alguns produtores tem apostado em ações mais específicas como é o caso da AWC que, neste momento, já exporta para países como Suíça, Bélgica, França, Holanda, Canadá e EUA, para além de Portugal Continental.

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