Fado no Brasil: Amália Rodrigues – “Dá-me um beijo”

Por Thais Matarazzo

Exposicao-sobre-Amalia-evidO fado de Frederico de Freitas e Silva Tavares, Dá-me um beijo, foi gravada por Amália Rodrigues (1920 – 1996) no Brasil e lançado em 1949.

Por ser um fado mais ritmado, alcançou êxito entre brasileiros e portugueses. A gravação deu-se no estúdio da Continental, no Rio de Janeiro, com acompanhamento de guitarra e viola.

Amália Rodrigues é conhecida como a “Rainha do Fado” e realizou suas primeiras gravações no Brasil, por ocasião de sua segunda excursão ao nosso país, em 1945. Foram registrados 16 fados, com acompanhamento da orquestra de guitarras portuguesas sob a direção de Fernando de Freitas.

Em 1949, Amália deixou gravado, em discos Continental, os fados: Sabe-se lá… (Frederico Valério / Silva Tavares), Confesso (Frederico Valério / José Galhardo) e Fado da saudade (Frederico de Freitas / José Galhardo) – a outra face Dá-me um beijo.

Da contracapa do LP Amália, número MOEB-26, lançado no Brasil pela Odeon, transcrevemos o texto de apresentação, que não tem assinatura do autor.

“Amália é a mais inspirada intérprete do Fado, a canção suprema de Portugal. Amália destila em seu canto a própria essência do espírito de Lisboa – dessa Lisboa onde nasceu e cresceu. Dos bairros pobres em que se criou, elevou-se, pela arte, ao lugar que agora ocupa de fadista internacionalmente conhecida. Porque depois de conquistar Portugal, onde é quase uma figura lendária, Amália pelo seu magnetismo, sua voz e sua expressividade conquistou o mundo como só uma artista verdadeiramente grande poderia conquistar.

E, graças a Amália, o Fado também se tornou conhecido e aplaudido fora do seu berço natal, porque quando canta o Fado – o fado que descreve a vida nas suas alegrias e nas suas tristezas, mas que, de qualquer forma, tem sempre um fundo de tragédia – Amália traça quadros assombrosamente reais da sua terra e da maneira de sentir do seu povo”.

 

Dá-me um beijo – fado

(Frederico de Freitas / Silva Tavares)

Talvez por muito amar a liberdade

Invejo a vida livre dos pardais.

Mas prende-me em teus braços sem piedade

E eu juro da prisão não sair mais.

 

Não posso ouvir um fado sem cantar

E não domino em mim a febre de o cantar

Mas dá-me um beijo seu fremente

Verás que fico assim, calada eternamente.

 

Adoro a luz do sol que me alumia

Por graça e singular mercê de Deus

Mas fecha-me num quarto noite e dia

E eu troco a luz do sol pelos olhos teus.

 

Não posso ouvir um fado sem cantar

E não domino em mim a febre de o cantar

Mas dá-me um beijo seu fremente

Verás que fico assim, calada eternamente.

 

Baixinho, aqui pra nós, muito em segredo

Eu sempre fui medrosa até mais não

Mas pra que sejas meu não tenho medo

Nem mesmo de perder a salvação.

 

Não posso ouvir um fado sem cantar

E não domino em mim a febre de o cantar

Mas dá-me um beijo seu fremente

Verás que fico assim, calada eternamente.

 

Em 1955, Amália Rodrigues gravou o fado Barco Negro, com poesia de David Mourão Ferreira. Na verdade, foi aproveitada a melodia, com novo ritmo e letra, da toada brasileira Mãe Preta, da dupla Piratini e Caco Velho. A música foi levada para Portugal pela fadista Maria da Conceição, cuja história contaremos nos próximos capítulos.

Barco Negro tem como tema o amor de uma mulher por um homem morto num naufrágio, sendo um dos maiores êxitos da carreira de Amália Rodrigues.

 

Barco Negro – fado

(Caco Velho / Piratini / D. M. Ferreira)

 

De manhã, que medo, que me achasses feia

Acordei, tremendo, deitada n’areia

Mas logo os teus olhos disseram que não,

E o sol penetrou no meu coração.

Vi depois, numa rocha, uma cruz,

E o teu barco negro dançava na luz

Vi teu braço acenando, entre as velas já soltas

Dizem as velhas da praia, que não voltas.

 

São loucas! São loucas!

 

Eu sei, meu amor,

Que nem chegaste a partir,

Pois tudo, em meu redor,

Me diz qu’estás sempre comigo.

No vento que lança areia nos vidros;

Na água que canta, no fogo mortiço;

No calor do leito, nos bancos vazios;

Dentro do meu peito, estás sempre comigo.

 

Por Thais Matarazzo

Jornalista, escritora e pesquisadora musical. Trecho do livro “O Fado que cantei e outras canções…” (2015), de Thais Matarazzo, Editora Matarazzo (São Paulo-SP).

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